Sióstio de Lapa
Pensamentos e Sentimentos
Meu Diário
18/09/2013 00h01
PERDÃO

            O objetivo do perdão é a reconciliação. Embora nem todos os relacionamentos rompidos possam ser consertados, pois parentes, amigos ou terceiros agredidos devem ser protegido de seus abusadores, o perdão deve visar a reconciliação entre transgressor e vítima.

            A reconciliação exige o arrependimento do transgressor, que peça o perdão e, se possível restitua as perdas. A vítima deve liberar o transgressor da necessidade de pagar por seu pecado. Ela escolhe arcar com o prejuízo e, ao invés de planejar vingança, se compromete a amar e procurar o melhor para essa pessoa.

            Esse é o padrão conceitual do perdão e a forma de sua realização. Esse padrão implica numa transgressão de normas de relacionamentos e as perdas subsequentes, gerando a situação de transgressor e vítima, de perdas e danos.

            Quando eu analiso a minha forma de relacionamento afetivo, que tem padrões muito diferentes dos padrões culturais, vejo que posso causar muito sofrimento a quem se aproxima de mim. Posso causar danos emocionais e perdas de tempo daquela que ficou comigo esperando realizar os seus sonhos. Até mesmo ausência de cuidados presenciais em filhos gerados. Sinto a culpa jogada sobre mim das diversas companheiras com as quais me relacionei e continuo a me relacionar. Agora acontece um dado interessante: para todas que me relacionei (com exceção da minha primeira esposa com a qual não pensava assim no início de nosso relacionamento) sempre falei da minha forma de pensar, sentir e me relacionar. Jamais prometi para nenhuma delas um padrão de amor exclusivo, baseado no romantismo, que é o que elas mais desejam. Quem decide aprofundar o relacionamento até o nível da intimidade sexual, sabe que esse aprofundamento não é uma promessa de mudança na minha forma de pensar, pois se assim fosse colocado de forma explícita, o sexo não se realizaria da minha parte. Se a minha companheira tem um desejo constante e uma esperança secreta de que eu venha mudar o comportamento é uma questão somente dela e que não chegou a compartilhar comigo.

            A minha base comportamental e que faço questão de deixar bem explícita, é que pratico o Amor Incondicional alicerçado no amor inclusivo. Não deixo ninguém ficar excluída dos meus afetos, por qualquer tipo de preconceito ou moral pré-estabelecida. Entendo que foi Deus que me deu essa missão na consciência e nenhum outro fator material ou espiritual poderá me desviar dela. Então, quando acontece da pessoa se sentir decepcionada por eu estar cumprindo o que sempre disse que faria, eu fico enquadrado numa transgressão? Não seria o contrário? A pessoa sabe como funciono e mesmo assim se aprofunda numa relação comigo, não é ela a transgressora quando reage negativamente por eu fazer justamente aquilo que ela sabia que eu poderia fazer? Nesse caso sou eu quem estaria sofrendo danos emocionais com o sofrimento gerado e perda de tempo, pois poderia estar com outra pessoa mais coerente com os combinados. Nesse caso eu é quem seria a vítima e quem estaria na condição de perdoar.

            Mas as coisas se invertem. Sou considerado o vilão da história pela companheira e por todos que não conhecem os fundamentos da nossa relação. Sou eu que numa atitude de humildade chego a pedir perdão para viabilizar uma reconciliação e uma volta a harmonia do relacionamento, mesmo que não haja mais a possibilidade de uma convivência. Mas acredito que o perdão exija essas discrepâncias na tolerância e a humildade nos permita tomar a cruz que deveria ser de outros.

