Sióstio de Lapa
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19/07/2019 00h18
HABANERA – VINTE ANOS

            Esta exótica versão la Habanera “Vinte anos”, conquistou as redes sociais. Isaac e Nora, de 11 e 8 anos, aprenderam música graças ao seu pai nascido na Coréia do Sul. A interpretação do clássico cubano acumula dezenas de milhões de vistos em seu canal.

            Esta canção é uma oferenda ao amor romântico, ao amor que sofre influência do tempo, das mudanças fisiológicas, das mudanças nas mais diversas circunstâncias. Pois vejamos a letra:

Que te importa que eu te ame?

Se tu não me queres mais?

O amor que tem passado

Não se deve recordar

Fui a ilusão de tua vida

Um dia muito distante

Hoje representa o passado

Não posso me conformar

BIS

Se as coisas que um quer

Se pudesse alcançar

Tu me quiseste o mesmo

Que vinte anos atrás

Com que tristeza olhamos

Um amor que nos deixou

É um pedaço da alma

Que se arranca sem piedade

BIS

É um pedaço da alma

Que se arranca sem piedade

            Este é um ressentimento comum, muito encontrado nos amantes que chegam até os 20 anos. As transformações corporais, as novas experiências que trazem apelo aos prazeres, ao sexo, fazem motivação para a perda da fidelidade, que é um compromisso central nas relações de amor romântico.

            A minha amada, cheia de amor romântico, faz a leitura ipsis litteris do conteúdo da música. Eu, cheio do amor incondicional, faço a seguinte leitura:

Que te importa que eu te ame?

Se tu não me queres mais?

O amor que tem passado

Não se deve recordar

            Primeiro, devemos esclarecer que tipo de amor que é colocado como pergunta e acusação ao mesmo tempo. Vou colocar aqui o “Amor” com maiúscula como o amor incondicional, e o “amor” sem maiúscula o amor romântico, condicional.

            Eu me importo que me Ame, pois nunca deixei de te Amar, nunca deixei de estar contigo... mas fui sempre rechaçado pela minha forma de Amar.

Fui a ilusão de tua vida

Um dia muito distante

Hoje representa o passado

Não posso me conformar

            O Amor é eterno, nunca cai no esquecimento, nunca se deixa de praticar. O Amor nunca é uma ilusão para quem o pratica, talvez seja para quem o recebe... recebe o Amor pensando ser o amor, e as vezes podem estar bem intricados um com o outro. Mas o amor sempre morre, enquanto o Amor é eterno. Quem ama dessa forma, ao olhar o passado não pode se conformar. Mas quem Ama dessa forma, ao olhar o passado tem a saudade revestida de compreensão e que evoca na alma a lembrança dos mesmos prazeres de outrora. Sem queixas, acusações, ressentimentos... apenas curiosidade pelo que teria sido se tivesse sido Amado da mesma forma.

Se as coisas que um quer

Se pudesse alcançar

Tu me quiseste o mesmo

Que vinte anos atrás

            Se nós tivéssemos nos Amado, jamais estaríamos olhando com tristeza o que se passou há 20 anos conosco. Nós teríamos o mesmo objetivo, de se sentir feliz com a felicidade do outro, mesmo que por alguns momentos o seu Amado estivesse Amando, também, ao lado de outra pessoa. Se num momento do passado, o amor forte que nos envolveu, a paixão animal, fazia querermos ficar juntos um do outro, o Amor que tivéssemos com certeza iria compreender que tudo isso iria um dia passar e naturalmente outras oportunidades de Amar iria surgir, contaminadas ou não pelo amor, mas nunca subordinado a ele.

Com que tristeza olhamos

Um amor que nos deixou

É um pedaço da alma

Que se arranca sem piedade

            Se eu estivesse amando dessa forma, romanticamente, com certeza iria sentir tristeza do amor que me deixou, sentiria também ser arrancado um pedaço da minha alma. Mas, a minha forma de Amar sempre está lutando para criar ou ampliar essa capacidade de Amar em todas as pessoas, principalmente as mais próximas. De mostrar que o amor que muitos experimentam e doam, não tem a magnitude do Amor que é paciente, é bondoso; o Amor que não é invejoso, não é arrogante, não se irrita, não guarda ressentimentos pelo mal sofrido, não se alegra com a injustiça, mas regozija-se com a verdade; tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 19/07/2019 às 00h18
 
18/07/2019 12h18
O FANTASMA DA ÓPERA – UM MITO (14) – FINAL

            Continuando a transcrição da palestra sobre a obra de Gaston Leroux, O Fantasma da Ópera, feita pela professora Lucia Helena, voluntária da Nova Acrópole, e que está disponível no Youtube, muito útil para nossas reflexões.

