O dia estava favorável. Nublado com pingos de chuva. Decidi fazer a corrida mais ampla possível, da Praia do Meio até o Morro do Careca em Ponta Negra. É um percurso longo, cerca de 15 quilômetros, vai além das duas horas de exercício que costumo fazer nessa fase da quaresma.
Comecei a corrida da mesma forma que faço quando estou em casa, correndo no mesmo lugar e alternando com a Marcha Militar e com o Polichinelo. Faço 75 passos contatos com o pé direito no chão, e intercalo com 30 movimentos da Marcha Militar ou o Polichinelo, de forma equilibrada entre os dois. Conto dez sequencias de 75 passos da corrida com os 30 movimentos da Marcha Militar ou do Polichinelo, com os dedos da mão. Quando termina, coloco um indicador sobre a mesa, de que fiz a sequência completa, e recomeço tudo mais uma vez, até colocar 6 indicadores sobre a mesa. Dessa forma, contabilizo 150 passos da corrida com pé direito e esquerdo multiplicado por 10, os dedos da mão, que totaliza 1.500 passos. Esse número é adicionado com 5 sequencias de Marcha Militar e 5 sequencias de Polichinelo, sendo 30 cada uma, soma 150 de cada. Esta sequência completa é multiplicada por 6, os indicadores que coloco sobre a mesa. Tenho assim o valor total de 6 x 1.500 passos da corrida = 9.000; 6 x 150 Marcha Militar = 900; e 6 x 150 Polichinelo = 900. Juntando tudo, tenho 10.800 movimentos do exercício completo que dura cerca de 1h30m.
Importante dizer que os indicadores do número da sequência total dos exercícios realizados e colocados sobre a mesa, procuro dar um significado espiritual, usando as cores à minha disposição. Assim, o primeiro objeto que coloco tem a cor avermelhada que representa o corpo físico, obrigado que está sendo pelo espírito para iniciar o exercício; o segundo objeto tem uma cor alaranjada, como se o corpo começasse a se aliar aos interesses do espírito; o terceiro tem a cor azul que é o predomínio do espirito sobre o corpo, fazendo a vontade do Pai, que é cuidar do corpo adequadamente; o quarto objeto tem uma cor leve, esverdeada, que representa a vigilância do Pai sobre o exercício realizado; e finalmente, as duas últimas sequencias, tem a tonalidade da quarta com um pouco mais de avivamento, como se o Pai tivesse enviando os seus eflúvios para ajudar nas dificuldades que o espírito tem com o cansaço do corpo e sua tendência de ociosidade.
Também deixo à disposição caderno e lápis sobre a mesa para notação de qualquer inspiração que surja durante o exercício, que sempre surge, mais de uma, e que devo refletir e procurar implementar no dia-a-dia.
Após os exercícios aeróbicos, coloco a esteira e faço exercícios abdominais e de apoio, também em número de 30 cada um deles.
Finalmente, os exercícios totais terminam por volta de 2 horas, quando vou ao banho, ver o peso e dou por encerrado os exercícios.
Durante a corrida da praia, claro, não poderei fazer todo esse ritual como posso fazer em casa. Mas faço os exercícios aeróbicos, abdominais e apoio, sempre em direção ao meu objetivo final, atingir o Morro do Careca. Para contabilizar as sequencias da caminhada, procuro colocar algum tipo de pedra encontrada no caminho dentro do bolso do calção. Interessante, não encontrava nada de pedra que pudesse ter esse papel. O jeito foi substituir por seres vivos, como plantas e algas.
Após as seis sequências, parei para fazer os exercícios abdominais e apoio. Aproveitei e fiquei bastante tempo numa espécie de piscina entre as pedras. Como a maré iniciava a fase de enchimento, as ondas se tornavam cada vez mais forte. Entre uma e outra a agua ficava limpa da areia e transparente. Eu podia ver com facilidade diversas pedrinhas, bastante polidas pelo constante fluxo das águas. Escolhi algumas delas interpretando como oferta dada pelo trabalho conjunto das águas, do vento formando ondas e da mãe Terra com a matéria prima.
Nessa altura já tinha se passado as duas horas do exercício regular, da corrida, e eu ainda estava na metade do caminho. Não poderia mais correr, não tinha mais energia para tanto. O jeito foi completar com a caminhada, de forma lenta, fazendo eu chegar na meta final com mais três horas, totalizando cinco horas ao total. A chuva não caiu com intensidade, mas durante todo o percurso eu sentia os seus pingos sobre o meu corpo, como se quisesse atenuar os efeitos dos raios ultravioletas do sol que conseguem ultrapassar as nuvens.