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em 18/09/2013 às 00h01
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17/09/2013 00h01
CONTER A IRA

            O Baghavad Gita orienta que devemos conter a ira. Mesmo que recebamos alguma provocação, a pessoa deve ser tolerante, porque tão logo fique irada, ela perderá toda a compostura. A ira é um produto do modo da paixão e da luxúria, então o transcendentalista deve refrear-se da ira. É claro que chamar um ladrão de ladrão não é achar defeito, mas chamar uma pessoa honesta de ladrão é muito ofensivo para alguém que está progredindo na vida espiritual. Deve-se ser modesto e não executar nenhum ato abominável. Deve-se ter determinação e não ficar agitado ou frustrado em nenhum empreendimento. Pode ser que alguma tentativa falhe, mas não se deve ficar triste por isso; deve-se progredir com paciência e determinação.

            Sei que no contexto das virtudes que desejo implementar na minha vida, e se consigo ser eficaz nesse projeto, a ira não terá condições de se expressar. Mas acontece que em diversas ocasiões, quando me sinto frustrado ou atingido por algo, a ira continua assomando a minha consciência e dominando meu comportamento, me deixa agitado, com pensamentos acelerados que não se expressam adequadamente por meio das palavras. Sei que na maioria dos eventos frustrantes eu consigo conter a ira, mas quando ela ainda assim consegue se expressar no meu modo de agir, deixa como rastro negativo na minha memória uma sensação de impotência e de culpa, por ter agido de forma não desejada. Não é o fato de minhas reações como resposta a uma ação despropositada, incoerente e prejudicial, ser inadequada. Claro, a reação ou tomada de decisão em função de uma ação negativa perpetrada por terceiros não está sendo criticada. É a forma como ela foi tomada, com toda carga negativa que a ira conduz. Eu poderia ter tomado a mesma decisão com serenidade e até com compreensão pela ação dos outros e pela qual que me tornei vítima.

            É fácil de verificar a importância disso quando observamos a ira que as pessoas ao nosso redor desenvolvem. Numa atitude de empatia, me coloco no lugar dessa pessoa e vejo com mais clareza a importância de ter agido com assertividade, mas sem ira. Até justifico a falta de controle dessa pessoa e de como agiu dominada pela ira, mas não deixo de colocar o forte atenuante de que eu mesmo no lugar dela talvez agisse de forma parecida. Então isso termina servindo de lição tanto para mim como para ela, pois costumo dividir com a pessoa as considerações que tirei a partir do fato ocorrido.

            Na escola da vida onde Jesus é o meu principal Mestre, aprendi também que a ira é um dos sete pecados capitais e que devo aprender a contê-lo como exercício sempre frequente no aprendizado do Amor. Então, lembro-me do conceito de Amor explicado por Paulo na Bíblia e vejo que ainda tenho muita “estrada” a caminhar para ser devidamente habilitado na capacidade de Amar e a ira é um obstáculo considerável.

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16/09/2013 00h01
JULGAMENTO

            A Bíblia mostra o julgamento de Jesus como um fato inigualável. Um homem considerado o filho mais puro de Deus, o Criador do Universo, estava ali sendo julgado pelas criaturas imperfeitas que o seu Pai criou. Um homem pecador julgou e sentenciou o filho mais puro de Deus, que estava ali como se fosse um criminoso, embora tenha sido a única pessoa que viveu sem pecar. A Bíblia registra que, “sendo acusado pelo príncipe dos sacerdotes e pelos anciãos, nada respondeu.” Será que não tinha o direito de se justificar? Teria sido uma coisa muito fácil desmentir as acusações. O que aconteceria com seus acusadores, se Ele tivesse aberto a boca em Seu divino poder e perfeição? Quantas vezes silenciou seus adversários no passado com Suas palavras irrefutáveis e Sua sabedoria divina!

Agora era Ele quem estava calado. Ele era de fato o Único que quando o injuriavam, não injuriava; e quando padecia, não ameaçava, mas entregava-se sim, a Deus, Aquele que julga justamente.

            Posso imaginar-me no lugar dEle. Logo muitas das acusações poderiam ser verdadeiras, e não falsas em sua totalidade como foi no caso de Jesus.