            O filme parece terminar, o teatro se queima com o candelabro que cai, parece acabar tudo. Christine casa com Raoul, escondido. Só que de repente o filme avança no tempo, vai para frente não sei quantos anos.

As cenas mostram Raoul já muito envelhecido, numa cadeira de rodas. Christine já havia morrido. Ele vai a um leilão de alguns objetos do teatro. Todos esses objetos são muito simbólicos. Depois que ele adquire uma peça, vai até o cemitério para deixar o objeto no túmulo da sua querida esposa.

Quando ele chega no túmulo, estava lá a rosa vermelha do Fantasma da Ópera. É como se o Fantasma deixasse um recado claro: eu te perdi nessa, mas eu não vou desistir.

            Raoul olha e percebe que a luta vai continuar eternamente. Eric não desiste enquanto ele não conquistar Christine. Ou seja, não somos nós que estamos captando a nossa essência, ela está nos caçando. A nossa essência, a nossa espiritualidade está correndo atrás de nós e provocando fatos na nossa vida para que a gente perceba, entregando essa rosa vermelha de vitalidade, de mistério que embeleza e busca nos atrair para sua esfera, buscando ser a voz que se expressa através das nossas palavras.

            Então, a cena final mostra isso com uma beleza incrível. “Acabou essa vida, mas eu não vou desistir de tentar na próxima. Vou tentar demonstrar que a minha hora vai chegar”.

Eu peço que vocês assistam tudo isso com bastante atenção, reparando em todos os detalhes da cenografia, os figurinos de cada coisa que se faz.

            Quero dizer, fechando a nossa palestra, que tem uma determinada passagem que Eric canta para Christine, um pedaço daquela bendita musiquinha “Think of me.” Só que ele muda a letra e aqui ele coloca o seu recado final. Ele canta para ela com uma letra diferenciada. Ele diz:

Mensagem final de Eric para Christine

Nos belos versos da canção “Think of me”:

“Lembre-se de mim de vez em quando,

Por favor, prometa-me que irá tentar.

E, quando achar aquilo que tanto deseja,

Venha buscar o seu coração e fique livre.”

            Veja, quando você cansar de brincar com os brinquedos do mundo, venha buscar o seu coração e fique livre. Por enquanto, pelo menos lembre de mim de vez em quando. Não perca o contato, mas um dia abandone as trevas e venha para a luz. Vou estar sempre, sempre te esperando! Imagine que de alguma maneira eu sei que estou falando isso para você. Pense em mim, sempre em mim. E quando cansar de brincar, vem, eu estarei aqui.

            Bom, o que eu queria transmitir para vocês era esse recado. Lembro que temos muitas palestras de vários mitos no canal da Nova Acrópole no Youtube e quanto mais assistimos, lemos, trabalhando com mitos, mais vamos criando uma visão simbólica que nos permite sermos mais profundos e não apenas mais extensos. Não temos quantidade de informações, nós temos qualidade e temos contato interno, temos intuição, temos uma visão maior da vida, temos algo a dar as pessoas. E em última instância o que mais precisamos é um sentido para as próprias vidas. Temos a começar a fazer por nós mesmos.

            Agradeço muito pela e espero que gostem dessa reflexão. Muito obrigada.

            Agradeço também, profundamente, as reflexões da professora Lúcia Helena. Confesso que eu não conseguia fazer essa reflexão e sempre me deixava ficar no papel de vilão que sempre me colocam, quando eu levo uma flor vermelha e tento cantar minha canção na mente de alguma enamorada. Sempre sou visto com desconfiança, apesar de não tentar iludir, de caminhar sobre a verdade. Mas a minha verdade, do Amor Incondicional, inclusivo, universal, sempre mostra uma face feia comparada ao belo rosto do amor romântico, mentiroso quanto a sua eternidade, egoísta quanto a sua expressão.

            Para conviver bem tenho que usar uma máscara na intimidade de quem me conhece, que sabe a minha face feia. Preciso fazer isso para conviver no meio cultural cheio de hipocrisia, preconceitos, ignorância das leis de Deus expressa na natureza.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 18/07/2019 às 12h18
 
17/07/2019 00h15
O FANTASMA DA ÓPERA – UM MITO (13) – PONTO SEM RETORNO

            Continuando a transcrição da palestra sobre a obra de Gaston Leroux, O Fantasma da Ópera, feita pela professora Lucia Helena, voluntária da Nova Acrópole, e que está disponível no Youtube, muito útil para nossas reflexões.