Finalmente, fui até o ponto de táxi e contratei com o motorista me deixar de volta no apartamento, pedindo para ele comprar água de coco, pois estava sem dinheiro, mas que eu pagaria tudo no final do trajeto. Assim aconteceu e me senti totalmente sintonizado com o Pai, fazendo aquilo que Ele esperava que eu fizesse.
Durante o processo evolutivo do espírito, a partir da sua condição de completo ignorante, vamos observar a conquista lenta e gradativa do necessário para atingir a condição pura, perfeita, a condição de anjo.
Na minha corrida e caminhada da Praia do Meio à Praia de Ponta Negra, consegui visualizar e comparar movimentos que podem representar as duas primeiras fases evolutivas, a primeira onde predomina o movimento do cavalo, a força dos instintos, da biologia. Na segunda fase, identifiquei o movimento do caranguejo como a saída do espírito de sua “toca” mental e conduz o movimento do corpo virado para o leste, para o nascer do sol, astro que representa Deus em muitas civilizações, como o poderoso Egito.
O meu corpo forçado a se movimentar virado para o astro-rei, é uma prova da força do espírito sobre a competência da força biológica, instintiva, representada pelo cavalo, que segue sempre em linha reta.
Assim, nessas duas fases, podemos considerar a força do corpo e a força do espírito empatados no movimento que se repete até a chegada ao objetivo. Como poderia ser representada a terceira fase, onde o espírito já tem o predomínio total sobre o corpo e pode ser considerado puro, perfeito... um anjo?
Refleti que essa condição que deveria envolver todos os movimentos ocorridos durante a corrida e caminhada, tanto os movimentos de Marcha Militar (cavalo), quanto de Polichinelo (caranguejo), e também os movimentos da corrida em si.
Dentro dessa abrangência, com o espírito em completo controle sobre o corpo, posso imaginar que as limitações corporais do cansaço e limites físicos, podem ser superados. Então, a corrida se tornaria menos penosa, o avanço mais rápido. Claro, essa condição eu não alcancei e talvez jamais alcance nesta atual encarnação, neste planeta. Mas fica a promessa de que isso um dia pode ser alcançado, como algumas pessoas que por bilocação podem estar em dois lugares distintos.
Para atingir essa condição, sei que muitas lutas irão ser travadas entre o meu corpo e o meu espírito. Deverei administrar os prazeres do corpo para que não ocorra exageros, para que não seja provocada doenças ou quaisquer outros problemas que atrasem o desenvolvimento do espírito. E não é só isso, o espírito está consciente que deve exigir do corpo uma cota de sacrifício, tanto para controlar seus impulsos e melhorar a capacidade funcional do corpo, quanto na ajuda aos semelhantes, que implica a sair da zona do conforto.
Esta luta na qual o espírito mostra a prevalência nos dias da Quaresma, devem ser ampliados para outros momentos e até se tornar o hábito. A forma de lutar com tanto afinco só nesse período e logo que passa os 40 dias volto a ter a mesma complacência com os prazeres do corpo, devo ter cuidado, e manter o controle das rédeas sobre esses desejos carnais, por bem mais tempo. Só assim, a terceira fase do homem anjo pode surgir e permanecer.
Colocando a sequência do meu exercício de corrida na areia da praia, da Praia do Meio até a Praia de Ponta Negra, onde na primeira fase dei o título de Homem-Cavalo, pois nos movimentos alternativos de Marcha Militar, os pés são forçados para trás como num coice de cavalo.
O próximo movimento que alterno com a Marcha Militar, é um movimento de Polichinelo, onde faço 30 Polichinelos, pulando no mesmo lugar com as pernas abertas e os braços para cima.
Quando faço esse movimento em casa, sempre é feito no mesmo lugar, como todos os outros. Mas fazendo dentro de uma corrida como esta, para um lugar distante, verifiquei que seria melhor fazer e se deslocando para o lugar de destino. Mas como seria difícil o deslocamento para frente, na execução do Polichinelo, resolvi ficar de lado e assim fazer o movimento de avanço para o meu destino. Percebi que os rastros deixados na areia eram bem interessantes, os pés se deslocando para o lado, como o movimento do caranguejo.
