Foi perguntado em “O Livro dos Espíritos” questão 967, em que consiste a felicidade dos bons Espíritos. Os próprios Espíritos responderam:
“Conhecer todas as coisas, não ter nem ódio, nem ciúme, nem inveja, nem ambição, nem qualquer das paixões que fazem a infelicidade dos homens. O amor que os une é para eles a fonte de uma suprema felicidade. Eles não experimentam nem as necessidades, nem os sofrimentos, nem as angústias da vida material. São felizes do bem que fazem. De resto, a felicidade dos Espíritos é sempre proporcional à sua elevação. Só os Espíritos puros gozam, é verdade, uma felicidade suprema, mas todos os outros não são infelizes. Entre os maus e os perfeitos há uma infinidade de graus em que os gozos são relativos ao estado moral. Os que estão bastante avançados compreendem a felicidade dos que chegaram antes deles: a ela aspiram. Mas é para eles objeto de emulação e não de ciúme. Sabem que deles depende alcançá-la e trabalham para esse fim, mas com a calma da boa consciência, e são felizes por não terem que sofrer o que sofrem os maus.”
Esta é uma boa explicação do Amor Incondicional na prática. Conhecer todas as coisas, mesmo assim não ter ódio apesar do egoísmo que grassa no mundo. Desses quatro itens citados pelos espíritos, eu acredito que já dominei muito bem todos eles. Não sinto ódio, ciúme, inveja ou ambição por nada ou ninguém. As vezes uma ação que considero muito injusta e que me atinge frontalmente, desperta a raiva, mas consigo a controlar e em vez dela crescer em direção ao ódio, ela retorna e faz com que minha relação com essa pessoa, que de alguma forma me contrariou ou foi de encontro aos meus princípios, querendo me obrigar aos princípios dela, faça com que eu reestruture minha forma de agir com ela. Mantenho certo afastamento para evitar que novo conflito se instale entre nós. Se mesmo assim ainda existem conflitos apesar do afastamento, isso provoca mais um afastamento. Até o ponto onde a distância não possa mais gerar conflito entre nós, e se adquira o relacionamento harmônico, mantendo a amizade e o amor, mas também mantendo a distância necessária para não ter mais desarmonia.
Sei que o meu comportamento que segue paradigmas muito diferentes do que são defendidos por nossa cultura gera em minhas companheiras muitas frustrações, apesar de toda explicação que dou ao meu respeito. Isso pode ser fonte de conflitos e, portanto, de afastamento. Significa que posso ficar longe de todas que se aproximam de mim, por esse motivo, e apesar de ter uma capacidade tão grande de amar, terminar por viver sozinho.
Então eu poderia perguntar a mim mesmo, como algumas pessoas já fazem, se eu sou feliz vivendo dessa forma. Talvez eu não tenha a felicidade espiritual que os Espíritos informaram acima. Mas não tendo nenhum daqueles quatro aspectos que foram citados, já me considero com um bom nível de felicidade, mesmo vivendo só, mesmo sabendo que tenho uma missão que talvez não possa concluir por não ser ainda tão perfeito.
“O amor deve ser um diálogo que liberta o outro para os outros. Liberta para amar mais. Quando o outro fica preso, não é amor. Ele deve permanecer fiel porque quer, não porque o impedem ou não tem outro jeito.” (Frei José Carlos, OFMCap)
Interessante como as lições do Mestre Jesus podem ser ampliadas e espalhadas pelo mundo todo por seus discípulos, das mais diversas feições que possam ter.
Esse texto do Frei José Carlos exemplifica bem isso, o confronto do Amor Incondicional com o amor romântico.
O Amor Incondicional é sempre um diálogo aberto cheio de liberdade de uns para com os outros. Quanto mais liberdade, mais capacidade de amar. Quanto mais alguém ama outro alguém, mais esse alguém se sente livre para amar outros... Essência da família universal que um dia construiremos. As famílias que acolhem, amam e incluem o próximo de acordo com suas tendências e afetividades, sem preconceitos ou intolerâncias.
