- (E) Senhor, Valentim, se eu fosse comparar o meu cérebro com uma máquina eu estaria falando de um fusquinha. Mas mesmo assim vou me atrever a fazer uma pergunta. Em que medida a organização que a gente tem nas nossas cidades, porque, veja, a medicina foi eficiente em reduzir tanto a incidência, quanto a prevalência e também a letalidade de doenças como infarto, câncer, pestes... Quer dizer, invenção de antibióticos, vacina, anestesia, manobras avançadas de vida, melhoraram a nossa vida, mas o que se nota é que a incidência e a prevalência de doenças mentais está aumentando. Em que medida essa forma de organização em torno de nossas vidas, essa pressão constante que nós temos, diga o celular que toca a qualquer momento, um excesso de pressão sobre a nossa vida, o fato de não poder mudar de faixa com medo de atropelar alguém, medo de sermos assaltados numa esquina, o que nos dá essa nova forma de organização que contribui para essa mudança do perfil epidemiológico das doenças mentais.
- (V) Fora a pressão demográfica.
- (E) Fora a pressão demográfica.
- (V) Tem vários componentes. Um dos que chama mais a atenção é o quanto nós não temos uma atitude ecológica em relação a nós mesmos, né? Nós falamos do meio ambiente, nós achamos que não devemos poluir os rios, nossos recifes de corais que estão morrendo, achamos que não devemos poluir o ar que respiramos, mas na hora do meio interno... se você procurar a ecopsicologia, você vai encontrar psicólogos falando do meio ecológico, mas ninguém falando de...
- (E) Não tem uma Sociedade Protetora do ser humano.
- (V) Não, ninguém trata com a mesma consideração o meio interno como se espera seja tratado o meio externo. Veja o que nós estamos fazendo em termos de trabalho. Agora são 10h30 da noite, nós temos luz artificial, e se for 300 anos atrás, não existia luz artificial e ninguém ia trabalhar as 10h30 da noite. Só que nós desenvolvemos técnicas de resiliência para isso. Nós temos uma saúde melhor, todas essas coisas que você disse, nossas vacina, nossa alimentação, supostamente a gente descansa. Quando você vai para a população geral, isso já não é bem verdade. E se você tem aqueles parâmetros que você estava mencionando há pouco, quanto tempo a pessoa leva para ir ao trabalho e voltar para casa, ai, uma parte das 24 horas do dia é em condições estressantes. Eu gosto de lembrar sempre, que eu prefiro morar nas nossas condições estressantes de hoje do que nos tempos bíblicos. Eu acho que as condições eram muito estressantes. Primeiro, a gente vivia a metade do que a gente vive. Segundo, uma boa parte dos nossos filhos não viviam o suficiente para se tornarem adultos. Terceiro, as pessoas tinham um poder de destruição da vida humana não contido. Então, sob alguns aspectos eu me sinto mais seguro hoje do que me sentiria no ano 1000. Só que tem umas coisas que as pessoas estão fazendo que a gente pensa que faz como se fosse parte natural da nossa vida e que são, do ponto de vista médico, e você, como professor de patologia sabe melhor do que eu, são muito ruins, quer dizer, a gente consome de substâncias nocivas, do ponto de vista psiquiátrico, o que a gente consome de cafeína, o que a gente consome de teínas de forma geral, o que a molecada está usando de droga, o que isso vai piorar com a liberação geral que está se propondo por aí, o que a gente já sabe que isso compromete o funcionamento do sistema nervoso na adolescência, o quanto tem de medicamentos com efeitos nocivos para o sistema nervoso, tanto medicamento psiquiátrico como medicamentos que tem repercussões no sistema nervoso e que afeta o comportamento, o emocional, deflagra crises de pânico, deflagra depressão, deflagra transtorno bipolar, deflagra psicoses. Então, de fato, para esse conjunto é preciso muita resiliência para combater.
- (E) Dr. Valentim, o senhor considera respondida a questão?
- (V) Considero.
- (M) É porque eu teria que encerrar o bloco, mas eu não quero fazê-lo antes da pergunta do próximo entrevistador.
- (E) Valentim, eu tenho a impressão que a síndrome do pânico é uma questão complexa e perturbadora neste momento. Eu tenho uma experiência incomum que eu recebo na redação da Scientific American telefonemas e e-mails de pessoas se queixando, ou que ela própria está sofrendo ou que uma pessoa está sofrendo a síndrome do pânico. Eu tenho uma relação, evidentemente, de clínicas de atendimento e eu passo imediatamente. O que explica essa emergência da síndrome do pânico, o que o senhor diria para um dos nossos telespectadores que muito provavelmente está experimentando essa sensação descrita como dramática.