            As vozes acusatórias poderiam ser dirigidas para mim da seguinte forma: “Você é preguiçoso, deixou o tempo passar e não cuidou de praticar a vontade do Pai como assim Ele o determinou. Você se deixa levar pelos prazeres do corpo, principalmente na alimentação, deixa o seu corpo com sobrepeso, a um passo da obesidade, um campo favorável para a implementação de doenças e de redução do tempo de vida para cuidar da seara do Pai. Você não consegue aplicar a caridade em sua pureza, em dividir com os necessitados o tanto de amor que o Pai lhe dedica, nem mesmo a afabilidade, algo tão simples você não consegue cumprir à contento. Você esquece das coisas mais simples que o Pai te encarrega, como de difundir a Sua palavra, fica envolvido apenas em brincadeiras mundanas sem prestar atenção no compromisso divino. Você não consegue agir com total justiça, solidariedade e transparência nos relacionamentos afetivos, com medo de magoar o próximo você termina por magoar o Pai. Você não consegue expor com clareza o seu pensamento nas palavras faladas e escritas com eficiência e eficaz através de livros específicos, fica sempre a amontoar conhecimentos que urgem ser colocados acima da mesa, para que a luz que lhe atingiu possa agora beneficiar tantos que esperam por isso. E esse rosário de acusações poderia se estender por muito mais linhas...

            Sei que se eu ficasse calado como Jesus, não seria por avaliar a falsidade dos que O condenavam e a pobreza de espírito deles. Ficaria calado por aceitar a veracidade de tudo que estava sendo acusado, mesmo que por pecadores talvez do meu próprio quilate. Cuidaria para receber a pena que me coubesse, nesse caso Pilatos não teria necessidade de lavar as mãos.

            Com esta reflexão sobre o julgamento que um dia terei de deparar com ele, devo cuidar para corrigir tantas imperfeições das quais sou acusado, devo providenciar com mais firmeza a reforma íntima em cada dia de minha vida.

            Sei que um dia esse julgamento irá acontecer, e mesmo em qualquer dia, um dia como hoje... Tenho que estar preparado, aliviado de tantas imperfeições.

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em 16/09/2013 às 00h01
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15/09/2013 00h01
AFABILIDADE

            Li uma história que não sei bem citar aonde. Falava de uma pessoa que tinha um amigo e se desenvolveram, cada um por seu lado. Certa vez o amigo que teve um bom desenvolvimento... Ah! Lembrei agora, vou atrás do livro e transcrever a história, fica mais fidedigno o que quero considerar.

            Encontrei no livro PONTOS E CONTOS, psicografia de Chico Xavier pelo espírito Irmão X no capítulo 40, “Olá, meu irmão!”. Dizia assim literalmente:

            A disposição amiga – acentuava Cipriano Neto – é o verdadeiro tônico espiritual. Não raro, envenenamos o coração, à força de insistir na máscara sombria. Má catadura é moléstia perigosa, porquanto as enfermidades não se circunscrevem ao corpo físico. Quantos negócios de muletas, quantas atividades nobres interrompidas, em virtude do mau humor dos responsáveis? Claro que ninguém se deixe absorver pelos malandros de esquina, mas o respeito e a afabilidade para com as criaturas honestas, seja onde for, constituem alguma coisa de sagrado, que não esqueceremos sem ferir a nós mesmos.

            À frente da pequena assembleia, toda ouvidos, Cipriano, com a graça de sua privilegiada inteligência, continuou após leve pausa:

            - Na terra o preconceito fala muito alto, abafando vozes sublimes da realidade superior. Nesse capítulo, tenho a minha experiência pessoal bastante significativa.

