Sióstio de Lapa
Pensamentos e Sentimentos
Meu Diário
31/01/2019 02h01
TRÓTSKY (20) – RAZÃO E JUSTIÇA, SOCIAL E CONJUGAL

            Série da Netflix, segundo episódio.

            A cena acompanha o caminhar de Trótski pela cidade até a entrada de um atelier onde encontra Natália posando nua para diversos pintores. Observa de longe o cenário daquela bela mulher despida, sendo pintada por vários alunos com seus pincéis. Ela, como se percebesse intuitivamente que estava sendo observada com tanto ardor, vira o rosto para onde se encontra Trótski e faz um ar de riso sem que ele perceba. Depois do seu trabalho, Natália se despede e vai ao encontro de Trótski.

            - N. Oi, Leon. Apreciando lindas paisagens?

            - T. Centenas, até milhares de pessoas verão essas imagens. Sou apenas o primeiro.

            - N. Você não gostou.

            - T. Você não me conhece, Natália. Creio que ninguém deve dizer a uma mulher o que fazer com seu corpo. Esta moral é do passado, eu vivo pelo futuro.

- N. Então, seu futuro é imoral?

- T. Uma mulher deve decidir sozinha a quem entregar o seu corpo. Seu corpo e seu coração. Se ela escolher livremente ser fiel a apenas um homem, será mais sincero que esses morais dúbios. E então, isso é lindo.

- N. Sim, é mesmo. E você tem razão. Sou eu quem decido para quem me entregar.

- T. Você disse que gosta de Freud. Tome.

- N. Palestra do Freud?

- T. Isso.

- N. Em Viena.

- T. Sim. O trem parte em uma hora. É melhor corrermos.

A cena se desloca para a viagem de trem. Trótski e Natália estão juntos na mesma cabine. Ele folheia um jornal em pé, ela está sentada.

- N. Vai ter um congresso?

- T. Isso mesmo. De Viena vou para Bruxelas. Venha comigo.

- N. Para Bruxelas?

- T. Sim.

- N. É chato.

Batem na porta da cabine, os guardas entram e solicitam documentos. O guarda tenta soletrar o nome que consta no passaporte. Trótski ajuda.

- T. Kristo Samokovalov. Nós búlgaros temos nomes longos.

Natália se mostra surpresa. Os guardas saem e ela pergunta.

- N. Trótski! Que diabo foi isso?

- T. É a rotina diária de um democrata social.

Dois aspectos surgem para a compreensão de Natalia de quem é Trótski. Primeiro, sua visão da mulher, como deve ser vista, como deve se comportar. Isso deve ter agradado a Natalia. Também concordo com a opinião dele, mesmo que eu veja uma pontinha de machismo quando ele valoriza a posição da mulher virtuosa ser fiel a apenas um homem. Será que a mulher que ele deixou em sua cidade com uma filha, está liberada para ter um novo envolvimento como ele está tendo? Será que o seu ideal de justiça social também se aplica a justiça conjugal, onde a mulher deve ter o mesmo direito que o homem? Será que sua razão associada a justiça conseguirá vencer o instinto associado ao preconceito?

O segundo aspecto pode ter deixado ela com certa preocupação. O trabalho que ele faz como revolucionário, é um trabalho clandestino e que a qualquer momento pode ser preso ou mesmo eliminado pelas forças do poder constituído. Mas isso não deve constituir impedimento para uma paixão que está se desenvolvendo.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 31/01/2019 às 02h01
 
30/01/2019 02h01
TRÓTSKY (19) – CHOQUE DE IDEIAS

            Série da Netflix, segundo episódio.

            A cena volta para Paris. Lenin está escrevendo em seu apartamento. Um parapeito cheio de pombos. Ele se aproxima oferecendo pedaços de pão. Se aproxima do parapeito e sobe. Vê a altura, tenta se equilibrar. Se aproxima perigosamente e olha para baixo. Coloca um pé para frente, mãos nos bolsos, como se fosse dar um passo no vazio. É o momento que Trótski chega, faz barulho com a porta, e Lenin se recompõe.

            - L. Leon. Eu não esperava você hoje.

            - T. Vladimir Ilyich, vi seus comentários sobre meu discurso para o Congresso. Você está distorcendo os fatos: Plekhanov nunca disse e nunca escreveu aquilo.

            - L. Ele que se dane. Velho burro. Ele nunca disse, mas é o que pensa. Vamos destronar o velhaco.

            - T. Então eu gostaria de ler o seu discurso.

            - L. Por quê?