- (V) Ela é dramática, eu posso garantir porque eu fui voluntário de uma pesquisa que eu era o coordenador e eu resolvi ser o primeiro a tomar determinado medicamento, e eu não sabia, mas deflagrava crise de pânico. Então, eu tive 40 minutos de crise de pânico dentro do hospital das clínicas e eu espero não ter uma segunda ...
- (M) Como é que é...
- (V) Eu estava anestesiado, com uma equipe de anestesistas competentes, com sedativos, na verdade não estava anestesiado, estava sedado, e esse medicamento era para reverter a sedação. E a instrução que eu tive do fabricante, na época, era que devia dar uma injeção em bolo, uma quantidade rápida para reverter a sedação. É um medicamento que é usado quando a gente quer interromper a sedação em procedimentos anestésicos ou sedativos, ou para reverter overdose, para reverter superdosagem, tentativas de suicídio, de acidentes ou coisa assim. Só que quando você usa o remédio dessa forma, você mexe com o controle emocional de uma forma tão brusca que a reação do organismo é de um alerta muito grande e de toda ativação do circuito de reação e defesa, o que te dá a sensação de morte eminente. Então, a sensação que eu tinha é que alguma coisa saiu errada no meu experimento e que eu estou desmaiando e que as pessoas não vão saber o que fazer comigo. Depois de um minuto ou dois eu sabia que não ia acontecer nada, mas eu estava tremendo, suando, taquicárdico, respirando com dificuldade...
- (M) O senhor recomenda ao...
- (V) Eu recomendo que não tome esse remédio desse jeito...
- (M) Ao portador da síndrome do pânico
- (E) Essas pessoas provavelmente estão nos vendo neste momento e sofrem dessa...
- (V) A sensação pior da síndrome do pânico, é a sensação de que alguma coisa muito grave está acontecendo, que pode afetar a sua integridade física, a sua integridade mental. As pessoas que tiveram alguma crise sabem que isso não vai acontecer, ninguém morre de crise de pânico, mas o sistema é feito para te alertar para um risco eminente, e aí a tua respiração vai ficar rápida, superficial, vai ter formigamentos, seu coração vai bater forte, rápido, a sensação vai ser de zonzeira, se você pudesse se olhar estaria pálido, suando frio, você está tremendo por dentro que é uma sensação muito desagradável... e você pode não entrar em pânico...
- (E) Você passou por todas essas experiências?
- (V) Passei... então você pode pensar... eu estou tendo uma crise de pânico, vou esperar passar, eu conheço algumas pessoas que fazem isso. Mas isso é como se fosse um faquir aprendendo a lidar com a dor. Existem algumas técnicas comportamentais que ensinam você lidar com essas crises de pânico, tentando entender que você não vai morrer, que isso é uma coisa transitória. Existe outra forma mais eficaz de lidar com isso, existem algumas outras técnicas de terapia, que existem alguns medicamentos que são bastante eficazes. E não são só os calmantes. Os calmantes atuam na hora, mas não impedem que isso volte. Só que tem algumas coisas que deflagram crises de pânico, e uma delas é bastante café. Isso para não falar de drogas estimulantes de forma geral. A maconha pode dar crise de pânico, a cocaína pode dar crise de pânico, crack pode dar crise de pânico... mas cafeína... numa redação, por exemplo, a pessoa que toma meio bules de café ou mais, a mão vai ficar fria, o coração vai acelerar, a crise de pânico é muito maior. Você pode iniciar uma crise de pânico, simplesmente aumentando o teor de CO2 no ambiente; então, um lugar muito cheio de gente pode aumentar o CO2 e isso pós certo teor de gás carbônico, e quem já teve uma crise de pânico corre o risco de sofrer outra.
- (E) Explica esse tipo de crise de pânico
- (V) O reconhecimento, ne? As pessoas estão usando mais substâncias que deflagram essas crises, privação de sono que é uma das coisas que deflagram, as pessoas fazem uma porção de agressões que podem deflagrar isso... o problema é que antigamente isso não era reconhecido. Quando eu via os primeiros casos logo que me formei, eu achava que isso era simplesmente uma crise de ansiedade. O diagnóstico de transtorno de Pânico é de 1964.
(M) Bem, vamos para um rápido intervalo e voltamos já.
Concordo na íntegra.
