Sióstio de Lapa
Pensamentos e Sentimentos
Meu Diário
17/04/2019 00h13
HUMANOS E ANIMAIS

            Moro numa cidade grande, uma capital, uma chamada selva de pedra. Fiquei a pensar nisso quando hoje ao dirigir para o trabalho, fui ultrapassado por um motociclista que olhou para mim por dentro de seu capacete com um olhar que identifiquei como perigoso. Logo veio os pensamentos de tantos casos de criminalidade, roubos, assassinatos, muitas vezes por motivos fúteis, e muitas vezes causados por pessoas em motocicleta, que parecem andar caçando pelas ruas outras pessoas mais fragilizadas para as tornarem suas vítimas.

            Então, somos caçados? Por seres humanos como nós? Acredito que exista uma diferença. Se existe um caçador e a presa, entre eles deve existir alguma diferença.

            Vamos ver... somos animais, nascemos com os instintos que todos os mamíferos possuem para sobreviver. Devido a nossa capacidade de racionalização, alcançamos um novo patamar psíquico onde o nosso pensamento não fica somente na luta pela sobrevivência. Alcançamos novo patamar psicológico com valores morais. Aprendemos a controlar nossos instintos e isso nos distancia cada vez mais da condição animal, pelo menos no aspecto psicológico.

            Acontece que tem pessoas que não passam por esse processo de educação e permanecem a vida toda motivados pelos instintos animais. Dessa forma podemos distinguir, pelo menos racionalmente, dois tipos de seres: um que seria animalizado, pela falta de educação, e outro humanizado pela absorção da educação que recebeu.

            Portanto, passa a existir na selva de pedra os seres animalizados, que não receberam educação moral, e os seres humanos devidamente moralizados. Os seres animalizados, as feras, vivem a caçar os seres humanos, os moralizados. Como devemos nos comportar? Como presas que pode ser alcançada a qualquer momento pelas feras.

            Agora surge um dado interessante. Se vamos na selva, na natureza, é necessário que estejamos armados para nos defender do ataque de qualquer fera. No entanto, na selva de pedra, os as feras são bem mais sofisticadas e perigosas, algumas civilizações como a brasileira proíbe o porte de armas aos cidadãos moralizados. Consequência: quem anda armado pelas ruas, que por índole não tem nenhum respeito pelas leis, são as feras com aparência humana, colocamos grades nos comércios, muros altos, cães de guarda, cerca elétrica, toda parafernália de defesa, mesmo assim estamos indefesos, desarmados dentro de casa. Se uma dessas feras resolve invadir nossa casa, não temos nenhuma forma de reação, a não ser que exista em algum deles uma réstia de compaixão.

            Esta é uma falha na racionalização dos seres humanos, que nos deixa fragilizados frente as feras. Interessante que as pessoas que defendem tal coisa, como presidentes, juízes, eclesiásticos, todos eles caminham com uma série de guarda-costas devidamente armados em sua defesa. Que doideira! E quem termina pagando por todo esse aparato de defesa, são justamente as coitadas vítimas das feras assassinas.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 17/04/2019 às 00h13
 
16/04/2019 00h13
AMIGA CHUVA

            Muita gente fica surpresa quando eu digo que tenho uma relação bem íntima com a chuva, é como se ela sentisse os meus sentimentos e nos momentos de dores na alma, que ninguém sabe onde está doendo, só ela sabe, e me cobre com suas nuvens, e que me molha com os seus pingos, como se quisesse compensar as minhas lágrimas, me acalentar com o seu chuviscar.

            Assim amanheceu o dia. Muita nuvem no horizonte, a chuva fina a cair ininterruptamente. Fiquei tentado a sair e me abraçar com ela na beira da praia, caminhar com ela pela areia, sentir o seu frio na minha pele; não teria vergonha de chorar pois os seus pingos disfarçariam minhas lágrimas dos olhares curiosos.

            Sei que ela bloqueia o sol, a minha referência de Deus no mundo material. Mas ela é minha amiga e ei que ela também é criação de Deus. Sei também que suas gotas são formadas do “suor” que sobe ao céu da própria Terra. Talvez nelas estejam o suor daqueles que tanto trabalham para sobreviver, que correm daqui para ali, dali para cá, as vezes sem uma palavra de carinho, de solidariedade, envolvidos em críticas, maledicências, pedindo também ajuda do Pai...

            Talvez seja isso que minha amiga chuva queira dizer com o frio límpido de suas gotas: olha Francisco, as tuas lágrimas têm o mesmo sabor espiritual das minhas gotas, que sobem para mim, para perto do Pai, cheias de sofrimento. Por que motivo tu percebes as minhas nuvens tão escuras? São as dores da humanidade, cheias de preconceitos, de pecados, que precisam ser lavadas para que minhas nuvens se tornem brancas. Assim também, tuas lágrimas devem lavar tua alma para que ela se livre dos preconceitos, dos pecados que querem te dominar, e torne o teu coração mais uma vez impecável frente ao olhar do Pai.