Quando o outro fica preso ao outro, como é a tendência do amor romântico, e que exige reciprocidade, isso não é Amor Incondicional. O amor romântico tende a ser exclusivista, ciumento, intolerante com o partilhar do afeto. É cheio de carga afetiva associado ao prazer dos sentidos, dos impulsos corporais, dos instintos. Capaz de provocar uma paixão cega que só ver os seus interesses, que a mínima discordância do outro já gera ciúme e intolerância que facilmente entra no caminho da raiva, do ódio, da violência, até mesmo do crime.
O Amor Incondicional é fiel aos compromissos que assume, porque quer, não porque exista um controle externo sobre ele. A fidelidade do Amor Incondicional parece infidelidade ao amor romântico, e vice-versa. Quando eu digo que sou fiel à liberdade do Amor Incondicional, e que posso amar também a terceiros, quando isso acontece parece infidelidade a quem ama de forma romântica.
Portanto as duas formas de amar podem coexistir, pois estão dentro do livro da Natureza, mas devem ser devidamente conhecidas e deve ser obedecida a hierarquia superior do Amor Incondicional. O amor romântico pode mesmo existir, é belo, gratificante e prazerosa a sua existência, mas que saibamos controlar os seus arroubos, até mesmo se for desenvolvida uma paixão. Todos os sentimentos e desejos que aflorarem na consciência, não podem obnubilar os princípios do Amor Incondicional.
Dessa forma poderá ser construída uma família ampliada que se aproximará cada vez mais da família universal que será a base do Reino de Deus, como o Mestre Jesus já nos ensinou. Está chegada a hora do Reino de Deus, anunciava Jesus, a partir das transformações do nosso coração. Agora podemos dizer que é chegada a hora de construirmos a família universal, a partir da transformação das nossas família nucleares, entendendo que nossos corações já estejam transformados e cheios do Amor Incondicional. É hora de avançarmos nas lições do Mestre; que os mais atrasados purifiquem seus corações, façam a faxina do egoísmo. Nós que já entendemos o que seja Amor Incondicional não podemos continuar a construir famílias egoístas e exclusivistas, então façamos as famílias ampliadas com a liberdade, fraternidade e inclusividade, necessárias na formação do Reino de Deus.
As pérolas de sabedoria da Fé Bahá’í traz uma lição interessante com relação a fé:
... Digo-vos que qualquer um que se levante na causa de Deus, nesta época, será pleno será pleno com o espírito de Deus, e que Ele enviará Suas hostes do céu para ajudá-los, e que nada será impossível para vós se tiverdes fé. E agora lhes darei um mandamento que será um convênio entre vós e Mim – que tenhais fé; que vossa fé seja firme como uma rocha que nenhuma tempestade pode mover, que nada pode perturbar, e que perdure através de todas as coisas até o fim; mesmo se ouvirdes que vosso Senhor foi crucificado, não sede abalados em vossa fé; pois estarei convosco até o fim. Assim como a vossa fé, assim serão vossos poderes e bênçãos. Isto é o equilíbrio – isto é o equilíbrio – isto é o equilíbrio.
Então, a fé é a forma de ligação mais eficiente entre a criatura e o Criador. Como estamos na experiência de um mundo material, sem a lembrança de nossa origem espiritual, a mente fica muito ligada a esses aspectos materiais e termina por desconsiderar qualquer coisa que não impressione os sentidos.
Lembro quando eu vivia a duvidar da existência do Criador e formulava diversas hipóteses para justificar minha existência, origem e porvir. Confesso que em nenhuma delas eu me sentia tão confortável como quando decidi num esforço racional acreditar no mundo transcendental. A partir daí o meu raciocínio lógico fluiu com mais profundidade em campos nos quais os meus sentidos materiais não alcançam. Porém só consigo navegar por esses horizontes tão amplos se eu estiver revestido de fé. Caso entre a menor dúvida tudo desaba nas incerteza e todo o meu construto racional racha no meio. Não posso deixar entrar em mim a descrença em algo que já considerei e que avaliei ser o mais importante na vida, o mundo material.