Vou mudar o título das sequencias em torno de cada assunto, uma vez que a questão das drogas vai ser encontrada mais adiante. Não faço reparos na palestra do Professor Valentim, pois o pensamento dele se enquadra totalmente no meu. Caso aconteça alguma opinião contrária da minha parte, irei colocar no próprio texto que esteja sendo apresentado.
- (E) – Professor, eu também queria apontar uns dados da Organização Mundial de Saúde, que é o seguinte: no ano 2000 ela apontava a depressão como a 5ª causa de incapacitação. A previsão é que em 2020 a depressão seja a 2ª causa. Dados do Ministério da Previdência Social mostram que no ano passado mais de 100 mil trabalhadores foram afastados do trabalho por conta de depressão. E dados de medicamentos apontam que houve um crescimento de 49% de 2007 a 2011 no consumo de antidepressivos no Brasil. Em 2011 foram 34 milhões de unidades vendidas. O que eu queria saber do senhor é o seguinte: as pessoas estão mais deprimidas, há um excesso de diagnóstico, e um excesso de indicação de medicamentos?
- (V) Um pouco de cada uma dessas coisas. Existem alguns trabalhos mostrando, que ao contrário do que se diz, a incidência de doenças mentais graves está aumentando na população. Tem um livro que eu gosto muito de citar, que chama “A peste invisível” de Fuller-Torrey e uma coautora chamada Judy Miller. É um livro da década de 90. O que eles viram, são dados estatísticos confiáveis, em cinco países, de 1750 até 1990. E a prevalência, na verdade, de transtornos mentais significativos, como depressão grave, psicose e outras coisas, aumentaram nove vezes. As pessoas falam que não está aumentando a incidência de esquizofrenia. Tá aumentando, tem um estudo no sul de Londres mostrando que está aumentando a incidência de esquizofrenia, principalmente na população com menos de 35 anos. Quando a gente vai para a depressão, depressão é descrita desde o Velho Testamento. Só que existem muitas síndromes, muitas formas de ver a depressão. Algumas delas são conceituações mais recentes que a psiquiatria fez. Então, houve uma expansão do conceito de depressão. Nós não ficamos só naquelas síndromes clássicas, mais nucleares, que são do ponto de vista médico as mais consistentes. Nós temos hoje algumas formas de depressão reativa, que passam a ser reconhecidas, algumas formas de pressões sazonais que não eram bem identificadas que hoje a gente sabe que existem, formas de depressões que são consequências de doenças médicas e que são mais valorizadas. A população começou a perceber que aquele sofrimento que ela tinha não era compreensível simplesmente como uma reação, mas que era uma coisa tão fora do padrão normal dela que devia se constituir em alguma coisa médica e começaram a pedir ajuda. A indústria farmacêutica encontrou moléculas diversas capazes de ser mais eficazes nesses diversos quadros do que placebo que é uma substância inerte. E quando você tem um ensaio clínico controlado mostrando que uma nova molécula se mostrou segura, é mais eficaz do que placebo em condições controladas ela pode ser chamada de antidepressivo e o que a gente tem hoje são 30, 40 moléculas antidepressivas, e é claro que por razões econômicas, os medicamentos mais recentes recebem maior publicidade e os fabricantes que têm de responder aos seus acionistas gastam uma quantidade significativa de recursos para poder recuperar o dinheiro que hoje é estimado em mais de 1,3 bilhões de dólares por molécula lançada. O que está acontecendo hoje é que não existe mais perspectiva de moléculas novas serem lançadas nos próximos anos. As linhas de produção estão secas. Muitas poucas moléculas vão aparecer, e o que existe depois de 60 anos, desde o primeiro antidepressivo, quase 60 anos, é que o último lançamento não é mais eficaz que o primeiro. Então, o que nós temos é que todos eles são mais eficazes que os placebos. Alguns deles funcionam mais em determinadas formas de depressão do que em outras. Alguns talvez devam ser mais chamados antidepressivos do que os outros. Alguns desses que são muito eficazes são muito antigos. Não existem medicamentos modernos, existem medicamentos recentes. Então, se a gente somar os medicamentos recentes com os medicamentos antigos, nós veremos que eles tem ligeiras diferenças de perfil de ação. Mas toda a publicidade em relação ao lançamento de novos medicamentos são feitas como se eles fossem todos equivalentes. Esse aqui é tão eficaz quanto o anterior, mas mais seguro. Isso na verdade não se comprovou. Então, tudo isso que você falou é verdade. A gente teve um aumento da conceituação de depressão e isso dá um aumento na população que a gente identifica, isso nos estudos epidemiológicos de depressão. Essa população pede ajuda, só um terço dessa população recebe ajuda efetiva, mas isso é um volume crescente. E quando a gente fala de bilhões de unidades a questão toda é: foram bem escolhidos? Foram adequados para aquele tipo de problema? E é isso que eu acho nesses próximos anos, o que a gente vai passar. É ver de fato qual é a efetividade do tratamento que é feito, qual a eficiência do investimento do dinheiro público.