            Fiquei a refletir sobre o que minha amiga falou. Fico a observar o movimento revolto de suas nuvens ao sabor da força dos ventos, vejo uma se chocar com as outras e surgir faíscas de intolerância que ás vezes deixa cair raios perigosos sobre a terra, que ribombam nos céus como o troar de mil tambores, trazendo sustos a quem está por perto. Nada comparado aos sentimentos que agitam os meus pensamentos, que causam descargas emocionais sobre o meu coração, mas felizmente ninguém escuta o seu rimbombar como eu, pois teriam mais pavor do que eu.

            Talvez este seja o motivo da nossa tão forte amizade. Nós sofremos as consequências do mundo material, enquanto suas nuvens recebem da terra todo o sofrimento físico que ai acontece, a minha mente recebe dos relacionamentos egoístas todas as consequências afetivas desnorteadas. Só podemos limpar tudo isso com os pingos das chuvas ou com as gotas das lágrimas.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 16/04/2019 às 00h13
 
15/04/2019 00h13
TENTAÇÕES NO DESERTO

            Jesus passou 40 dias no deserto antes de começar a sua missão. Foi tentado de diversas formas, mas resistiu a todas elas, se mostrando capacitado de começar a tarefa que o Pai lhe destinou.

            A quaresma lembra para mim esses 40 dias no deserto. Sinto que o Pai também tem uma missão para mim, não tão dura e importante como aquela que o Mestre recebeu, mas enfim, como aquele beija-flor da lenda, eu tenho que levar também o meu pinguinho d’água.

            Não tenho um deserto para ir fisicamente, mas posso criar esse deserto na minha imaginação. Posso entrar nele e saber que não tenho muitos recursos que a carne deseja. Então tenho que reduzir a alimentação ao mínimo da sobrevivência e ainda mais, com a quantidade suficiente para reduzir o excesso de peso que o meu corpo acumulou, nos excessos dos prazeres da gula que ele gozou.

            Além dos ataques da gula, tenho consciência que irei ser atacado de outras formas, principalmente a emocional, associada a missão que o Pai me deu. Irei ser testado se estarei preparado para manter a promessa com o Pai e deixar de lado qualquer vantagem que o demônio queira me oferecer, como poder, segurança, sexo, conforto, etc.

            Nesse período recebi o pedido de ajuda de uma pessoa já conhecida, que tem um bom nível de espiritualidade, mas que possui o apelo do sexo e por isso é mal vista por outras pessoas. É um teste. Como eu irei me comportar? Não darei o pedido de ajuda e ficarei em paz com todas as pessoas ao meu redor, inclusive a minha companheira? Ou darei ajuda e sentirei na pele a resistência de quem não quer que eu faça isso? O que Jesus faria no meu lugar? Acredito que não titubearia, daria a ajuda. Também fiz isso, dei a ajuda e quando interrogado, disse a verdade. Foi como eu imaginei, sofri uma série de represálias, inclusive ser impedido de entrar numa casa que diziam ser minha também.

            Resisti, acatei as represálias sem nenhuma admoestação, reclamação. Fui sozinho para o meu apartamento onde deve ser o meu lugar, longe da ingratidão, da intolerância, da mesquinharia, da falta de compaixão.

            A casa que eu tanto gostava e tanto cuidava, ficou contaminada pelo ódio, ressentimento, ciúme, principalmente. A minha mente amorosa não pode ficar harmonizada num ambiente como esse.

            O deserto fica cada vez mais quente nesse embate, sofro as consequências de me manter fiel à confiança que o Pai tem em mim. Sei que Ele me observa e sonda meu coração. Sinto a Sua aprovação nas minhas atitudes, e Ele me banha com o analgésico da sua graça para atenuar as dores que invadem o meu coração.

            Mantenho firme as minhas convicções neste deserto mental que tão forte joga as suas consequências meu físico.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 15/04/2019 às 00h13
 
14/04/2019 00h12
CHAGAS

            Francisco de Assis amava tanto a Jesus que incorporou no seu corpo as chagas que o Mestre adquiriu durante o seu suplício de crucificação. Mas, por que isso aconteceu com Ele, com Jesus? Já que era um espírito puro e não tinha necessidade de sofrer tantos castigos? Acontece que Ele estava obedecendo a ordem do Pai de vir nos ensinar sobre o Amor. Cumpriu perfeitamente a Sua tarefa, apesar das consequências.  

