Eu vivo dentro de paradoxos. Defendo a família universal onde todos saibam aplicar o Amor Incondicional dentro dos relacionamentos, que o Amor seja capaz de incluir tantos quantos simpatizarem uns com os outros em todas as dimensões e profundidades, sem ficar detido por nenhum obstáculo. Pois eu vivo na mente e no coração dentro desta família, minha família universal, sem sofrer qualquer tipo de pressão do egoísmo por qualquer uma das suas formas, quer seja ciúme, vaidade, orgulho, intolerância. Mas todos que se aproximam de mim até o momento, principalmente aquelas que se dispõem a serem minhas companheiras, mostram com intensidade a força do egoísmo que ainda preenche os seus corações. Não conseguem viver dentro da harmonia, da solidariedade, da tolerância... percebo além disso a luta surda ou declarada de umas contra as outras... Não conseguem fazer parte da família universal!
Dessa forma eu me sinto só, moro só e no meu coração eu sou solitário. Por mais que eu seja harmônico e saiba distribuir amor, na fala ou no silêncio, ninguém consegue a sintonia com o meu coração. Estou dentro da família universal, mas sozinho. Posso amar ao mundo, mas não recebo a mesma forma de amor, sempre o amor que chega até mim está contaminado pelo germe dos condicionamentos, de amar em função de algo, na perspectiva de receber algo, mesmo que seja exclusividade...
Sei que nada disso que minhas companheiras fazem é por maldade pura. Ninguém quer o mal de forma objetiva para ninguém, disso tenho certeza. Até mesmo a ojeriza que uma tem pelas outras, até mesmo a minha expulsão da casa onde morei com algumas, nada disso foi feito por maldade, mas sim pelas ações do egoísmo, do ciúme, da raiva, da intolerância. É esse egoísmo, as vezes transformado em amor romântico, que pode se transformar em ódio, que prevalece em nas ações de quem o pratica. O Reino de Deus assim fica distante.
O meu Amor Incondicional, que deixo sempre acima do amor romântico, não sofre esses efeitos. Não deixei de amar nenhuma de minhas companheiras, legais ou clandestinas conforme a lei, mesmo que tenha sofrido por causa delas a pior das punições. Mesmo distante delas, o amor desperta algumas vezes a memória e a saudade enche meu coração que chega a transbordar pelos meus olhos.
É este um dos meus paradoxos, vivo mentalmente dentro do mundo da família universal onde prevalece o Amor Incondicional, e, na realidade, vivo dentro do mundo onde prevalecem as famílias nucleares, onde predomina o amor condicional.
No meu mundo eu posso amar a toda a natureza, e especialmente ao próximo; no mundo ao meu redor eu só posso receber amor de alguém se for exclusivo desse alguém. Por isso eu olho ao redor e não vejo ninguém sintonizado com o meu amor. É uma via de mão única. Estou só dentro da família universal, a família que devia abranger o máximo de pessoas possíveis e só tem um. Sou a família de um só.
Também sei que isso está bem próximo da loucura, da esquizofrenia, doença mental que é caracterizada pela criação de um mundo paralelo pelo doente, um mundo de fantasia onde ele passa a viver como se fosse o seu mundo real. O que me salva é que o meu mundo paralelo, o mundo do Amor Incondicional, da Família Universal, eu sei que está ainda distante da realidade e que estou vivendo dentro de um mundo diferente daquele que eu sonho e imagino que um dia será realizado.
Mas se um dia eu pensar que ele está realizado para mim e viver exclusivamente dentro dele? Que acontecerá comigo?
A cultura mostra uma obra literária que fala de duas personalidades que se expressam numa mesma pessoa, o livro “O médico e o monstro”, que deu inspiração pra diversas obras no cinema e na literatura.
Todo esse fascínio é porque essa condição parece existir dentro de nós, uma personalidade que poderíamos classificar como boa e outra que tem aspectos mais egoístas, mais voltadas para o mal.
Fui fazer um atendimento médico particular na residência de um paciente que se encontrava acamado, obeso, doente mental. Notei que a casa era de muita pobreza, mesmo assim a família fez um esforço para pagar essa visita a fim de ser produzido um laudo que a justiça exigia. O Estado devia oferecer esse serviço aos cidadãos, afinal todos pagamos impostos para termos esses serviços essenciais à nossa disposição. Mas isso não acontece. A pessoa peregrina por todos os postos de saúde da cidade, do estado e não consegue ser atendido. A solução é ir em busca de um profissional como eu que se disponha a atender, em casa ou em consultório, pagando os honorários correspondentes.