            Tem outra coisa que eu gostaria de chamar a atenção de vocês. Se alguém me perguntasse sobre esse filme específico, que foi feito sobre o musical, sobre o livro, qual a minha melodia predileta?

As melodias são idênticas, no musical e no filme, mas eu realmente tenho uma especial predileção pelo “Ponto sem Retorno”. É um momento onde quase que Raoul já tinha vencido, ele estava noivo de Christine, de repente no meio dessa peça teatral, ou seja, no meio do mundo, dos olhos, Eric faz uma aparição bombástica. Consegue vencer um pouco a verdade dela, ou seja, mata todos aqueles que se opunham e entra no palco do mundo manifestado e diz para ela: não tem volta, não tente voltar, a ponte se queimou, é um ponto sem retorno. Quanto tempo nós vamos esperar para sermos um só? Vem comigo, não olha para trás, vamos observar a ponte queimando.

Mas o problema é que ela tire ainda a experiência daquele outro mundo.

            Se vocês virem aquele livro que eu falei para vocês, do Bhagavad Gita, que mostra a guerra entre os vícios e as virtudes humanas, com a consciência humana no meio, que nesse drama é Arjuna, é como se Christine fosse Arjuna, com a sua vida sendo disputada por dois mundos. Eu poderia dizer que o “Ponto sem Retorno” é como se fosse um Bhagavad Gita. Ela está sendo puxada por ele, o Fantasma, e por outro lado puxada por Raoul e ela acaba hesitando, em voltar atrás. Então, a letra desse Ponto sem Retorno é uma coisa muito bonita. Ele vai dizer o seguinte:

Você me trouxe para aquele momento

Em que as palavras falham.

Para aquele momento em que a linguagem desaparece

Dentro do silêncio, vim até aqui, mal sabendo a razão.

Ultrapassou o ponto sem retorno, não há volta agora.

Nosso drama finalmente agora começou.

Já se foram as dúvidas de certo e errado.

Uma pergunta final.

Quanto tempo devemos esperar antes de sermos um apenas?

Quando o sangue vai começar a correr

E o botão adormecido explodir em flores?

Quando as chamas finalmente nos consumirão?

Ultrapassou o ponto sem retorno, o limiar final

A ponte foi cruzada. Então pare e observe-a queimar.

Agora não podemos mais retornar.

            É como se fosse um golpe de misericórdia que Eric dá. Acabou, agora você veio, não tem volta. Acontece que Raoul não desiste e novamente entra no palco, resgata Christine... então diante desse palco que é o inimigo final, Raoul, só restava a Eric uma coisa: matar Raoul. Matar as fantasias infantis dela, as paixões, as necessidades de status quo... ele tinha que matar Raoul senão ele perderia. E ele realmente tenta. Mas quando na cena final e quase matando Raoul, ele sente o quanto ela necessitava dessa experiência, o quanto ela estava disposta a sacrificar-se por Raoul, ele a entrega e vai embora.

            Qual foi o meu “Ponto sem Retorno”? O ponto em que eu decidi e não pude mais voltar? Que segui em frente sem olhar para trás?

            Acredito que foi quando a minha consciência reconheceu a importância do amor incondicional, que eu não poderia viver subordinado ao amor condicional, preso aos diversos preconceitos que ele produz.

            Foi quando eu resolvi que não poderia viver subjugado pelas regras do casamento, da família nuclear, da exclusividade dos sentimentos, principalmente o amor, com tudo aquilo que ele traz, inclusive o ato sexual.

            Foi quando eu decidi que poderia namorar com as amigas que Deus colocou no meu caminho, desde que fosse de interesse mútuo, sem coerção ou fingimento, e por ação da justiça, a minha esposa deveria ter o mesmo direito.   

            A partir desse momento foi como se o “Fantasma da Ópera” que vive em mim assumisse o controle de minhas ações, que me deu coragem para eu ir em frente, não ficar mais preso aos preconceitos.

            Agora eu vejo essa história com todo o simbolismo e me coloco no lugar de Eric, mas com um certo orgulho. Orgulho de ter obedecido à minha voz interna, que está mais sintonizada com Deus com o Amor Incondicional, e que eu fazendo assim me tornei um Fantasma da Ópera, instrumento da vontade do Criador, obedecendo à Natureza assim como Ele a fez, e tendo cuidado para não prejudicar o próximo, e ensinando a quem tenha boa vontade para também se livrar dessas amarras do falso amor, do amor condicional, do amor romântico. Mas assim como Eric não teve sucesso com Christine, também não tive sucesso, até hoje, com quantos corações eu entrego a minha flor vermelha.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 17/07/2019 às 00h15
 
16/07/2019 00h15
O FANTASMA DA ÓPERA – UM MITO (12) – DOIS EM UM

            Continuando a transcrição da palestra sobre a obra de Gaston Leroux, O Fantasma da Ópera, feita pela professora Lucia Helena, voluntária da Nova Acrópole, e que está disponível no Youtube, muito útil para nossas reflexões.