            Hoje, dois milênios após a Sua vinda à Terra, o Seu Evangelho é conhecido pela maioria das pessoas e muitos procuram praticar suas lições. Eu estou incluído. Mesmo sabendo das inúmeras dificuldades, tanto internas quanto externas que irei enfrentar. Compreendi que sou filho do mesmo Pai, que também tenho uma missão, não tão importante que fosse prevista pelos profetas com muita antecedência, mas que, por pequeníssima que seja, é a minha missão.

            Segundo o que Jesus veio ensinar, e outros avatares (No Hinduísmo, momento que corresponde à descida de uma entidade sagrada à Terra, geralmente assumindo um aspecto materializado, às vezes humano, outras em forma de animal) da humanidade, o Amor puro, o incondicional, aquele que não está condicionado a qualquer condição, filho, pai, mãe, etc., deve ser a energia para movimentar nosso corpo a partir do coração, com a vigilância da mente, do racional, da consciência. Para que não tivéssemos dúvidas, o Mestre ainda ensinou que, devíamos fazer ao próximo aquilo que queríamos que fizessem a nós.

            Com essa compreensão na mente comecei a colocar em prática essa forma de amar. Consequentemente foram me chegando as chagas, onde eu menos esperava: na alma. Um local que ninguém pode ver, apenas eu posso sentir. Tenho até certa vantagem com relação a Francisco de Assis, pois as chagas dele eram no corpo físico e ele tinha a maior preocupação de mantê-las escondidas. As minhas já estão escondidas na sua origem. Não sei como as chagas dele eram formadas, mas sei como as minhas são.

            Durante a prática do Amor, necessariamente ele é distribuído por quem está presente, ao meu próximo, independente de quaisquer condições. Quanto mais próximo de mim, mais a intensidade desse Amor. Isso leva a muitos benefícios a quem está próximo, principalmente a quem se dispõe a me acompanhar, principalmente as minhas companheiras que geram comigo uma convivência.

            Acontece que essas minhas companheiras são inevitavelmente atacadas pelo pecado do ciúme, não querem que eu distribua afetos a outras pessoas que elas considerem que possam roubar a condição de ser a minha companheira exclusiva, condição que o Amor Incondicional não garante a ninguém. Mas elas, mesmo sabendo da mecânica afetiva do meu comportamento, não conseguem tolerar a minha aproximação com outras pessoas que consideram agora rivais, e chegam ao clímax da intolerância, de me expulsar da sua convivência, das suas casas, muitas vezes com brutalidade, queixas, ameaças...

            Eis aí a fonte das minhas chagas! Como poderei eu ir, escorraçado por uma pessoa que amo, que dividíamos intimidades físicas e emocionais, e que fica encharcada de lágrimas por eu não ser o que ela deseja? Uma enorme chaga se forma na minha alma.

            Fico no isolamento do meu apartamento a refletir: onde foi que eu errei? Não encontro nenhum erro. Mantive a minha consciência ligada ao projeto que Deus colocou dentro dela. Informei a qualquer pessoa que se aproximava de mim, com intenções de intimidades, de convivência, como era que eu funcionava, a ligação indestrutível que eu tinha com Deus, que não podia ser exclusivo de ninguém. Mesmo assim a pessoa decidia ficar perto de mim, e mesmo eu sabendo que um dia essa pessoa iria ser atacada pelo pecado do ciúme e desmoronaria, eu tinha que aplicar a lição de jesus, dar a ela o que eu gostaria de receber: o meu afeto! Pronto! A bomba está armada. O tempo passa, e cada vez mais a qualidade do meu afeto deixa a pessoa com mais necessidade, com desejos de exclusividade.

Até que chega o dia, e sempre esse dia chegará, que uma pessoa é considerada como rival, e a bomba emocional explode. A pessoa fica desnorteada, incapacitada, depressiva e inoperante. Banhada em lágrimas com queixas de ingratidão, de amores desgovernados por outra pessoa... e eu sou expulso com mais uma nova chaga...

Mas eu sinto que estou em boa companhia espiritual pois estou seguindo o modelo que o Pai quer dos seus filhos, não importa as consequências... assim como o Cristo foi expulso pelos sacerdotes, assim como Francisco de Assis foi expulso pelo seu pai, eu também, não posso me esquivar de ser expulso por minhas companheiras.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 14/04/2019 às 00h12
 
13/04/2019 00h11
O PRESENTE

            É costume entre nós presentearmos a alguém que aniversaria.

            Qual o melhor presente que podemos dar a uma pessoa especial? Pessoa que convive conosco, que procura nos fazer o bem, cuida dos nossos interesses materiais, sabe de nossos compromissos espirituais e procura atender nossas necessidades?