            - T. Para garantir que você não tem medo de sujar as mãos.

            - L. Quer se abrir? Como quiser. Eu sou o chefe. Você, o instrumento. Eu comando, você obedece. Sem dúvidas, sem questionar, sem choro. Você apenas obedece. Fui claro?

            - T. Sendo assim, pode encontrar outro instrumento. Tenho minha própria cabeça.

            Lenin se aproxima e empurra Trótski que cai sentado perto do parapeito.

            - T. O que é isso...

            Lenin o aperta e empurra em direção ao precipício.

            - L. Sua vida está em minhas mãos. Se eu soltar, você está acabado como homem e como político. Então fará o que eu disser. Ou jamais discursará ou andará em parques. Fora daqui.

            Lenin solta Trótski e volta para a mesa onde estava escrevendo, enquanto o outro tenta se recompor do susto, da ameaça e da agressão.

            - T. Boa tentativa. Você não me assustou. Não mesmo. E percebi que sou eu que assusto você. Eu serei o novo líder. as pessoas seguirão a mim, não a você. Um dia, você virá implorar por uma aliança.

            Trótski sai batendo a porta enquanto Lenin fica pensativo.

            Lenin tenta colocar Trótski numa relação de submissão. Não consegue. Percebe que Trótski tem uma personalidade forte e parte para a ameaça. Os dois grandes líderes da Revolução Russa fazem um novo embate, e desta vez com mais força. Lenin tem ao seu lado todo o processo burocrático e o conhecimento no meio político. Trótski possui a ideologia pura, sem contaminação, a oratória, a sintonia com o povo. Como será o final desse embate? Alguém pode opinar?

 

Publicado por Sióstio de Lapa
em 30/01/2019 às 02h01
 
29/01/2019 02h01
TRÓTSKY (18) – PODER CORROMPE MENTES

            Série da Netflix, segundo episódio.

            A cena se desloca para a Rússia, ano de 1903. Um trem corta a noite. Sentado fingindo dormir, o mesmo assaltante que dirigiu o roubo da diligencia e o fuzilamento de todos os soldados. O oficial entra pedindo a conferência dos documentos. Enquanto o oficial pede ajuda para liberar o documento, o assaltante junto com seus comparsas que estão no mesmo vagão saca de suas armas e matam os oficiais mais próximos. Segue o tiroteio enquanto o assaltante pula do trem em movimento e consegue se safar ileso. Foge atravessando rios e matas.

            A cena volta para o México onde Trótski conversa com Jacson, o jornalista.

            - J. Você exagera o seu papel. Você finge ter criado Stalin.

            - T. Antes de me conhecer, Koba era um plagiador. Um operário da Revolução, como ele mesmo dizia. Mas ele leu meus artigos e compreendeu que o mundo será mudado não pelos intelectuais bem alimentados, mas pelas pessoas como ele, prontas para derramar sangue.

            - J. Então, como não viu o monstro que ele se tornou, com sua intuição?

            - T. Outras pessoas com quem lidei eram muito mais duras. Eu temia que seriam... um perigo real.

            Um aspecto delicado. Trótski é o ideólogo da revolução, do pensamento mais puro, de querer trazer justiça ao povo que ele ver escravizado. Percebe que as pessoas que se aglutinam no seu projeto de revolução não tem os mesmos princípios, alguns almejam o poder pelo poder, e mesmo frágeis de raciocínio, mas se tiverem um argumento, como a força e o medo por exemplo, podem chegar ao cume do poder e distorcer todo o bem que se queria promover.

            Algo parecido aconteceu no Brasil, uma figura frágil de conhecimento, mas bem-dotada de argumentos falaciosos e capacidade de cooptação ou de ser cooptado pela corrupção, chega ao poder no Brasil usando toda essa potência que do ponto de vista ético é indefensável. Mesmo assim, no poder, consegue cooptar para dentro de suas ações criminosas as mentes mais bem preparadas intelectualmente, tanto da academia, quanto do meio eclesiástico, do legislativo e do judiciário

            A lição fica. Quando estamos lidando com o poder, os ideais éticos podem se perder, a não ser que tenham uma boa base de sustentação dentro da espiritualidade, de realização da vontade do Deus de amor, ensinado por Jesus.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 29/01/2019 às 02h01
 
28/01/2019 02h01
TRÓTSKY (17) – QUE FALTA FAZ O PAI

            A cena volta a enquadrar Trótski e Natália que caminham juntos enquanto conversam.