Foi nesse momento do recebimento do valor acordado, que veio à minha mente essa reflexão, do esforço que a família estava fazendo para obter esse serviço. Senti que a crítica partia de outro aspecto da minha personalidade que se contrapunha a ação do médico. Parecia que um Francisco, espiritualista, dizia que esse era um ato errado, e criticava o Dr. Rodrigues, médico.
Sai daquela casa com essa reflexão: quem estaria certo, o Francisco espiritualista ou o Dr. Rodrigues.
Então continuei refletindo... ora, quem foi até aquela casa foi o Dr. Rodrigues, que pegou o seu carro e se deslocou de um extremo ao outro da cidade. Para fazer isso o Dr. Rodrigues gastou anos de estudo em Universidades, economizou dinheiro, comprou um carro, dois, e frequenta congressos e compra DVDs para se atualizar em sua área. Tudo isso só funciona se tiver o dinheiro, inclusive para viver com dignidade e colaborar com a família, com amigos, e com qualquer que seja o próximo necessitado. É esse Dr. Rodrigues que faz funcionar a máquina materialista em benefícios amplos com quem está ao redor. Sei que o Francisco espiritualista é importante, faz com que eu não fique bitolado apenas nos ganhos materiais e não veja o lado da solidariedade. Eu sei que é o Francisco espiritualista que faz o meu contato com Deus, é quem faz me agir de acordo com a vontade de Deus instalada na minha consciência. É ele que me faz compreender que tudo que possuo pertence ao Pai, e que eu sou apenas um administrador.
Então, quando eu faço um serviço dessa natureza e que recebo meus honorários, não estou explorando a miséria de ninguém, pois é um valor justo dentro do trabalho que vou realizar, e que se esse dinheiro tivesse ficado com a família, provavelmente fosse utilizado em coisas menos nobre do que eu utilizarei. Sem falar dos diversos serviços paralelos que eu forneci sem cobrar, como fazer receitas e dar atestados, que estava fora do nosso trato.
Assim deve essas duas instâncias da minha personalidade, o Francisco espiritualista e o Dr. Rodrigues, funcionarem harmonicamente, pois ambas fazem a vontade de Deus, cada uma atuando em caminhos diferentes, mas paralelos.
Recebi uma crônica no celular, enviada por um amigo, de autoria de Vinícius de Morais, que representa muito próximo daquilo que penso sobre os amigos. É como se o poeta tivesse entrado na minha mente e garimpado pensamentos que eu ainda não havia formulado. Portanto não poderia deixar de reproduzi-la na íntegra:
Tenho amigos que não sabem o quanto são meus amigos. Não percebem o amor que lhes devoto e a absoluta necessidade que tenho deles.
A amizade é um sentimento mais nobre do que o amor, eis que permite que o objeto dela se divida em outros afetos, enquanto o amor tem intrínseco o ciúme, que não admite a rivalidade.
E eu poderia suportar, embora não sem dor, que tivessem morrido todos os meus amores, mas enlouqueceria se morressem todos os meus amigos!
Até mesmo aqueles que não percebem o quanto são meus amigos e o quanto minha vida depende de suas existências...
Alguns deles não procuro, basta-me saber que eles existem. Esta mera condição me encoraja a seguir em frente pela vida. Mas, porque não os procuro com assiduidade, não posso lhes dizer o quanto gosto deles. Eles não iriam acreditar.
Muitos deles estão lendo esta crônica e não sabem que estão incluídos na sagrada relação de meus amigos. Mas é delicioso que eu saiba e sinta que os adoro, embora não declare e não os procure.
E às vezes, quando os procuro, noto que eles não têm noção de como me são necessários, de como são indispensáveis ao meu equilíbrio vital, porque eles fazem parte do mundo que eu tremulamente construí e se tornaram alicerces do meu encanto pela vida.
Se um deles morrer, eu ficarei torto para um lado. Se todos morrerem, eu desabo!
Por isso é que, sem que eles saibam, eu rezo pela vida deles. E me envergonho, porque essa minha prece é, em síntese, dirigida ao meu bem estar. Ela é, talvez, fruto do meu egoísmo.
Por vezes, mergulho em pensamentos sobre alguns deles. Quando viajo e fico diante de lugares maravilhosos, cai-me alguma lágrima por não estarem junto de mim, compartilhando daquele prazer...
Se alguma coisa me consome e me envelhece é que a roda furiosa da vida não me permite ter sempre ao meu lado, morando comigo, falando comigo, vivendo comigo, todos os meus amigos, e, principalmente os que só desconfiam ou talvez nunca vão saber que são meus amigos!
A gente não faz amigos, reconhece-os.