            Meu amigo calou-se, por alguns momentos, vagueou o olhar muito lúcido, através do horizonte longínquo, como a vascular o passado e prosseguiu:

            - É quase inacreditável, mas o meu fracasso em Espiritismo não teve outra causa. Não ignoram vocês que meu coração de pai, dilacerado pela morte do filho querido, fora convocado à Doutrina dos Espíritos, ansioso de esclarecimento e consolação. Banhado de conforto sublime, senti que minhas lágrimas de desespero se transformaram em orvalho de agradecimento à bondade de Deus. Meu filho não morrera. Mais vivo que nunca, endereçava-me carinhosas palavras de amor. Identificara-se de mil modos. Não havia lugar à dúvida. Inclinei-me, então, à Doutrina renovadora. Saciado pela água viva de santas consolações, não sabia como agradecer à fonte. Foi aí que recordei as minhas possibilidades intelectuais. Não seria justo servir ao Espiritismo, através da palavra ou da pena? Poderia escrever para os jornais ou falar em público. Profundamente reconhecido à nova fé, atendi a primeira sugestão de um amigo e dispus-me a fazer uma conferência. Anunciou-se o feito e, no dia aprazado, compacta assistência esperou-me a confissão. Seduzido pela beleza do Espiritismo evangélico, discorri longamente sobre a caridade. Aplausos, abraços, sorrisos e felicitações. No círculo de meus companheiros de literatura, porém, o assunto fizera-se obrigatório. Voltando à avenida, no dia imediato ao acontecimento, meu esforço foi árduo para convencer os confrades das Letras de que não me achava louco. Infelizmente, porém, minha decisão não se filiava senão à vaidade. Pronunciara a conferência como se o Espiritismo necessitasse de mim. Admitia, no fundo, que minha presença honrara, sobremaneira, o auditório, e que a Codificação Kardequiana em mim encontrara prestigioso protetor. Desse modo, alardeava suma importância em minhas palestras novas. Citava a Antiguidade clássica, recorria aos grandes filósofos, mencionava cientistas modernos. Quando nos encontrávamos, meus colegas e eu, no ápice das discussões preciosas, eis que surge o Elpídio, velho conhecido meu e antigo tintureiro em Jacarepaguá. Sapatos rotos, calça remendada, cabelos despenteados, rosto suarento, abeirou-se de mim e estendeu-me a destra, exclamando alegre:

            “Olá, meu irmão! Meus parabéns!... Fiquei muito satisfeito com a sua conferência!

            “Entreolharam-se os meus amigos, admirados.

            “E confesso que respondi a saudação efusiva, secamente, meneando levemente a cabeça e sentindo-me deveras humilhado.

            “Em vista do meu silêncio, o tintureiro despediu-se, mostrando enorme desapontamento.

            “É de sua família?’ – indagou um companheiro mais irônico.

            “Estes senhores espiritistas são os campeões da ingenuidade!’ – exclamou outro circunstante.

            “Enraiveci-me. Não era desaforo semelhante homem do povo chamar-me de “irmão”, ali, em plena avenida, diante dos colegas de tertúlias acadêmicas? Estaria, então, obrigado a relacionar-me com toda espécie de vagabundos? Não seria aquilo irmanar-me a rebotalhos de gente, na via pública?

            “O incidente criou em mim vasto complexo de inferioridade.

                “Cegavam-me, ainda, velhos preconceitos sociais e a ironia dos companheiros calou-me fundo, no espírito. A ausência de afabilidade e a incompreensão grosseira dominaram-me por completo. O fermento da negação trabalhou-me o íntimo, levedando a massa de minhas disposições mentais. Resultado? Voltei a aspereza antiga e, se cuidava de Doutrina, confinava-me a reduzido círculo doméstico. Não estimava a companhia ou a intimidade daqueles que considerava inferiores. Os anos, todavia, correm metodicamente, alheios à nossa vaidade e ignorância, e impuseram-me a restituição do organismo cansado ao seio acolhedor da terra. Sabem vocês, por experiência própria, o que nos acontece a essa altura da existência humana. Gritos estentóricos de familiares, pavor de afeiçoados, ataúde a recender aromas de flores das convenções sociais. Em meio da perturbação geral, senti que sono brando se apoderava de mim. Nunca pude saber quantos dias gastei no repouso compulsório. Despertando, porém, debalde clamei por meu filho bem-amado. Sabia perfeitamente que abandonara a esfera carnal e ansiava por reencontrar-lhe o carinho. Deixei a residência antiga, ferido de amargosas preocupações. Atravessei ruas e praças, de alma opressa. Atingi a avenida, onde me dava ao luxo de palestrar sobre Ciência e Literatura. E ali mesmo, junto ao aristocrático Café, divisei alguém que não me era estranho às relações individuais. Não tive dificuldade no reconhecimento. Era o Elpídio, integralmente transformado, evidenciando nobre posição espiritual, trocando ideias com outras entidades da vida superior. Não mais os sapatos velhos, nem o rosto suarento, mas singular aprumo, aliado a expressão simpática e bela, cheia de bondade e compreensão.