Já devem ter tido experiências de algumas vezes ouvir dois músicos, dois cantores, que têm uma técnica equivalente. Mas um canta com a alma e o outro é meramente... um, digamos, um exibicionismo técnico, uma performance técnica. Lembro bastante quando eu ouvi um compositor argentino que uma vez interpretou uma música que lembro, Astor Piazolla. Diziam que era um prodígio ao tocar no bandoneon suas obras e que depois de uma apresentação chegaram para ele e disseram: nossa, você tocou maravilhosamente! E ele teria dito: muitas vezes eu toco maravilhosamente, mas poucas vezes eu faço música.

É muito interessante, fazendo a comparação é como se o Fantasma dissesse: muitas vezes eu falo como Christine, mas algumas vezes falo como Eric. Ela usa minha voz para eu vir ao mundo e ela forma tipo um canal, o cano de bambu lá dos paulistas.

Através desse cano há o sopro do espírito que chega ao mundo, ela se torna um canal de manifestação divino no mundo. O divino que vive dentro de mim mesmo. Então, ele fala isso claramente.

Christine & Fantasma

-Seu espírito e minha voz reunidos em um;

O Fantasma da Ópera está aqui,

Dentro da sua mente

            Veja, seu espírito, Eric, que é o meu próprio espírito, grandioso. E a minha voz, Christine, a voz da personalidade, seja o meu aparelho fonador, a minha projeção de voz, a técnica, a ferramenta, o veículo, mas o espírito que está por trás, aí, os dois, não um só.

            Isso é muito bonito. Pensem um pouco a respeito e vejam como isso obviamente está falando pra nós sobre o sentido mítico da obra.

            Continuando ainda nessa música, o Fantasma vai dizer:

Fantasma:

-Em todas suas fantasias, você sempre soube

Do homem e do mistério,

            Ou seja, da superfície e da profundidade. E Christine responde:

Christine:

-Ambos em você.

            Em todas as suas fantasias, você sempre soube que havia o homem e o mistério, e ela responde: ambos em você. Através de você eu reconheço os dois. É um momento de lucidez extrema nos subterrâneos do teatro, caminhando para o casamento, mas ela ainda olhava para trás, ela tinha que virar estátua de sal. E Christine e o Fantasma cantam em dueto:

Christine & Fantasma:

-E neste labirinto onde a noite é cega,

O Fantasma da Ópera está aqui

Dentro da minha (sua) mente.

            Nesse labirinto interior que é o mesmo labirinto que Teseu penetrou e conseguiu matar o Minotauro, usando um machado do fio que trabalhava sobre sua personalidade externa e sobre a sua essência interior. Juntando esses dois num só, ele entra no labirinto da vida e vence todas as provas que o animaliza.

            Eu procuro dar voz ao meu “Fantasma da Ópera”, talvez quem participe atuando como eu seja na maior parte do tempo ele. Mas, talvez ninguém perceba isso, a não ser que se interesse e procure conhecer a minha intimidade. Mas será que irá tolerar, compreender a “feiura”, segundo os padrões da sociedade, que está por trás da máscara?

            Já tenho tido essas experiências, e o máximo que obtenho de positividade é um misto de horror e admiração. Por isso eu sinto que meu destino é viver sozinho, pois quem tem a coragem de conviver com esse meu “Fantasma da Ópera” chega um momento que não suporta a pressão da sociedade e termina por me expulsar do seu convívio. Rogo a Deus que não seja com violência, pois eu não reagirei e continuarei a entender...

Publicado por Sióstio de Lapa
em 16/07/2019 às 00h15
 
15/07/2019 04h18
O FANTASMA DA ÓPERA – UM MITO (11) – DENTRO DA MENTE

            Continuando a transcrição da palestra sobre a obra de Gaston Leroux, O Fantasma da Ópera, feita pela professora Lucia Helena, voluntária da Nova Acrópole, e que está disponível no Youtube, muito útil para nossas reflexões.