Dentro desse texto só não admito que a amizade seja mais nobre que o Amor; a amizade é simplesmente, mas de grande importância, uma base onde deve se nutrir os diversos relacionamentos, tais como sementes jogadas em terreno fértil. A partir da amizade germinada e desenvolvida, se estabelece o Amor em toda sua plenitude, poder e bem aventurança. Tão forte é o amor, que mesmo naquelas relações onde por qualquer motivo, geralmente egoístas, a amizade é rompida e esfacelada, permanece o amor, nobre e impoluto, velando por aquela pessoa que um dia foi sua amiga.
Tenho exemplos assim registradas e armazenadas na minha memória. Pessoas que no passado desenvolvemos amizade, e consequentemente o Amor. Acontece que essas pessoas desenvolveram um amor contaminado pelo egoísmo, o amor condicional, enquanto para o meu amor fiz questão de mantê-lo livre do joio das impurezas e ele permanece até hoje sem precisar de condições para a sua existência, tão forte que me faz suportar a dor da ingratidão e os espinhos dos ressentimentos dos antigos amigos e dos amores deturpados. Para existir amizade é necessária a reciprocidade; para existir o Amor, basta um dia ele ter sido criado!
Hoje é dia de São Paulo de Tarso. Aquele que depois da experiência espiritual nos portões de Damasco, ficou cego, e só recuperou a vista por intervenção de quem Ele tanto perseguia. Passou a partir daí a fazer uma militância espiritual em nome do Cristo por vários lugares da Terra, a criar igrejas e disseminar a fé cristã.
Imagino que a militância espiritual ainda se faz muito necessária na Terra, da mesma forma como aconteceu no passado, com as devidas tintas da atualidade. Mesmo porque, devido a essa militância do passado temos hoje uma sociedade muito mais avançada nos conhecimentos e práticas do bem. Além disso, muito há ainda a ser feito. A militância espiritual não pode deixar de existir. Os nossos corpos materiais têm que aprender a serem instrumentos de Deus.
Eu me considero um militante espiritual, não do quilate de Paulo, ao qual o próprio Mestre fez sua convocação de forma direta. Mas eu também andava cego e também, por obra do Mestre Jesus, pelo Evangelho que Ele ensinou, eu passei a enxergar com mais clareza.
Agora a minha militância é no sentido de aproveitar quantas pessoas já estão ensinadas no Evangelho e procurar fazer a aplicação prática desse conteúdo dentro da comunidade, na vida cotidiana de seus moradores. Fazer um trabalho com base no Amor Incondicional, sem esperar receber nada em troca do bem que puder proporcionar ao próximo, principalmente aqueles deserdados da sorte, os marginais, os viciados, as prostitutas, as crianças sem pais, sem lar, sem orientação.
O Mestre Jesus já não se encontra fisicamente entre nós, mas como Ele prometeu, jamais nos deixou sozinhos. Onde quer que estejamos, dois ou três em Seu nome, Ele estará presente entre nós. Agora na forma de Espírito de Verdade, como os espíritos nos ensinam. A grande lição que Ele nos deixou, de que “A Verdade nos libertará” tem essa conotação. Os judeus esperavam que o Messias viesse na forma de um forte combatente para livrá-los do jugo romano, à força da espada e da lança, subjugando a todos num mar de sangue. Não reconheceram o doce Jesus como esse Messias que profetizava o Pai como o Amor, que usava a Verdade para reconhecimento do inimigo que mora dentro de nós nas mais diversas formas de egoísmo, que veio para livrar a humanidade do jugo do orgulho e da vaidade, à força do perdão e da tolerância.
Este é o Mestre que aceito como governador do planeta, que dirige as forças do bem contra as forças do mal caracterizadas como ignorância. Sempre que uso a Verdade nos meus relacionamentos, eu sinto que falo pela boca do Mestre, que faço o que Ele ensina e o que Deus deseja.
Vejo ao meu lado uma série ininterrupta de sofrimentos, de pessoas de pouca fé ou sem ela, que se digladiam com as dificuldades como se fosse uma declaração de morte e não de oportunidade de crescimento. Vejo também ao meu lado, a me afligir uma série de necessidades e de pressão, e que corrompem o meu potencial financeiro, daquilo que o Pai me proporcionou para a minha sobrevivência digna e de ajuda ao próximo. Mas isso não me leva ao desespero, pois sinto que tudo pertence ao Pai e que sou apenas um mero administrador dos recursos que Ele coloca ao meu alcance, geralmente pelo trabalho duro que tenho de realizar no dia a dia, sem direito a férias totais, completas, como vejo tantos ao meu redor gozarem, muitos deles com muito menos recursos materiais do que eu.