- (E) Porque tem a questão dos efeitos colaterais também nos pacientes.
- (V) É tem a questão dos efeitos colaterais e aí tem a questão do custo-benefício. Se você está medicando em excesso, é inadequado. Por outro lado, o que a gente tem de informação dos estudos epidemiológicos, não é que estamos medicando em excesso, pois só um terço da população com diagnóstico está recebendo tratamento. Na verdade nós temos dois terços da população que tem diagnóstico no último ano e não recebeu nenhum tratamento, no Brasil e em vários países. Se nós fôssemos pensar em termos de mercado, o mercado é muito maior do que está aparecendo. O problema é: será que todo mundo precisa ser tratado com medicação? Existem algumas formas de psicoterapia que são muito eficazes. Qual é o custo-benefício dessas formas de psicoterapia? O que a gente pode fazer de prevenção? O que a gente pode fazer de prevenção de recaída? O que a população está fazendo para se prevenir contra depressões, por exemplo? Quantas coisas a gente faz e deflagram depressões? Isso tudo, e a gente não tem, infelizmente ainda, programas de prevenção implantados. Então, a racionalização, o uso adequado, o diagnóstico correto, e a forma eficiente de atendimento é uma questão para os próximos anos.
Achei melhor substituir o trecho da entrevista com o Dr. Valentim Gentil Filho, como anunciei no texto anterior, pela entrevista completa feita em 04-11-2013 na Rede Viva, com 10.687 visualizações.
- (Moderador) Boa noite! Está começando mais um programa transmitido ao vivo pela TV Cultura, TV Brasil, Emissoras Afiliadas e pelo Portal UOL. Nossos entrevistadores convidados de hoje, são: Fernanda Bacetti, repórter de saúde do Jornal Estado de São Paulo; Luciana Sadi, psicanalista, escritora e blogueira da Folha de São Paulo; Aureliano Biancareli, jornalista da área de saúde; Dr. Paulo Saudiva, professor titular da Faculdade de Medicina da USP; e Ulisses Caposoli, editor chefe da Revista Scientific American Brasil. Teremos também os twiteiros convidados e nosso cartunista Paulo Caruso. Dr. Valentim Gentil, muito obrigado, em primeiro lugar, pela aceitação do convite, por estar aqui entre nós. O Sr. Costuma se referir ao cérebro humano como o ápice da perfeição. Eu pergunto, primeiro, por que o senhor diz isso, e segundo, por que uma máquina tão perfeita está sujeita a tantas e tão sérias avarias?
- (Valentim) Primeiro, é um grande prazer está aqui de novo. Eu acredito que seja o ápice da perfeição porque em torno da estruturação da matéria nós não conhecemos nada mais sofisticado, são 100 bilhões de células, cada uma delas podendo estabelecer mil conexões com outras células, usando uma infinidade de substâncias químicas, e cada vez que essas substâncias químicas chegam até os receptores provocam o que hoje a gente já sabe que é uma cadeia de outras reações químicas, que acabam transformando inclusive a composição do neurônio que recebeu essa informação. Tudo isso numa velocidade fantástica. Existem cérebros sofisticados em outras espécies, mas o nosso de fato atingiu o máximo que a gente conhece de processamento de informações. Não conseguimos hoje simular muito mais do que um milímetro cúbico de matéria cinzenta nos nossos supercomputadores. E uma estrutura tão sofisticada, com tantas conexões, com tantos sistemas funcionando na velocidade que funciona, ao longo hoje de mais de 80 anos de vida, inevitavelmente está sujeito a intempéries e avarias. O mais surpreendente para mim é a capacidade de resiliência que esses órgãos têm, tanto os humanos como os outros, porque nós nos submetemos a todo tipo de agressão ao longo da vida, desde os nossos hábitos alimentares até nossas condições de vida estressante. Apesar disso nós continuamos operacionais. Então eu acho que isso, de fato, se fosse uma máquina de fato, ela não resistiria muito.