            Raoul representa para Christine uma necessidade de aceitação social, um local onde ela se sente segura, respeitada... você vai ser uma vice condessa, ou seja, um elemento passional, adocicado e um medo profundo do novo. Esse monte de elementos que são patrocinados por Raoul, ele não consegue matar. Mas ele não consegue matar porque Christine não deixa, porque ela opta por isso, ela se identifica com isso. É uma das coisas que fazem com que o público fique indeciso, pensando: “bom, esse Eric é um monstro, está matando todo mundo! ”

Quantas coisas nós já tivemos de matar dentro de nós para crescer: terrorismo, insensibilidade... se não tivéssemos matado, estaríamos presos a isso até hoje. Não esqueçam, nós estamos falando de um mito. Não tem muitos seres humanos, tem um só. O que está morrendo são elementos internos que impedem que se vá em direção ao seu destino. E faltava Raoul, mas o Fantasma não conseguiu matar, não era o momento. Christine ainda precisava de Raoul ao longo de sua trajetória. Então, o Fantasma não consegue vencer nesse ponto.

            Uma coisa interessante que nós podemos perceber, que acho importante. É a letra do filme, é muito importante. Quando num determinado momento, Eric rouba Christine e a leva para o subterrâneo, para o seu reino. Ele começa a cantar uma música que vai mostrar para ela onde nasceu a beleza das melodias, o conhecimento que ele tem de música, e ela vendo tudo aquilo, mas olha para trás e hesita, duvida, e tudo isso é refletido na letra da música, onde mostra a hesitação dela de fazer o casamento, a união profunda com o seu ser. Ela teme, ela hesita, olha para trás, como a história da mulher de Jó que virou estátua de sal quando olhou para trás. Ou seja, ela está sem mobilidade, ainda está presa às coisas do passado. Veja a letra dessa música e prestem atenção. Christine começa a cantar para o Fantasma e ela diz:

Reflexo no espelho:

-No sono, ele cantava para mim, nos sonhos ele vinha,

Aquela voz que me chamava,

E falava meu nome.

Eu sonho de novo? Por agora, eu encontro

O Fantasma da Ópera, que está aqui

Dentro da minha mente.

            Ela não fala de um homem que está do lado de fora, ameaçando. Isso é um símbolo, é claro! A mente dela começa a ouvir a voz do seu ser interior. É o momento legítimo de vida interior, um momento de espiritualidade. “Eu ouço ele dentro da minha mente.” É como se ele não existisse como outro personagem, fosse ela mesma, no momento mais elevado da sua consciência. E o Fantasma devolve, vejam só:

Fantasma:

-Cante outra vez comigo nosso estranho dueto;

Meu poder sobre você cresce fortemente.

            Ele sente que a atrai para seu mundo.

E, embora você se volte para olhar para trás,

O Fantasma da Ópera está aqui

Dentro da sua mente.

            Ele está ganhando terreno e atraindo ela para casar com ele, ter a união final, a união do homem com sua alma. E ela continua cantando:

Christine:

-Aqueles que viram seu rosto

Recuaram com medo.

Eu sou a máscara que você usa.

Fantasma:

-É a mim que eles ouvem.

            Vejam que lindo, gente, ela cantava maravilhosamente bem, era a sua máscara do seu ser interior que falava através dela. Ela se torna uma voz fiel ao seu ser interior, por isso a beleza daquilo que ela fazia fora do comum.

            Nós temos, realmente, dentro de nossa intimidade, no subterrâneo do inconsciente, as vozes que vislumbram a realidade de nosso espírito, mas muitas vezes não tem sequer a consciência, não possui ainda a mínima oportunidade de seguir esse “Fantasma da Ópera”.

            O mundo real, material, oferece muitos obstáculos à beleza interior do nosso mundo, e muitas vezes deixa se contaminar por nossos próprios instintos, contaminando toda beleza do nosso potencial espiritual.

            Seguir a voz do “Fantasma da Ópera”, significa deixar de lado o poder da cultura (Raoul), das condições sociais, do status quo, da segurança. Quem tem a coragem de tomar essa decisão? De não olhar para trás?

            Eu sei que me tornei um “Fantasma da Ópera” para muitas mulheres que se aproximaram do meu “canto” e tentaram conviver comigo. Podem até ter se encantado com tudo que fluía de mim, mas com certeza apavorada pela ameaça do novo, pelo confronto com a cultura, com a falta de segurança. Terminei sendo abandonado, algumas vezes com bastante violência... não tive a sorte do Fantasma da Ópera, que foi abandonado, mas com muito carinho, pela mulher que ama.

            Mas, diferente dele, não fui agressivo nem vingativo. Mesmo sendo agredido fisicamente, reconheci os motivos da revolta e me distanciei triste e cabisbaixo, sem necessidade de quebrar espelhos.

Publicado por Sióstio de Lapa
em 15/07/2019 às 04h18
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