Assim, a conceituação da fé como um convênio entre a criatura e o Criador é muito pertinente. Mesmo eu sendo tão displicente no ato de orar com regularidade e freqüência, tendo a consciência desse convenio entre mim e Deus, passa a ser mais uma motivação para a nossa comunicação, pois isso implica na formação de um ele entre nós. Fico agora mais confiante, pois sei que o Pai estar sempre ao meu redor, que organizou a Natureza para que tudo pudesse fluir com harmonia; a única criação que não obedece automaticamente as Suas ordens, somos nós, humanos, pois Ele nos dotou com o livre arbítrio. Assim eu posso decidir contra a Sua vontade, contra a harmonia da Natureza, devido a minha ignorância, mas aprenderei que pararei por esses erros.
Hoje tenho uma boa compreensão do que Ele quer que eu faça, recebo instruções sobre isso e orientações sobre o caminho a seguir. Sei das dificuldades que irei encontrar e peço forças para resistir as intempéries.
Lembro que ontem fiz uma indagação a Deus: QUE FAÇO, DEUS, AGORA? Logo em seguida, quase de imediato, por um instante que fiquei à espera e peguei num livro, e encontro a Liturgia do dia:
Depois que João foi preso, Jesus dirigiu-se para a Galiléia. Pregava o Evangelho de Deus, e dizia: “Completou-se o tempo e o Reino de Deus está próximo; fazei penitência e crede no Evangelho”. Passando ao longo do mar da Galiléia, viu Simão e André, seu irmão, que lançavam as redes ao mar, pois eram pescadores. Jesus disse-lhes: “Vinde após mim; eu vos farei pescadores de homens”. Eles, no mesmo instante, deixaram as redes e seguiram-no. Uns poucos passos mais adiante, viu Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão, que estavam numa barca, consertando as redes. E chamou-os logo. Eles deixaram na barca seu pai Zebedeu com os empregados e o seguiram.
Nessa lição Jesus reforça a preparação para a vinda do Reino de Deus que está próxima. Explica às pessoas que ele convida que serão a partir daquele momento pescadores de homens.
Logo a minha mente faz as devidas conexões com o que eu acabara de pedir ao Pai: um caminho a seguir. Jesus fez há dois mil anos um convite para que seus discípulos se tornassem “pescadores de homens”. Hoje temos espalhados pelo planeta milhares de “pescadores de homens” instruídos por Jesus e Seus discípulos. Mesmo assim o mundo se debate nas fogueiras do egoísmo, com todo tipo de crime e miséria florescendo em toda comunidade humana, seja bruta ou civilizada. Os atuais cristãos não conseguem construir esse Reino de Deus como o propósito ideal. Os relacionamentos que levam a formação da família estão cheios de egoísmo na sua base e que impede a expressão do Amor Incondicional; o que observamos é a simples execução do amor condicional... eu amo fulano porque ele está na condição de ser meu filho, meu marido, minha esposa, meu tio, e assim por diante. As vezes até esse modelo está contaminado e o egoísmo fomenta o ódio até mesmo dentro das famílias.
Enfim, esse chamado de Jesus para ser pescador de homens não se aplica mais a mim, pois Deus já viu que isso não irá modificar o modelo que já está instalado, da família nuclear fundamentado no egoísmo. Deus sutilmente colocou na minha consciência ao longo do tempo e alicerçado pelas leis da Natureza e pela ética evangélica, a formatação de uma nova família, a família ampliada como protótipo da família universal. Nesta família prevalece o Amor Incondicional e não o amor romântico; prevalece a fraternidade, a justiça, a tolerância, o amor inclusivo. Então entendi onde Deus queria que eu chegasse na minha compreensão: ele não quer que eu seja pescador de homens, e sim pescador de famílias.