- (M) Perfeito! Vou começar por um dos distúrbios antes de passar a bola para os entrevistadores. Começando pelo bê-á-bá mesmo pois muitos dos nossos telespectadores são leigos no assunto. Quais são os sintomas que caracterizam a depressão?
- (V) Depressão é um nome que nós damos para uma síndrome, na verdade. É um nome emprestado de Geografia, um nome emprestado de outras ciências que a medicina assumiu, mas que na verdade representa um conjunto de síndromes. Deixe eu falar de várias formas de depressão. Quinze, dezesseis, depende da nossa vontade classificatória. Nós psiquiatras temos esse hábito de classificar coisas para facilitar a comunicação e as vezes nos atrapalhamos com isso. Mas existe uma forma de depressão, uma síndrome depressiva, conhecida desde a mais remota antiguidade que é muito consistente. E aí a tristeza é somente uma dessas manifestações. Basicamente o que acontece em depressão é uma alteração do organismo, uma alteração sistêmica de ineficiência de processamento. E aí, o processamento de nossas funções vitais fica prejudicado, nosso apetite fica prejudicado, o sono fica prejudicado, a capacidade de concentração fica prejudicada, a nossa capacidade de tomar decisões fica prejudicada, nossa sensação de bem-estar, de alegria, de ter prazer nas coisas fica prejudicada, então, é sempre um conjunto de sintomas, e aí existem variantes nessas várias síndromes. Umas que pioram sistematicamente de manhã, outras pioram sistematicamente à noite, tem algumas que as pessoas emagrecem muito, outras que as pessoas engordam, outras as pessoas perdem o sono as 4 horas da manhã, outras as pessoas dormem até as 2 horas da tarde... Existem variações, e o que existe me comum é que todas elas causam sofrimento e causam prejuízos, uma das principais causas de incapacitação da humanidade.
- (Entrevistador) Eu queria saber como é que surgiu seu interesse por psicofarmacologia e pela psiquiatria.
- (V) Começou no interesse pela psiquiatria. Isso ainda antes de eu entrar para a Faculdade de Medicina, eu fui estudar medicina para ser psiquiatra. Eu estava nos anos 60, e estava fascinado com várias coisas que eu estava vendo ao meu redor. Mas quando eu tento identificar o meu primeiro interesse eu acho que era na verdade um jovem que eu conhecia, meu vizinho, que tinha um problema grave, que eu imagino fosse uma forma de esquizofrenia, quando a gente era muito jovem. Esse foi meu primeiro contato com alguém com doença mental. Depois quando eu estava na escolha de profissão, ainda sem saber se eu queria ser médico ou não, dentro da medicina, a área de psicologia, psiquiatria me interessava mais que o restante da medicina. A psicofarmacologia veio depois já da graduação pelo terceiro, quarto ano quando começaram a aparecer os principais estudos sobre o mecanismo de ação dos psicofármacos. E isso parecia para mim um instrumento interessante de entender ações mente-corpo. E acabei sendo professor de psicofarmacologia ou assistente de farmacologia durante 15 anos, mas o interesse era basicamente era usar os efeitos desses medicamentos para procurar entender a relação mente-corpo. E até hoje eu não entendo, e até hoje eu me surpreendo, e até hoje eu acho fascinante que de repente você mudando doses ou mudando medicamentos você tem uma mudança tão grande na resposta emocional ou você consegue reverter quadros que... é tão esquisito, você de repente aumenta uma quantidade do medicamento e a pessoa que está numa forte depressão ou noutro quadro igualmente perturbador, de repente ficam melhor. Isso continua sendo fascinante.
- (E) Professor, o senhor usou a imagem do cérebro como uma máquina e eu vou tomar a liberdade de chama-lo de mecânico. No Brasil pelos números da OMS nós somos 23 milhões de pessoas que sofrem de algum tipo de transtorno mental. Cinco milhões delas precisariam de alguma ajuda. Segundo o Conselho Regional de Medicina, são 7 mil e seiscentos especialistas em psiquiatria. O senhor não se sente impotente diante de tantas máquinas para serem “consertadas”?
