Antonino era uma pessoa caridosa, procurava seguir o caminho reto que sua consciência, cheia de valores, apontava como importante.
Colocava muita ênfase na caridade, havia aprendido em lições que recebeu por algum tempo que passou em Centro Espírita, que fora da caridade não há salvação.
Ele se considerava, portanto, uma pessoa que por boa índole, já fazia caridade até naturalmente, mas sempre colocava no ato, racionalizações se estava sendo correto ou cometendo algum erro.
Por exemplo, quando ele dirigia e chegava crianças pedindo uma ajuda, apesar dele ter as moedas que eram pedidas, ele ficava a pensar que aquela moeda poderia ir parar nos bolsos de algum adulto mau intencionado que colocara aquela criança para explorar a caridade das pessoas, fazendo um bom saldo no final do dia, do qual pouco a criança recebia. Ou então aquele pedinte estava querendo fazer saldo necessário para a compra de alguma droga que mantivesse o seu grau de dependência, de escravização àquela situação. Em ambos os casos a sua racionalização impedia o ato de caridade. Isso o deixava sempre em conflito consigo mesmo, pois aquela pessoa poderia ser um verdadeiro necessitado e ele ter feito uma injustiça com os seus princípios.
Um dia ele resolveu colocar o seu poder de racionalização à prova, frente os atos de caridade. Juntou todas as moedas que poderia dar naquele dia num saquinho e saiu disposto a entregar todas para a pessoa que a sua lógica considerasse como a pessoa mais pobre.
Saiu a pé para ter a oportunidade de fazer um raciocínio mais profundo daqueles que pediam alguma coisa. Viu crianças conduzidas no colo por seu pai ou mãe, mostrando suas necessidades; viu aleijados mostrando suas mazelas; viu adolescentes limpando para-brisas de carros e estendo a mão ou fazendo sinal para boca de que estava com fome; viu adultos procurando vender pipocas ou agua mineral com suas caixas de isopor encardidas... em tudo e todos eles colocava o mais alto grau de considerações racionais que pudesse classificar entre todas qual a pessoa mais pobre.
Não tinha chegado a uma conclusão quando ouviu à distância uma pessoa pedindo votos num carro luxuoso encimado com um potente autofalante. Ele se aproximou e conseguiu ver uma pessoa bem vestida, com o microfone na mão. Reconheceu que era o governador do seu Estado que estava cercado de pessoas distribuindo os seus santinhos, adesivos e programa de governo. O candidato pedia os votos e garantia que iria fazer escolas, hospitais, dar bolsas de estudo, bolsas família, bolsa gás, casa própria, emprego, carro... as promessas saiam de sua boca acompanhadas por gestos vigorosos e de honestidade e de acusações aos seus adversários de todos adjetivos negativos que pudesse aplicar.
Antonino passou a considerar o que aquela pessoa tão bem vestida, culta, inteligente e poderosa, estava ali, naquela praça a pedir votos a tantas pessoas bem mais humildes que ele, e que muitas das promessas que ele fazia jamais podia cumprir. Interessante é que em todas as pessoas necessitadas que ele viu e considerou até aquele momento, todas eram humildes e pediam a pessoas que aparentavam teriam mais posses. Mas essa pessoa era o inverso, ele tinha mais poder e condições financeiras e pedia a quem tinha menor condições o direito de administrar o dinheiro que todos pagavam, quer sejam ricos ou miseráveis. A simples moeda que um pedinte daqueles que ele viu, recebia de alguém, e ele fosse à padaria comprar um pão, parte desse valor terminaria caindo nos cofres do Estado que iria ser administrado pelo Governador.
Antonino sabia que este Governador já era considerado rico, fez sua fortuna depois que assumiu o cargo e todos sabiam dos inúmeros processos de corrupção que ele era acusado. Mesmo assim continuava no afã de permanecer no cargo. Os seus desejos de alcançar cada vez mais poder, mais dinheiro, mais bens, era incontrolável.
Antonino não teve mais dúvidas, ali estava a sua pessoa, a mais necessitada pois seus desejos de possuir era bem maior de que todos aqueles que viu... chegou perto do carro, estendeu a mão e entregou o saquinho de moedas ao político. Um assessor recebeu, olhou para dentro, viu as moedas, olhou para Antonino que se afastava, e coçou a cabeça sem entender.