Está aí o grande passo que Ele quer que eu realize. Que assuma essa nova compreensão, de corrigir a pureza da família, tirando do seu interior o egoísmo e colocando a fraternidade; respeitar o amor romântico, mas obedecer ao Amor Incondicional. Não quer dizer com isso que seja um objetivo a destruição da família tradicional, mas que seja destruída a hipocrisia em que muitas se sustentam. Se os membros decidem viver num regime fechado de amor exclusivo, que façam isso respeitando todas as conseqüências, e não o forte humilhar o fraco em função dos desejos instintivos, tanto dentro como fora dos limites familiares.
Experimento agora como é bom, salutar, revigorante e maravilhoso conversar com Deus, saber que Ele me ouve, sonda meu coração e dá suas instruções por intuição ou qualquer meio de comunicação.
Sinto-me mergulhado nos Seus mistérios que mesmo sem compreender todos, isso agora não me trás angústia, pois sei que jamais alcançarei a plenitude de Sua sabedoria ou a dimensão de Sua consciência.
Sei que sou uma de Suas infinitas criaturas, que Ele me criou com o germe de Sua inteligência e que gerou o meu livre arbítrio. Sei que agora estou na plenitude de minha consciência, no controle racional do meu livre arbítrio. Reconheço a minha filiação divina e procuro ser obediente as ordens do Pai. Sei que o meu irmão maior, o Mestre Jesus, já explicou que Ele, o Pai, deseja que formemos na Terra o Seu Reino. Deu as primeiras instruções de como alcançar isso e agora eu me considero voluntário dentro dessa missão.
Fiz uma boa faxina no meu coração e agora procuro construir os relacionamentos adequados a esse Reino de justiça e fraternidade, de Amor Incondicional.
Deus enviou duas companheiras para mim que se propõem a construir esse modelo e mostrar, em comparação, a benignidade de uma família ampliada, dentro da confiança, do amor inclusivo, da falência do egoísmo, da morte do ciúme.
Sei que estamos dando os primeiros passos nesse sentido, mas eu, como motivador da idéia, não tenho referências teóricas, de experiências de outras pessoas para me instruir nesse caminho. O único referencial que possuo é a lição do Amor Incondicional ensinado por Jesus, das duas principais leis que ele destacou e do livro da Natureza que é a lei de Deus exposta ao meu redor.
Sinto-me as vezes assustado, apesar de maravilhado, com a dimensão do que tenho à frente. Vejo tantos caminhos abertos, sei pela intuição quais são os aprovados pelo Senhor, e sei que tenho influência de minhas tendências instintivas, geralmente inconscientes. Isso pode provocar erros. E se eu prejudicar o próximo ao invés de auxiliá-lo? Esta é uma dúvida que não sai de minha cabeça, e serve para orientar os passos que devo dar. A consciência me acusa, pois em determinada ocasião, por excesso de zelo nesse campo, eu deixei de ajudar a quem devia e que estava sob meus cuidados. A própria consciência diz que os passos devem ser bem pensados para não trazer prejuízos a terceiros, e consequentemente, atrasos ou inviabilidade da missão.
Poderia ficar sozinho sem nenhum relacionamento afetivo, sinto que tenho condições de viver assim, mas a missão que o Pai me determinou implica em relacionamentos os mais amplos possíveis, os mais profundos possíveis.
Tem momentos como este no qual vejo toda a dimensão da vida a se descortinar à minha frente e não posso deixar de fazer a pergunta: que faço, Deus, agora?
Sei que tenho meu livre arbítrio, mas que posso errar até mesmo sem ter a consciência desse erro; errar por ação ou por omissão. Tenho que ter ajuda de Deus, minha sabedoria ainda não é suficiente para resolver essas questões.
Tenho diversas opções de caminhos pela frente. Seguirei àqueles que pelas circunstâncias tem a “assinatura” do Pai. Mas esperarei sinais mais claros da vontade dEle para dar passos mais largos.
QUE FAÇO, DEUS, AGORA?