Esta é a militância espiritual em que estou engajado. Sei do trabalho a ser realizado com o mínimo de descanso, que mesmo em recesso de algumas atividades eu possa ser convocado pelo Pai a qualquer instante e ir a qualquer lugar oferecer um serviço. Sei do trabalho que já iniciei, principalmente na Seara do Senhor estabelecida na Praia do Meio, onde os trabalhadores que Ele enviou para me auxiliar começam a se engajar cada vez mais nos serviços necessários e exige de mim que deixe a preguiça que ainda me atrapalha para evitar o joio tomar conta das tenras plantinhas que querem vicejar.
Devo organizar minha vida material para que não atrapalhe minha militância espiritual, mas sem jamais deixar que os valores do mundo corrompam meus compromissos com Deus. Por mais que eu seja enganado, iludido, traído ou prejudicado, não poderei deixar que as emoções negativas que surgem em função disso, ensombrear a qualidade do Amor que eu tenho para dar.
Na vida tive muitos amores, muitas paixões. Se eu fosse fazer uma avaliação dentre todas as mulheres que tocaram o meu coração, que chegou a me incendiar de paixão, eu poderia classificar em primeiro lugar aquela que aniversaria hoje.
E por que não estou com ela? Por que eu em comportei de forma que ela tivesse motivos para me expulsar da nossa casa, apesar de lá está recheada das coisas que eu amo: livros, filmes, música, meu cachorro, meu filho... ela mesma? Só tenho uma explicação: porque eu sou assim, criado, formado e desenvolvido da forma que ela não desejava para um companheiro, um companheiro exclusivo. A minha forma de amar o mundo e especialmente as mulheres de forma ampla, completa e irrestrita foi o amargo sabor que ela sentiu com a minha convivência e que não foi possível tolerar por mais tempo do que ela tentou.
Hoje estou só, sentindo em mim o amargor do doce tempero do amor, por mais paradoxal que seja. Estou só, e a minha alma carente de companhia reclama desse amargor, mesmo sabendo que foi devido a doce expressão do amor que jamais impedi que saísse de mim. Minhas companheiras também sofrem os efeitos desse paradoxo, experimentam com ternura todo o amor que recebem de mim e com sofrimento todo o amor que eu distribuo com outras.
Sou uma espécie de Rei Midas do amor. Aquele transformava em ouro tudo que tocava, chegou a morrer de inanição, pois os próprios alimentos se transformavam em ouro; eu também transformo em amantes todas que se aproximam de mim e como não aceitam dividir-me com mais ninguém, morro na solidão.
Entro hoje nessas reflexões porque é o aniversário daquela que ocupa o primeiro lugar na minha exacerbação do amor. A última que tentei conviver de todas as formas – esposo, amante, amigo -, como a única tábua de salvação para me livrar da solidão. Não consegui. Mas carrego comigo na forma de saudade o amor que jamais morrerá. E assim fiz essa mensagem abaixo e enviei para ela:
“Feliz aniversário!
Que o Anjo da Guarda proteja seus passos e que Deus encha seu coração de amor e sua vida de felicidade; que cada ano lhe traga mais sabedoria, em cada minuto mais tolerância, mais flexibilidade; que as tempestades da vida sirvam apenas de motivo para a sua aproximação com o Criador; que minhas orações sirvam de escada para a sua elevação e que nas suas lembranças prevaleça o amor que tanto lhe dediquei e que seja capaz de cobrir os pecados que eu cometi. Este é o café da manhã que minha alma oferece tua, e se um dia a paixão que tínhamos se perdeu no tempo, que o amor que ficou na forma de saudade sustente nossas existências, por mais distantes que nossos corpos estejam.”
Ela respondeu com um a imagem de um simples polegar voltado para cima, que interpretei como positivo.
Logo depois envia uma poesia de Cecília Meireles:
FUTURO
É preciso que exista, enfim, uma hora clara
Depois que os corpos se resignam sobre as pedras
Como máscaras metidas no chão
Por entre as raízes, talvez se veja, de olhos fechados,
Como nunca se pode ver, em pleno mundo
Cegos que andamos de iluminação
Perguntareis: “Mas era aquilo, o teu silêncio?”
Perguntareis: “Mas era assim teu coração?”
Ah, seremos apenas imagens inúteis, deitadas no barro
Do mesmo modo solitárias, silenciosas,
Com a cabeça encostada à sua própria recordação.
Cecília Meireles, em Mar Absoluto.
Senti, minha querida, minha amada... pelos versos da poetiza a dor da sua solidão, do silêncio na presença e na recordação.
Espero que nossos olhos voltados agora para nossas raízes possam realmente se iluminar com a verdade e reconhecer que apesar da tristeza o amor jamais esteve ausente. Quando não podias caminhar, o rastro que vias sozinho na areia, era eu te carregando nos braços...