Irei colocar aqui, com poucas adaptações, a aula do Prof. Luiz Raphael Tonon, com estreia no dia 26-06-2022, pelo Centro Dom Bosco, no Youtube, com 58.000 visualizações em 16-07-2022.
Muito cedo comecei a notar uma coisa. Que era ensinado que a Igreja na época feudal controlava tudo, que fazia churrasco de hereges, etc. Eu via os santos medievais, São Bernardo de Clavaral, Santa Edwiges, Santa Isabel da Hungria, agora, essa Idade Média que se escuta na escola, não fazia conexão. O que eu lia das vidas dos santos, não estava batendo. Alguém está mentindo, só que eu não sabia de onde vinha o erro.
Essa dúvida foi crescendo. Um dia fui movido pela raiva. Quando eu estava dentro do Seminário e ouvi o professor de História da Igreja dizer que Lutero deveria ser venerado pela Igreja, pela grande obra reformista que ele fez.
Ouvir isso da boca de um padre, dentro da minha aula de história, dentro do seminário, me deixou com raiva. Desci até a biblioteca do seminário e fui baixar tudo que tivesse nas prateleiras, que estavam todas cheias de poeira, mostrando que eram intocadas durante anos, acredito que depois do Concílio Vaticano II ninguém teve mais interesse nesses estudos.
Comecei a ler e por acaso descobri que o fundador da congregação onde eu estava era o sujeito que tinha comentado os erros dos reformadores protestantes. Santo Afonso tem um tratado inteiro sobre isso. Percebi também que no seminário tem uma prateleira gigante, inteira, sobre Santo Afonso.
Fiz o propósito de ler tudo dentro de um ano, e consegui. Ninguém sabia mais do que eu naquela época, pois eu li tudo. Era até curioso, pois até os padres tiravam dúvidas comigo. Era até estranho, o pessoal não lia o que escrevera o pai espiritual da congregação.
Também passei por essa experiência de me aprofundar nas leituras quando adolescente. Não por raiva como aconteceu com o professor Raphael, mas por necessidade. Eu era sozinho, sem a convivência dos irmãos pois fui criado por minha avó materna, pelas dificuldades que minha mãe tinha de acolher tantos filhos. A minha companhia passou a ser livros e principalmente os gibis, revistas em quadrinhos. Foi aí que a minha imaginação foi crescendo cada vez mais nos princípios da justiça, do amor e do heroísmo. Fazia duelos na fantasia com tampas de garrafa, onde ficava torcendo pela vitória do bem sobre o mal, mas era incapaz de alterar o resultado quando não convinha aos meus interesses. Acredito que essa fase foi bem amis importante que os momentos da escola, pois devido a minha timidez e introspecção eu não consegui me enturmar convenientemente com os colegas. Mas os frutos das minhas leituras facilitaram o meu aprendizado e os meus projetos de vida, contribuindo para eu chegar ao ponto que estou.
Irei colocar aqui, com poucas adaptações, a aula do Prof. Luiz Raphael Tonon, com estreia no dia 26-06-2022, pelo Centro Dom Bosco, no Youtube, com 58.000 visualizações em 16-07-2022.
Santo Afonso dizia que ignorância invencível pode garantir a salvação, a culposa nunca. Acaba se tornando até uma questão moral.
Sempre tive muito interesse pela História da Igreja, pela História Geral, e como todos nós, fiz um caminho nessa busca de conhecimentos. Quando criança eu ia à escola católica, pois sempre fui católico e começava a ouvir a respeito da inquisição, da Cruzada, da Reforma Protestante... aquele combo anticatólico que todos ouvimos um dia. O que eu pensava? Não tinha argumentos ao 10-12 anos para debater com meu professor e eu pensava comigo: eu sou católico, gosto, mas disso eu tenho vergonha. Depois fui descobrir que eu tinha vergonha na verdade de um Espantalho, um fantoche, aquilo não existia, era uma construção. Eu percebia e sentia isso, ficava naquela angústia, naquela coisa que acabou me salvando de certa maneira.
Fui ser coroinha naquela época de crise financeira no país e meu pai avisava para eu não inventar coisas para comprar. Você pode ser coroinha, mas sem trazer despesas. Assim que fui, o padre disse que tinha que fazer a roupa e eu logo pensei que tinha de comprar alguma coisa. Falei para o padre e ele disse para eu ir ao Carmelo conversar com tal freira que ela irá resolver o problema.