            “Aproximei-me envergonhado. Quis dizer qualquer coisa que me revelasse a angústia, mas, obedecendo a impulso que eu jamais soube explicar, apenas pude repetir as antigas palavras dele:

            “Olá, meu irmão! Meus parabéns!’

            “Longe, todavia, de imitar-me o gesto grosseiro e tolo de outro tempo, o generoso tintureiro de Jacarepaguá abriu-me os braços, contente, e exclamou com sincera alegria:

            “Ó meu amigo, que satisfação! Venha daí, vou conduzi-lo ao seu filho!

            “Aquela bondade espontânea, aquele fraternal esquecimento de minha falta eram por demais eloquentes e não pude evitar as lágrimas copiosas!...”

            Nossa pequena assembleia de desencarnados achava-se igualmente comovida. Cipriano calou-se, enxugou os olhos úmidos e terminou:

            - A experiência parece demasiadamente humilde; entretanto, para mim, representou lição das mais expressivas. Através dela fiquei sabendo que a afabilidade é mais que um dever social, é alguma coisa de Deus que não subtrairemos ao próximo, sem prejudicar a nós mesmos.

            Parece que a espiritualidade superior sonda os nossos corações e observa que tem a intenção de melhorar a cada dia. Então apresenta lições através de vários canais que impressionam a nossa sensibilidade e estimulam a nossa razão no sentido de praticar aquilo que é ensinado. Há muito eu tinha parado a leitura desse livro exatamente nesse capítulo. Por algum tipo de intuição eu o encontrei e terminei de ler o capítulo que havia começado. Achei correta a lição da afabilidade e achei que não tinha dificuldade nessa área. Mas fui colocado à prova.

            À noite quando voltava para casa, parei na sorveteria para comprar um depósito com 4 bolas, como muitas vezes faço. Estava debruçado sobre o balcão escolhendo os sabores, quando percebo atrás de mim uma voz tímida. Volto o olhar e percebo um velho conhecido meu que tentara parar de usar drogas, mas sofreu uma recaída e não mais se recuperou. Vive pelas ruas e agora estava ali na minha frente: magro, barbudo, sujo... estendeu a destra para mim e me cumprimentou com palavras que não consegui guardar. Respondi ao gesto e apertei a sua mão, mas com a mesma frieza que Cipriano relatou com relação ao tintureiro de Jacarepaguá. Dei a entender que ele estava perturbando a escolha dos meus sorvetes. O empregado da sorveteria fez sinais com rispidez para ele se retirar, que não perturbasse os fregueses. Ele olhava para mim como se quisesse um amparo. Procurei, felizmente, ser solidário e não me associar ao gesto de exclusão. Olhei com afeto para ele como forma de mostrar ao empregado que ele não estava me perturbando. Mas por dentro de mim se levantavam diversas críticas que me mantinham afastado. “Ele estava ali querendo dinheiro e certamente para usar drogas” pensava assim, se eu ceder e lhe der qualquer coisa, vai ser para o prejuízo dele. Dei as costas a ele para terminar de escolher os meus sorvetes. Estava decidido dar qualquer coisa para ele, mesmo que ele desviasse para o uso de drogas, seria agora responsabilidade dele, não minha. Quando recebi o sorvete e voltei para sair e falar com ele, não o encontrei mais. Eu não tinha demorado mais do que um minuto para receber o sorvete e voltar para falar com ele. Não consegui entender como ele desapareceu tão rápido. Se eu não tivesse apertado a sua mão poderia pensar que foi um fantasma.