            - N. Meu pai é um bom homem, mas é muito conservador. O que me esperava? Uma cela de ouro, um bom parceiro, uma porção de filhos... então, eu fugi. Para estudar na Europa.

            - T. Os meus também não me entendiam. É ridículo, eu já sou adulto, mas ainda quero que ele tenha orgulho de mim e me entenda.

            - N. Quando desobedecemos a nossos pais, traímos o amor deles?

            - T. Talvez. Eu sei que tenho razão, mas ainda me sinto culpado. Um paradoxo.

            Eles encontram Alexander que vem chegando em sentido contrário, em uma carruagem.

            - A. Pare! Estou interrompendo?

            - T. Nem um pouco.

            - N. Nós fomos à festa. O Leon queria conhecer a vida europeia.

            - A. Tenho uma surpresa para você, Trótski. Um presente.

            Entrega um cartão para Trótski.

            - T. O que é isso?

            - A. Um mandato para o Congresso de Bruxelas. Lenin me disse em particular que quer que você participe do conselho editorial do Iskra.

            - T. Mas eu...

            - A. Foi o que ele disse. Até logo.

            Alexander dá um toque para se retirar, Trótski fica a ler o cartão com um ar de riso, enquanto Natália também se retira.

            Chama a atenção a opinião de duas pessoas adultas, bem definidas, sobre a opinião dos pais e como se sentem em relação a isso. A confissão de Trótski que desobedeceu aos pais, por se comportar como queria, pois sabia que tinha razão, e isso ainda o fazer sentir como culpado, é um interessante paradoxo. Inconscientemente, será que ele se considera tão certo? Digo assim, pois eu, discordei e agi diferente do que meus pais queriam, mas isso nunca me deixou arrependido, culpado, mesmo sendo em questões tão sérias dentro da cultura aceita popularmente. Talvez porque, o que eu defendia e agia com coerência, estava associada a vontade de Deus que considero o Pai acima de todos os pais, assim como Francisco de Assis. Trótski não considerava este Pai.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 28/01/2019 às 02h01
 
27/01/2019 02h01
TRÓTSKY (16) – QUEM DIRIGE A MÍDIA

Série da Netflix segundo episódio

            A cena se desloca para um passeio coberto pela neblina onde conversam Alexander e o senhor Kobert.

            - K. Como estão as cobranças?

            - A. Tudo como planejado, Sr. Kobert. Ele está nos jornais.

            - K. Muito bem.

            - A. Eu organizei reuniões para ele discursar. Ele está ficando popular. Eu investi muito.

            - K. Sem problema. Lembre-se: nós temos pouco tempo. Não se preocupe. Vou lhe enviar mais. O que está pensando em fazer?

            O Sr. Kobert retira do casado um envelope e entrega a Alexander

            - A. Depois de falar no Congresso, ele ganhará poder de verdade.

            - K. Mas não vão deixa-lo falar sem a permissão de Lenin.

            - A. Eu já cuidei disso.

            - K. Muito bem.

            Podemos observar com esse diálogo, a fonte financeira que leva à imprensa a divulgar determinadas notícias e construírem narrativas de acordo com a vontade e interesse de quem a patrocina. Esse comportamento da mídia, sensível ao falseamento da verdade em troca de financiamento, é uma chaga que se encontra fortemente presente nas atividades políticas. Colocarei abaixo um texto de Percival Puggina que coloca com clareza essa mesma situação que ocorre atualmente no Brasil.

A GRANDE IMPRENSA EM CRISE DE CONFIANÇA

            Por : Percival Puggina

          Em 2015 compareci a um almoço dos colunistas de Zero Hora. Era um evento de confraternização com a direção da empresa. Mesmo sendo colunista da edição dominical havia nove anos, não tinha ideia de que fossem tantos os meus colegas naquele ofício de rechear com opiniões pessoais as edições do jornal. Eu fora contratado em substituição ao amigo Olavo de Carvalho imediatamente após seu rompimento com o veículo em 2006.

          Pois bem, ao término do almoço, iniciou-se uma brincadeira. Dois repórteres, de modo aparentemente aleatório, escolhiam colunistas para ouvi-los sobre assuntos variados. Fui um dos convocados e a pergunta me veio assim: "Puggina, Zero Hora é um jornal de esquerda ou de direita?". Todos riram, e eu também, pela oportunidade que a indagação me proporcionava. Respondi: "O jornal, diferentemente do Estadão e da Folha, por exemplo, não tem um alinhamento editorial nítido. No entanto, pelo somatório das opiniões dos colunistas, acaba sendo claramente de esquerda".