Chegando lá fiquei horrorizado, um monte de freiras atrás das grades e elas me pediram pela grade para fazer as medidas da roupa. Disseram que com um mês a roupa estaria pronta. Quando voltei, com a roupa pronta, perguntei por educação qual era o preço, pois eu não podia pagar, mas conversaria em casa. Ela respondeu que ia ser muito caro, que deveria ser pago durante muitos anos. Disse que o capelão era muito velho e precisava de alguém que esteja junto com ele para mudar a página do missal, ele enxerga mal, e você tem que acompanhar o ritmo com ele, ajuda-lo. Aí fica pago.
Eu não imaginei o salto histórico que eu dei. O sacerdote do qual fui coroinha não era nada menos que o sacerdote que restaurou a imagem de Nossa Senhora Aparecida. Ele foi o padre que encompridou o cabelo da imagem de Nossa Senhora para fixar a cabeça na imagem.
Eu nem imaginava que era esse padre e o que era lidar com fonte histórica primária. Eu estava ouvindo ali uma pessoa que restaurou, que viu e lidou com o maior objeto de devoção do povo brasileiro que é a imagem da Padroeira do Brasil.
Dali a coisa foi aumentando esse desejo de conhecer. Ganhei um gibi de São João da Cruz, bem didático para crianças, né? Mas eu gostei, pois era o primeiro santo que eu ficava sabendo dos detalhes da vida dele. E perguntei se tinha mais e vi que tinha prateleiras inteiras que eu podia pegar, e fui lendo vidas de santos.
Também passei por essa experiência de ser coroinha na minha cidade, Macau, no Rio Grande do Norte, Brasil. Também fui escoteiro e estudava no colégio organizado pelo Padre Penha, que depois vim a saber que era tio de um colega professor da UFRN. Mas não tive a sorte do professor Raphael Tonon, de ter uma biblioteca tão vasta para poder ler tantos livros quanto eu quisesse. Minha família tinha mais dificuldades financeiras do que a dele e tive que logo cedo gastar muito odo meu tempo em atividades de trabalho informal para contribuir com o esforço dos parentes. Porém, hoje estamos aqui fazendo essa conexão que a providencia divina nos oferece e dividimos com tantos outros que precisam dessas informações.
Irei colocar aqui, com poucas adaptações, a aula do Prof. Luiz Raphael Tonon, com estreia no dia 26-06-2022, pelo Centro Dom Bosco, no Youtube, com 58.000 visualizações em 16-07-2022.
Ainda menor, entrei no seminário menor dos redentoristas e no ano 2000 eu vim um tempo emprestado pela província dos redatores de São Paulo para a província do Rio e vim para ficar na igreja de Santo Afonso, na Tijuca. Padre Penido era vivo ainda e esta foi minha experiência de Rio.
Já gostava muito de história, gostei muito de vir ao Rio e por ver aquilo que eu já conhecia. Depois deixei o seminário e fui me dedicar ao magistério, me licenciei em filosofia e tornei-me professor da rede pública do Estado de São Paulo. Depois ingressei na rede particular e depois fui fazer História, que era meu desejo inicial.
Passei a ensinar mais História que Filosofia e já são 18 anos como professor. Sempre lecionei Filosofia, Sociologia, História e Ensino Religioso, por conta das matérias do tempo de Seminário.
Em Campinas, onde deixei o Seminário, conheci minha esposa, namorei, casei e hoje pertenço ao Instituto Laical, que é um Instituto Misto, uma comunidade com sacerdotes e leigos, muitas famílias, minha esposa faz parte e eu também.
Fui professor da História da Igreja no Seminário em Campinas e fui desligado da função por motivos óbvios, como vocês verão. Não permaneci na função, mas ensinei aos seminaristas por um tempo e também fiz um apostolado semelhante a esse do Centro Dom Bosco, e que aqui é mais extenso. Aqui se fala de todos os assuntos, eu era mais restrito, eu dava um curso da História da Igreja que funcionou por 10 anos, presencial e muito procurado por protestantes. Eu sempre perguntava, o que vocês vieram fazer aqui? Eles me diziam que procuravam ali o que nas suas denominações não ouviam. Nós falávamos da Igreja Primitiva até os Atos dos Apóstolos e depois dávamos um salto até o século 16.