Comparei com o movimento anterior que parecia com o movimento do cavalo, um ser mais poderoso e exposto na natureza, comparado com o frágil caranguejo que vive de forma introspectiva, dentro dos mangues, escondido em suas locas. Seria essa a comparação, o meu espírito identificado com a introspecção, com a vida sem expressão, comparada com o viril cavalo.
Acontece que o espírito tem por responsabilidade dominar as forças instintivas do corpo, por mais forte que sejam. Quando o movimento do cavalo é realizado, representa as forças instintivas que estão sendo manifestadas, enquanto no movimento do caranguejo são as forças do espírito que sai da toca e se deixa representar pelos movimentos do corpo. É um sinal do despertar do espírito e que tem por função a domesticação das forças instintivas do corpo biológico.
Durante o exercício da corrida, os dois movimentos são alternados, como se não houvesse nenhuma evolução a partir daí. É como se houvesse acontecido um equilíbrio, onde o corpo e o espírito estivessem numa situação de empate. Mas, a trilha evolutiva aponta para o predomínio do espírito sobre o corpo e isso pode ser representado também na corrida.
Mas esse será o tema do próximo texto, que deve encontrar a possibilidade de representar a condição evolutiva do espirito.
Viemos da Natureza, do barro da Terra, da forma que a Bíblia coloca de forma simbólica. Associado ao tempo, desenvolvi o meu atual corpo ao longo das eras, junto com todos os seres vivos, principalmente com os mamíferos com os quais tenho uma origem muito próxima.
Com o meu potencial, enquanto humano, de racionalidade mais desenvolvida, capaz de entender a existência de um Criador universal, um Pai para todas as coisas, materiais e imateriais, vim a entender que estou dentro de duas evoluções. Uma ocorre no campo material, biológico, representado pelo meu corpo, que ao longo dos milênios foi se aperfeiçoando e diversificando frente aos outros seres vivos, até chegar no estágio atual.
O outro nível de evolução é o espiritual, que se desenvolve naqueles que possuem uma racionalidade desenvolvida capaz de uma auto percepção e imaginação que ultrapassa os limites da materialidade. Que percebe a existência de uma instância imaterial, de maior importância, associada ao corpo e que tem necessidade de uma evolução de outra natureza, associada aos aspectos morais.
Esta é uma observação interessante que pode fazer um redirecionamento de nossos interesses e motivações, deixar de priorizar os aspectos materiais e considerar melhor os interesses espirituais. Mas como estamos fortemente ligados à matéria, somos instintivamente impulsionados para os interesses biológicos, de preservação e manutenção da vida física, mesmo que isso traga prejuízos à saúde do corpo, numa ação meio paradoxal. É como se o corpo focasse mais em seus prazeres, sem refletir sobre os prejuízos que isso pode causar, se for além do necessário.
Isso acontece com a alimentação. O ato da alimentação nos traz prazer, pois é uma atividade muito necessária à nossa sobrevivência. Isso geralmente leva ao exagero da alimentação para adquirir esse prazer. A pessoa deve manter o controle alimentar para não entrar em obesidade, que é problema de saúde.
Encontro-me neste estágio, onde vejo a necessidade de controlar esses impulsos instintivos, e o período da Quaresma serve de bom estímulo para manter um controle rígido sobre o corpo. Aproveito e, além do controle alimentar, com um jejum firme, também pratico exercícios físicos regularmente e intensamente.
Foi assim que decidi ir da Praia do Meio até o Morro do Careca, em Ponta Negra, cerca de 15 quilômetros. Correndo no início, andando da metade do percurso adiante. Durante a corrida, alternava com movimentos, como a marcha militar, forçando os pés para trás como se fosse o coice de um cavalo.
Daí veio a ideia de batizar esse período, onde meu corpo de comporta como um cavalo, de homem-cavalo, para dar uma sequência espiritual de acordo com os próximos movimentos que abordarei em seguida, com o título de homem-caranguejo e homem-anjo.
No livro Ave Luz, do espírito Shaolin através do médium João Nunes, o discípulo Tiago Menor é quem faz a pergunta sobre a Serenidade.
Tiago, também conhecido como Santiago Menor ou São Tiago Menor (para distingui-lo de Santiago Maior). Alguns estudiosos e especialistas consideram que ele (Tiago, o menor) e Tiago, o Justo são a mesma pessoa.