- (V) Eu não conheço máquinas tão sofisticadas, mas, de qualquer forma, vamos ficar com a máquina. Ferrari pra cima, tá bom? Então a gente fica um pouco de mecânico. O número que eu tenho, é mais ou menos 9 mil pessoas que trabalham na área de psiquiatria e transtornos mentais, nos quais 5 ou 7 mil são psiquiatras. Alguns são especialistas, a maioria são afiliados a Associação Brasileira de Psiquiatria, que acabou de fazer um Congresso que tinha 5 mil participantes. Se eu tomar nossos dados epidemiológicos na cidade de São Paulo como parâmetro, que acho que são mais confiáveis que os da OMS, 30% da população um dia vai ter um transtorno que nós psiquiatras somos capazes de diagnosticar e catalogar. Então, na megacity de São Paulo, um estudo feito metodologicamente adequado, encontrou esse tipo de prevalência. Isso é uma prevalência ao longo da vida. Se a gente pegar o último ano, isso cai para a bagatela de 17%, que é um número enorme de pessoas. Só um terço dos quadros graves recebeu algum tratamento no último ano. São dados da professora Laura Andrade e colaboradores, publicados em 2012. Então, de fato nós temos uma situação de desassistência fenomenal.
A maior parte dos quadros, felizmente, não é muito grave. Mas, quando a gente pega as pessoas que estão sofrendo bastante depressão, transtorno obsessivo compulsivo, várias psicoses, transtorno bipolar, algumas formas de neurose grave, eu me sinto realmente numa situação equivalente de um cardiologista que soubesse que muita gente tem infarto, hipertensão, angina, insuficiência cardíaca e não está recebendo atendimento. De tudo isso, o que mais me incomoda, é saber que tem mais de 15 mil pessoas morando nas ruas de São Paulo, e que pelo menos 1500 delas tem uma psicose grave, da família das esquizofrenias, e que tem mais de 55 mil moradores de rua no Brasil, segundo um levantamento mais ou menos recente. Se 10% dessa população tiver os quadros mais graves como esquizofrenia, são 5 mil pessoas sem atendimento. Então, nós estamos numa situação de desassistência fenomenal. Agora, junte a isso o número de pessoas que está recebendo atendimento inadequado, junte a isso as pessoas que não estão nas ruas, mas estão em casa, e algumas delas que estão inclusive fechadas em alguns ambientes que o Ministério Público de vez em quando é chamado para ver essa situação de cárcere privado. E as manifestações que eu tenho visto recentemente do Ministério Público são muito humanitárias, quer dizer, eu vou processar essa família que isolou essa pessoa, como se fosse um cárcere privado, eu vou responsabilizar as autoridades por não dar o atendimento que precisa, o que é que eu vou fazer? A Justiça hoje está com dificuldade de lidar com essa situação. Esse é um fenômeno mundial. Quando a gente fala da realidade, da megacity São Paulo, ela corresponde o que ocorre em países ainda não desenvolvidos. Um terço da população, só, recebe atendimento.
Das opiniões do Youtube sobre o uso de drogas, sobre a liberação ou não, irei transcrever a última, do Dr. Milton Friedman, que é a seguida por meu interlocutor:
“- O que leva você a acreditar que as drogas deveriam ser legalizadas?
- Durante a proibição, quando eu era adolescente – a proibição foi encerrada em 1933, quando eu tinha 21 anos de idade, então eu era um adolescente durante a maior parte do período de proibição. O álcool era facilmente encontrado. O contrabando era comum. Qualquer ideia de que a proibição evitava o consumo de álcool é absurda. Haviam bares clandestinos por toda parte. Mas, mais do que isso. Nós tínhamos essa cena do Al Capone, dos sequestros, das guerras entre gangues... Qualquer que tivesse olhos podia ver que a proibição era um mau negócio, e que fazia mais mal do que bem. Além disso, eu me tornei economista. E como economista, eu acabei reconhecendo a importância dos mercados, da livre escolha e da soberania do consumidor e acabei concluindo que a verdadeira ameaça se dá quando você interfere nestes aspectos.
- Quais os efeitos da criminalização das drogas?
- O efeito da criminalização, de se tornar as drogas ilegais, é levar as pessoas de drogas moderadas para drogas pesadas.
- Em que sentido?
- Bem, a maconha, por exemplo, é uma substância bastante pesada e volumosa e, portanto, é relativamente fácil de intervir. As forças de combate antidrogas têm sido mais bem sucedidas interditando a maconha do que, digamos, cocaína. Então, os preços da maconha têm subido, tem se tornado mais difícil de se conseguir. Houve com isso um incentivo para o cultivo de maconha mais potente e as pessoas têm migrado da maconha para a heroína, ou cocaína, ou crack, ou outras drogas.
- Consideremos então outra droga, o Crack.
- O Crack nunca teria existido, na minha opinião, não fosse pela proibição às drogas. Por que o Crack foi criado? Porque a cocaína era cara.