Uma vez um protestante disse que não era possível que o Espírito Santo ficou dormindo esse tempo todo. Essa pessoa disse que era filho de um pastor batista e depois de acabar o curso ele pediu o sacramento e eu fui o padrinho dele.
E assim aconteceram vários casos lá em Campinas, com pessoas que estudavam a história da Igreja e como consequência final tornaram-se católicos. Para quem é católico, o curso fazia tornar-se melhor ainda, um católico de verdade, aferrado aquilo que é a fé da Igreja, a fé dos apóstolos, a fé de sempre. E é um caminho natural, lógico.
Atualmente sou professor, ainda atuo em dois colégios católicos, mas a minha presença nas escolas tem diminuído ano a ano e tenho passado a dar aulas particulares. Tenho vários alunos em todos os cantos do Brasil e tenho migrado mais para isso justamente por essa questão ideológica.
Hoje em dia há uma militância, uma perseguição, uma ignorância mesmo, não invencível, mas culposa: as pessoas não sabem e não querem saber dentro das instituições de ensino.
Realmente, essa invasão ideológica nas escolas trouxe um enorme prejuízo para o potencial racional do país. Não sabemos a realidade da nossa história e quais os principais fatos que deviam nortear nossa opinião para um caminho reto, sem os desvios propositais que as falsas ou tendenciosas tentam nos colocar. Digo isso pois fui vítima desse processo perverso e somente hoje, professor universitário e com doutorado e longos anos de militância em partidos de esquerda, é que vejo o quanto fui ludibriado e que, infelizmente, muitos colegas meus de academia, continuam reféns das falsas narrativas que foram inoculadas em suas consciências, nessa revolução cultural da qual somos vítimas inocentes.
Fui aquela festa na companhia da minha irmã que fora convidada por uma amiga dela. Apesar dos meus 19 anos, época de ser festeiro como a maioria da minha faixa etária, eu sempre fui avesso, uma espécie de Dom Casmurro, introvertido com minhas emoções e inibido nas minhas relações, principalmente com o sexo feminino. Isso ficava mais evidente quando eu percebia uma garota e sentia por ela alguma emoção positiva, uma sensação libidinosa que me vinha a mente e era automaticamente rechaçada por meu espírito. Por isso, mesmo me sentindo atraído pela garota, eu procurava ficar afastado dela, nem ao menos me permitia olhar para ela.
Pois assim fiquei naquela festa... depois que minha irmã se encontrou com as amigas, eu terminei ficando escanteado, assistindo o volateio das pessoas umas entre as outras e o burburinho de um falatório entremeado de risadas e mudanças de tons. Alguns se contorciam numa pista de dança improvisada, outros sem querer soltar os seus copos, que parecia ter dentro algum combustível para liberar tanto gasto de energia.
Foi assim que percebi entre tantas, uma garota, meio simplória. Não tinha sobre si tanta maquiagem e sua roupa era também simples, mas bem adequada ao seu corpo, bem torneado, permitia mostrar suas curvas devidamente cobertas, sem nenhum excesso de exibição. Centrei a minha observação nela, à distância. Notei que ela estava naquele salão de dança improvisado, sem demonstrar tanto interesse, cortejada por um rapaz com copo na mão e que exibia seus passos de dança, sendo correspondido pela garota, sem tanta energia. O seu aspecto físico me atraia e o seu modo de se comportar mais ainda. Notei como destoava daquele parceiro, talvez uma paquera ou mesmo namorado.
Passei a ter uma atenção centrada naquela menina... passou a funcionar em mim o que eu tinha de mais forte: a imaginação, os sonhos... imaginava que passava perto dela, trocava um olhar e um leve sorriso. A partir daí nossos olhares se procuravam, discretamente, sempre ela procurando fugir do assédio do companheiro que dançava e bebia na sua frente.
Por uma feliz coincidência (ou não?) o seu olhar cruzou com o meu, apesar da distância. Senti uma espécie de choque elétrico na mente, me puxando dos sonhos para a realidade. Notei que ela procurava novamente o meu olhar e aí fui dominado por meus impulsos inibitórios, negativistas, e procurei fugir do olhar dela. Até mesmo de sua presença. Fui para um espaço mais distante, onde eu não tinha mais a visão do salão improvisado.
Fui até uma mesa onde tinha a disposição uma jarra com sucos arrodeada de salgadinhos. Pequei um copo e fui até a torneira onde tinha um suco de cor amarelada, sem identificação, mas que imaginei ser de cajá ou maracujá, ambas frutas que gosto.