            Não imagino um presente melhor do que o nosso próprio comportamento com essa pessoa. Qualquer outro presente de características materiais, quer sejam simples ou complexos, perdem importância ao se comparar com o comportamento de quem presenteia. Mesmo porque, no dia do aniversário daquela pessoa, quando nos fazemos presentes, qualquer outra coisa que levemos nas mãos, são coisas secundárias. O importante, o prioritário, é a pessoa que está presente, mesmo que conduza algum objeto com o nome de presente, não tenho dúvidas.

            Mas eis que surge o problema! A pessoa aniversariante deseja que o outro, o seu presente, seja da maneira que ela quer, sem quaisquer defeitos e com todas as virtudes que ela possa imaginar. Impossível!

            Hoje é o dia propício para eu dar tal presente a uma pessoa querida. Seus parentes organizam a festa, compram um bolo, ornamentam o ambiente, e se preparam para cantar e apagar as velinhas. Tudo isso muito legal, mas quem são os presentes, quais são os presentes?

            Olho para mim e não me vejo como um presente adequado ao gosto dela. Não sou do jeito que ela deseja que eu fosse. Tenho defeitos seríssimos que provocam nela as lágrimas e sentimentos de depressão. E não posso eliminar esses defeitos em mim, fazem parte da minha essência, da minha ligação com Deus. Tentei uma vez fazer isso, com uma pessoa com a qual convivia. Foi horrível, senti a minha vida robotizada, perdi o colorido da natureza, perdi a conexão com o Pai, perdi a minha alma. Não conseguia viver assim, e trouxe tudo de volta. Os comportamentos e forma de pensar que para os outros são tão fortes defeitos e que para mim é a essência da minha vida. Terminei sendo expulso da vida dessa pessoa, até de forma traumática; fui espancado, injuriado, amaldiçoado...

             Fui embora da vida daquela pessoa, não mais me tornei presente. Mas não guardei mágoas ou ressentimentos. Compreendi que ela não me aceitava como presente, que meus defeitos fediam tanto quanto peixe podre. Entendi que qualquer pessoa iria sentir o mesmo fedor com esses defeitos. Aceitei a consequência de viver e morrer sozinho, de não obrigar a ninguém a viver com tal sacrifício. Tinha que fazer a lição do meu mestre, Jesus: “não fazer a ninguém aquilo que não queres que façam a ti.”

            A qualquer pessoa que se aproxima de mim, encantada com minhas virtudes, procuro logo esclarecer com todos os detalhes a natureza dos meus defeitos e da impossibilidade de me livrar deles, pois faz parte da minha essência. Procuro evitar assim a convivência dentro de uma ilusão. Mas, ainda existe alguém que, contra tudo e contra todos, procura construir essa convivência, sabendo de quantas outras pessoas sofreram do mesmo mal e que não resistiram com o tempo a convivência comigo.

            Hoje é um dia destes... a minha companheira aniversaria e sente como nunca o fedor dos meus defeitos. Corre e se refugia entre lágrimas e remédios na escuridão do seu quarto de dormir. Os parentes organizam para logo mais a noite a comemoração desse dia especial para ela, de receber os presentes. Como posso ser tal presente para esta pessoa? Se coloco acima dela o compromisso que tenho com Deus, da forma que Ele colocou em minha consciência? Se o amor que desenvolvo agora deixou de ser romântico, dirigido a qualquer mulher, mas sim espiritual, totalmente dirigido a Deus?

            Quando escuto aquela canção de Gigliola Cinquetti, “Dio come te amo”, que antes associava sempre a imagem de uma mulher, hoje escuto associando integralmente a imagem de Deus, ao sentimento de Deus.

            Não, reconheço, não sou um bom presente para nenhuma pessoa que deseja e sonha em ter um marido fiel, que lhe dê amor exclusivo. Não sou um marido, nunca o serei. Sou um pai, um filho, um irmão... pertenço a família universal. Sou comprometido com Deus e procuro obedecer aos caminhos que Ele coloca em minha vida, independente de sexo ou beleza, de rico ou de pobre, de letrado ou analfabeto, mas, dependente sempre do amor incondicional.

            Seja minha companheira, minha irmã, trilhando comigo os caminhos do Senhor. Minha alma não deseja que exibas para mim a sensualidade do seu corpo, mas sim a solidariedade e ternura do teu coração. Talvez percebas amanhã, que o fedor que hoje sentes de mim, tenha se transformado em perfume de rosas, como aconteceu com Clara, ao ver nas chagas do moribundo Francisco, um reflexo do próprio Cristo.

            Mas, por enquanto, eis-me aqui: um presente podre!

Publicado por Sióstio de Lapa
em 13/04/2019 às 00h11
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