- Como a legalização das drogas afetaria a sociedade?
- Eu vejo a América com metade do número de prisões, metade do número de prisioneiros, 10 mil homicídios a menos por ano, cidades do interior nas quais há chance para essas pessoas pobres viverem sem temerem por suas vidas, cidadãos respeitáveis, e que agora são viciados, não se tornando criminosos a fim de obterem suas drogas, e sendo capazes de conseguirem drogas das quais têm certeza sobre sua qualidade.
- Explique como a guerra às drogas acaba protegendo os cartéis.
- O papel do governo é proteger o cartel das drogas. Isto é literalmente verdade.
- E ele está fazendo um bom trabalho?
- Excelente. O que eu quero dizer com isso? Em um mercado livre qualquer – peguemos as batatas, ou carne, por exemplo – existem milhares de importadores e exportadores. Qualquer um pode entrar nestes negócios. Mas é muito difícil para um indivíduo entrar para o negócio da importação de drogas porque os esforços de intervenção do governo eleva muito os custos dessa atividade. Então, as únicas pessoas que conseguem sobreviver nesse negócio são os grandes carteis como o de Medellín que tem dinheiro suficiente para adquirir frotas inteiras de aviões, usar de outros métodos sofisticados e por aí vai. Além disso, mantendo esses produtos fora e prendendo, digamos, plantadores locais de maconha, o governo mantém o preço desses produtos alto. O que mais um monopolista pode querer?
- Qual a desvantagem da legalização das drogas?
- A única consequência negativa da legalização das drogas é de que pode haver algum aumento no consumo. Mas eu quero colocar isso de outra maneira: a criança que é baleada em uma favela por um atirador de passagem, em um tiroteio qualquer, é uma vítima inocente em todos os aspectos. A pessoa que decide fazer uso de drogas pela própria vontade não é uma vítima inocente. Ela escolheu para si própria ser uma vítima. E eu devo dizer que tenho muito menos compaixão por ela. Eu não acredito que seja moral impor custos tão altos em outras pessoas para proteger as pessoas de suas próprias escolhas.
- Abuso de drogas: problema econômico ou moral? Não é verdade que toda essa discussão, todo o problema das drogas é um problema econômico para...
- Não, não é um problema econômico de forma alguma, é um problema moral.
- Em que sentido?
- Eu sou economista, mas o problema econômico das drogas é estritamente terciário. É um problema moral. É um problema da ameaça que o governo está fazendo. Veja, eu estimei estatisticamente que a proibição das drogas produz, em média, 10 mil homicídios por ano. É um problema moral o fato de o governo estar matando 10 mil pessoas. É um problema moral o governo tornar criminosos pessoas que estão simplesmente fazendo algo que eu ou você talvez não aprovamos, mas que não está ameaçando a mais ninguém. A maioria das prisões são por posse de drogas por usuários casuais. Tomemos por exemplo alguém que quer fumar um cigarro de maconha. Se ele for pego, vai para a cadeia. Você acha que isso é moral? Isto é apropriado? Eu acho absolutamente vergonhoso que nosso governo, que supostamente deveria ser o nosso governo, esteja na posição de converter pessoas que não estão ameaçando ninguém em criminosos, destruindo a vida deles, colocando-os na cadeia. Para mim este é o verdadeiro problema.
- A proibição das drogas visa desencorajar o uso. Isso é positivo, certo?
- O caso da proibição das drogas é exatamente tão forte e tão fraco quanto o caso da proibição das pessoas de comerem demais. Todos nós sabemos que excesso de alimentação causa mais morte do que as drogas. Se a princípio é normal para o governo dizer que você não deve usar drogas porque elas vão lhe fazer mal, por que não é correto dizer que você não deve comer demais porque isso faz mal a você? Por que não é correto dizer que você não deve ir praticar skydiving (paraquedismo) porque isso pode ser fatal? Por que não é correto dizer “Ah, esquiar, isso não é bom, é um esporte muito perigoso, você vai se machucar”? Qual é o limite?
Qual é o limite? Restrições ao fumo? Legislação sobre o uso do capacete? Legislação sobre apostas? Direito ao porte de armas? Proibição de gorduras trans? Restrições para dirigir veículos? Lâmpadas fluorescentes? Controle termostático? Bafômetro? Liberdade de expressão?
- O que mais lhe preocupa na ideia das drogas serem legalizadas?
- Nada me preocupa na ideia das drogas serem legalizadas. Nada. O que me assusta é continuar no caminho que estamos agora, o qual vai destruir a nossa sociedade livre.