Senti uma presença logo atrás de mim e meu coração disparou. Antes de vê-la eu a senti. A garota do salão estava também com um copo na mão esperando a vez de enche-lo com o suco que eu também iria beber. A minha mente entrou em descompasso. Não tinha mais condições de construir nenhum tipo de imaginação. Queria fugir daquela situação, desaparecer, me tornar invisível. Nunca imaginei que uma torneira como aquela da jarra de suco, fosse tão lenta para encher um copo tão pequeno. Mas eu devia me controlar, não podia deixar que o alvoroço da minha mente e do meu coração se expressasse em tremor nas minhas mãos...
Não cheguei a encher o copo. Um pouco acima da metade, fechei a torneira e dei espaço para ela se aproximar. Não podia sair correndo como eu queria e fiquei parado, melhor dizendo, paralisado ao lado dos salgados e com medo de pegar algum e mostrar o tremor que eu começava a sentir no meu corpo. Para piorar, ela voltou aquele olhar angélico sobre mim e um leve ar de riso. Isso foi como uma injeção de adrenalina diretamente no centro do coração. Acredito que o meu olhar era de estupefação, e o riso que deveria sair solidário, acho que saiu na forma de uma careta. Minha imaginação voltou a funcionar no modo negativo... “ela deve estar pensando que sou um retardado mental”. Essa imaginação não ajudava em nada, pelo contrário, piorava!
Mas a situação foi se enrolando cada vez mais. O rapaz que fazia parceria com ela no salão, chegou próximo de nós com o seu inseparável copo na mão. Pude perceber pelo modo dele falar e do hálito que exalava, que se tratava de bebida alcoólica e que já estava fazendo efeito. Ele chegou no modo “macaco” do alcoolismo, onde a pessoa faz tudo para ser engraçado, até inconveniente. Chegou perto de nós e sem a menor cerimônia foi logo falando...
- Ei... então você está aí, né? Fugiu de mim? E achou um amiguinho? Então vamos brincar... vamos fazer um joguinho...
E se dirigiu para mim, com uma postura meio cambaleante e um sorriso irônico no rosto.
- Vamos ver se você sabe o valor do prazer... responda rápido... eu f... você. Você f... ela. E ela me f.... Quem tem maior prazer?
Respondi rápido como ele queria.
- Eu não participo desse jogo!
- Mas porque não?...
- Por que eu não quero f..., eu quero a amar!
Isso foi uma bomba que eu soltei que não soube de onde veio. Imagino que do fundo do coração, se revoltando contra a minha inibição e com tamanha falta de consideração dessa pessoa que me interpelava atingindo uma pessoa que eu admirava.
De repente aquela festa deixara de existir. Eram apenas nós três sentindo os efeitos emocionais da bomba que eu acabara de lançar com minhas palavras. Senti o efeito do álcool se dissipar da mente do meu interlocutor, sua voz ficou titubeante, sem conseguir se articular. Pediu refúgio em mais um gole do seu copo, como para voltar o grau de embriagues que o protegesse de sua gafe.
A garota também se mostrava impactada. Seus olhos bem abertos, talvez um pouco umidificados, exprimiam admiração, gratidão. Não disse uma só palavra, não era preciso. Voltou a dar um sorriso, dessa vez mais intenso, antes de sair, como a dizer: “eu também quero te amar”.
Mas de todos, o mais impactado fui eu. Fui eu o autor e o emissor da bomba! A bomba que quebrou as muralhas que prendiam a minha verdadeira alma. Mostrou que para mim o sentimento do amor está acima do prazer carnal. Mostrou que a pessoa amada deve ser venerada antes de ser penetrada. Que o respeito à pessoa humana deve sempre estar acima dos desejos animais. E, principalmente, que meus sentimentos positivos jamais devem ficar presos ou escravizados por medos imaginários.
Aquela garota serviu de chave para abrir todas as minhas algemas emocionais. Não trocamos uma só palavra, mas nossos olhos comunicaram o que nossos corações sentiram. Ela foi embora e não combinamos nada, nem ao menos sei o seu nome nem ela sabe o meu, mas eu conheço o seu coração e ela conhece o meu. O destino talvez seja o nosso Cupido e mais adiante no tempo, talvez, a mesma frase que usei como bomba, eu possa usar como convite:
- Eu quero a amar!