Homem de pequena estatura, ministrara ensinamentos nas sinagogas, inspirado nos escritos de Moisés, o chefe espiritual dos judeus. Queria e deveria ser mais tarde um dos sacerdotes.
No seu coração, o raciocínio o levava ao tribunal da consciência, acusando-o de traição à religião que o vira nascer. No entanto, os sentimentos avançavam no meio do tumulto, dizendo que Jesus era o Cristo que havia de vir.
Por isso ele perdia a Serenidade e procurava uma oportunidade para interpelar o Mestre. Jesus, com seus discípulos ao redor, passa seus brilhantes olhos por todo o grupo, parando de mansinho, nos inquietos olhos de Tiago, como se tivesse dizendo: “fala, meu filho, fala! O que queres que eu ouça? ”
E o antigo pregador das sinagogas descontrai seu coração, entendendo que chegara a vez de expor ao mestre suas dúvidas acerca da brandura. Levanta-se com deferência, a fala um pouco trêmula
- Senhor, podes nos dizer alguma coisa sobre a Serenidade? O que devo fazer para que a serenidade faça parte de mim como meus olhos, meus pés, minhas mãos, minha cabeça, enfim, como todo o meu corpo?
- Tiago, a Serenidade de que queres ser portador é tesouro dos anjos que a receberam das mãos do tempo, pelos impulsos de milênios incontáveis, sob as bênçãos de Deus.
- Entretanto, esse tempo somente age quando abrimos nossos corações pela boa vontade, onde o esforço próprio nunca falta.
- Os milênios são como o calor divino que somente amadurece e harmoniza o universo interior quando nos dispomos a respeitar e a viver o princípio das leis que nos governam a todos.
- E as bênçãos de Deus são a execução da melodia celestial que se irradia pela vivência da Serenidade imperturbável.
- Tiago, a mansuetude imperturbável, no seio dos homens, parece-nos muito difícil, pela largueza de ignorância que ainda alimentam sob todos os aspectos da vida, mas não é impossível de ser adquirida.
- No perpassar dos anos e séculos, sem que a interrupção do bem se faça, ela passa a fazer parte do teu corpo físico e espiritual
- A lei te impõe uma condição: que cada dia coloques no teu alforje um grãozinho de areia de auto aprimoramento, de autoeducação, de amor sem descanso, de fé revestida de obras, para que, no amanhã da eternidade, possas sentir o nascimento, dentro e fora de ti, da serenidade imperturbável.
- É importante que não te esqueças de que, desde quando deres os primeiros passos com sinceridade e confiança, começarás a viver e a sentir a felicidade oriunda dos primeiros raios do equilíbrio espiritual.
- A bondade de Deus é tão grande que mandou a mensagem de salvação ao vivo, para que possas sentir a sua paternidade e acreditar no amor que se estenderá de uns aos outros.
Jesus, parece meditar, e, tranquilo e confiante, prossegue sem cansaço
- Tiago, uma árvore para se manter de pé no solo que lhe dá a vida, estica suas raízes em todas as direções da terra, e os seus galhos obedecem ao mesmo esquema, no ar, para que, no centro, se avolume seu corpo, o tronco, com segurança.
- Pois assim é a Serenidade de que falas e da qual estamos dialogando. Não pode ser fruto somente de dentro de cada alma, como não deve ser um resumo apenas de fora.
- O que te garante a brandura inalterável nos cofres do teu ser é o amor de Deus, que parte de dentro de nós em busca da sua manifestação para fora e que vem de fora para que se manifeste dentro das criaturas.
- Enquanto somos tomados pela insegurança, somos qual árvore mirrada que não pode demonstrar seus frutos, como valores por gratidão ao agricultor que a adubou durante o seu crescimento.
- Se desejas que cresça a árvore da Serenidade em ti, começa cultivando-a sem cansaço, aduba os ideais elevados e trabalha pela paz, tua e dos outros.
- Sê benevolente com o próximo e não esqueças a caridade, onde passar. Serve sem interrogação e ama indistintamente.
A voz de Jesus serenou em ritmo de sinfonia. Os outros discípulos, empolgados de esperança, desenvolviam igualmente os seus ideais para a pregação do Evangelho. E como por encanto, não viram mais naquela noite o Cristo. Ninguém comentou o fato, por já ser costume o Senhor se tornar invisível. Uma multidão tornava difícil a saída com naturalidade, da casa de Pedro.