Exija dos políticos que você escolheu o fim da guerra às drogas. É o seu país! Por um governo menor.
LibertyPen.com
Porque as drogas deveriam ser legalizadas (Estudantes Pela Liberdade – 76 mil visualizações)”
Este material merece de minha parte uma série de reparações. Mas antes de fazer isso, irei colocar no próximo texto também a transcrição de um professor da Academia, psiquiatra Valentim Gentil Filho, com o qual tenho mais afinidade e compartilho a opinião. Acabo de mandar este vídeo para o meu interlocutor para que ele também formule a sua opinião sobre o contraditório.
(Os terríveis efeitos do uso da maconha - Abordagem do Dr. Valentim... www.youtube.com - https://youtu.be/WNIxtzi_diO)
Tenho uma posição definida no campo das drogas, acredito que a liberação do uso das drogas trás o benefício de diminuir o poder dos traficantes, mas por outro lado trás o prejuízo mais marcante na saúde da população, pois poderá desencadear doenças mentais com mais facilidade e frequência. Tenho recebido críticas contundentes quanto a esse meu posicionamento e a minha falta de tempo para investir em pesquisa universitária para contribuir na resolução dessa questão. Como as críticas vieram através do whatsapp, com participação nula da comunidade, procuro colocar neste espaço, pois aqui tem um pouco mais de espaço dentro da opinião pública, apesar de ainda não ser o ideal. Dessa forma irei colocar os argumentos que recebi nesta última semana.
24-12-2016
“É muito difícil apontar 3 justificativas para que o uso e venda de drogas sejam crimes, não é mesmo?
Compreendo. Seguem sugestões de argumentos.
E se LIBERARMOS as drogas pesadas DE VEZ? Hein Daniel Fraga? – YouTube (bukowskie shared a video. www.youtube.com). https://www.youtube.com/chared?ci=9e9liJCWxA0
Cauê Moura – Drogas: Libera Geral! (PT 2/2) – You Tube (bukowskie shared a video – www.youtube.com) https://www.youtube.com/shared?ci=OWMg4fccJvU
A Legalização das Drogas vai reduzir a Violência no Brasil? Reflita um pouco... – You Tube (bukowskie shared a vídeo – www.youtube.com) https://www.youtube.com/shared?ci=XKI5hcvZ5Rg
Os maconheiros e seus “argumentos” a favor da legalização do uso das drogas... – You Tube (bukowskie shared a vídeo – www.youtube.com) www.youtube.com) https://www.youtube.com/shared?ci=CagGtL7EwtQ
Veja que gente sensata.
Agora segue um vídeo de um maconheirinho defensor do uso de drogas e da decadência da humanidade. Vale informar que um filho dele morreu de overdose de heroína. E que em 1992 ele ganhou o Nobel de economia.
Porque as drogas deveriam ser legalizadas – You Tube (bukowskie shared a vídeo – www.youtube.com) https://www.youtube.com/shared?ci=sm9HwQnhmBQ
Veja aí qual com quem o seu ponto de vista se afina mais.
Eu fico com Milton Friedman. Com a razoalidade. Com a decadência. Com os direitos humanos. Com o cristianismo.
Apresentei os defensores dos dois lados. Intelectualmente, com qual lado você se identifica?
25-12-16
Existem dois tipos de pessoas que defendem que a atual política de drogas no Brasil e no mundo. Ou é um canalha e se beneficia da escrotice vigente, ou é ignorante, ingênuo. Não tem uma terceira possibilidade.
Por isso eu gostaria de ouvir suas razões para defender o indefensável.
Porque acredito que você o faz por desconhecimento da realidade, e gostaria de poder ajudar pra te tirar das trevas.
Mas como eu poderia ter uma opinião plausível? Afinal eu sou apenas um drogado. E a sua posição é a da autoridade. Claro que não se deve considerar o que eu digo.
Ou eu não penso adequadamente, porque a droga destruiu minha capacidade de raciocínio. Ou eu defendo essa ideia movido por interesse de drogado, qual seja, de poder usar drogas em paz, de ter acesso mais fácil à droga.
Eu usei e posso usar o que eu quiser sem qualquer influência da situação legal da coisa.
Então eu respondi...
Temos muito que conversar com pouco tempo... Mas não desistamos!
Esta foi a primeira fase da conversa que agora estou colocando tempo para ver o que foi enviado e no texto de amanhã irei dizer o meu pensamento, conforme foi o desafio do meu interlocutor.