          Era o que eu pensava e penso ainda hoje, quando não mais escrevo para ZH, ao ler cada exemplar do jornal. Na ocasião, após os risos e restabelecido o silêncio, continuei: "Essa, aliás, é a opinião do próprio jornal. Leitores me contam que ao telefonar para reclamar do viés esquerdista de ZH, ouvem da pessoa que os atende o esclarecimento – 'É, mas tem o Puggina'"... E completei: "Eu sou o pluralismo de Zero Hora". Seguiram-se muitas gargalhadas entre as quais discerni alguns poucos aplausos.

          Menciono esse curioso episódio porque ele tem muito a ver com algo que já então fazia parte de minhas pautas preferidas: o uso da imprensa profissional, dos grandes órgãos de comunicação, para atender conveniências ideológicas e partidárias. E note-se, para atender menos às respectivas empresas e mais, muito mais, ao paladar político de seus redatores e colunistas permanentes. O resultado é uma perda de poder dos veículos, que veem reduzida sua credibilidade e influência.

          A posição unânime de todos os profissionais da RBS, em rádio, jornal e TV, a favor da manutenção da exposição do Queermuseu foi episódio paradigmático no Rio Grande do Sul. Lembro o modo vigoroso como se opuseram à imensa maioria da opinião pública que, pelas redes sociais, exigiu do Santander Cultural o fechamento da mostra. Como exibiam tais conteúdos sem restrição de faixa etária? Ficou visível, ali, a estupefação. Foi como se, de um modo ou outro, os formadores de opinião exclamassem: "Que é isso? Não nos ouvem mais?". Não.

          Recentemente, dois jornalistas pelos quais tenho admiração – J.R. Guzzo (Veja) e Carlos Alberto Di Franco (Estadão) - comentaram a cegueira da mídia convencional em relação ao que se passava na cabeça dos brasileiros durante o período eleitoral. A grande mídia estivera empenhada numa luta do bem contra o mal. Seus jornalistas sustentavam que Bolsonaro não teria a menor chance. Apoiados nas desacreditadas pesquisas, afirmavam que ele perderia para todos no segundo turno. Insistiam em apresentar Lula como um candidato imbatível, impedido por isso mesmo de concorrer. Calavam sobre sua condição de criminoso sentenciado, que usou o processo eleitoral para uma derradeira fraude. Segundo Guzzo, comunicadores brasileiros "tentaram provar no noticiário que coisas trágicas iriam acontecer no país se Bolsonaro continuasse indo adiante". E eu completo: dir-se-ia, ao lê-los, que ele ameaçava um seguro convívio social e um benemérito círculo de poder.

          "É preciso informar com objetividade. Esclarecer os fatos sem a distorção das preferências e dos filtros ideológicos", escreveu Di Franco em "Imprensa, autocrítica urgente e propositiva". É o que também penso enquanto observo o crescimento vertiginoso da democratização da informação através das redes sociais. Tenho cá minhas dúvidas, muitas dúvidas, sobre se a perversão das fake news, recorrentes nessas novas mídias, é mais nociva do que a ocultação dos fatos, a maliciosa seleção das matérias e do vocabulário, e a distorção das análises, em tantos veículos da mídia tradicional.

          Ou fazem esse autoexame ou serão desbancados pelos alternativos, entre os quais grandes talentos pessoais e sucessos empresariais já se afirmam.

           Percival Puggina (74), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.

            Esse comportamento manipulador da mídia termina por se defrontar com a inteligência de seus alvos. Podemos até sofrer algum tipo de efeito dessa manipulação, mas quando surge a verdade, e ela sempre surge, a coerência que domina a consciência do cidadão de bem, sempre exige uma retomada de posição. Isso foi o que aconteceu comigo, eleitor que fui do ex-presidente Lula na sua primeira eleição, possivelmente atingido pelo falseamento da mídia corrompida pelo vil metal, que considera o seu trabalho de falseamento da verdade um caminho justificado ética e moralmente. Quando o noticiário trouxe à tona, impossível de ocultar, do escândalo do mensalão, de imediato vi a farsa em que eu tinha me metido, e desisti do apoio que dava ao então presidente Lula, aquele que não sabia de nada, que protegia todos os corruptos e corruptores. A partir daí essa linguagem distorcida da mídia não mais me alcançou, como deve ter acontecido com milhares de cidadãos por este país afora.

            Este trabalho está também publicado no blog do escritor imortal da Academia Rio-Grandense de Letras, Percival Puggina.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 27/01/2019 às 02h01
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