            Fui para casa meditando no fato e fiz a ligação com essa história relatada pelo Irmão X, por isso fiz questão de reproduzi-la fielmente. Após a leitura eu tinha plena convicção que a afabilidade não era problema para eu estudar para aperfeiçoar minha evolução espiritual. De imediato a espiritualidade que sonda o meu coração, quis verificar se isso que eu achava que tinha tanta certeza, de ser afável com qualquer pessoa, era real. Intuiu para que esse velho conhecido aparecesse na sorveteria com as mesmas características do tintureiro de Jacarepaguá. Não passei no teste, apesar de ter me saído um pouco melhor do que o Cipriano. Eu reconheci de imediato a minha falha, de não ter considerado o próximo que passa dificuldades como irmão. De não ter tido a afabilidade que ele esperava. Sei que naquele momento que subtrai a afabilidade, um dom de Deus que devo dividir com o próximo, eu prejudiquei a mim mesmo!

            Mais um motivo para que eu corrija meu excesso de otimismo em me considerar muito bom na aplicação de diversas virtudes, pois na hora de ser testado eu não me saio à contento!  

Publicado por Sióstio de Lapa
em 15/09/2013 às 00h01
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14/09/2013 00h01
SABEDORIA

            Sabedoria é o meu mais íntimo desejo frente ao Pai, associado a energia e determinação para vencer a preguiça e a gula, principais adversários do meu íntimo.

            Na Bíblia encontrei no Livro da Sabedoria 1: 1-5 o seguinte texto:

            1 Amai a justiça, vós que governais a terra, tende para com o Senhor sentimentos perfeitos, e procurai-o na simplicidade do coração,

            2 porque Ele é encontrado pelos que não o tentam, e se revela aos que não lhe recusam sua confiança;

            3 com efeito, os pensamentos tortuosos se afastam de Deus, e o seu poder, posto à prova, triunfa dos insensatos.

            4 A sabedoria não entrará na alma perversa, nem habitará no corpo sujeito ao pecado;

            5 O Espírito Santo educador (das almas) fugirá da perfídia, afastar-se-á dos pensamentos insensatos, e a iniquidade que sobrevém o repelirá.

            Sei que nós, os humanos, fomos preparados por Deus para governar a terra, no sentido de usar a nossa inteligência privilegiada para levar a vontade de Deus em todos os lugares. Por mais simples que sejamos podemos exercer uma fatia desse governo.

            Sei que é difícil fazer uma auto-avaliação justa dos meus sentimentos quanto à sua perfeição, sempre posso minimizar ou aumentar qualquer aspecto do meu interesse mundano, egóico. Mas sinto que desenvolvo pelo menos a intenção de aperfeiçoar os meus sentimentos para com todos e principalmente para o Senhor, meu Deus, que é representado no todo. Essa orientação de procurá-Lo na simplicidade do coração vai ser muito útil prá mim, pois direcionará a minha consciência no ato de orar, quando muitas vezes não consigo encontrar palavras para falar com “alguém” como o Pai que parece estar localizado no confins do Universo.

            Não procuro tentar Deus de nenhuma forma, procuro sempre ficar submetido à Sua vontade, mesmo que tenha dúvidas muitas vezes de qual seja essa vontade. Mas é uma dúvida que a cada dia vai se dissipando e fico com a convicção do que Deus deseja para mim, para o cumprimento de um trabalho que é de Seu interesse na organização e harmonização de todos os seus filhos. Tenho plena confiança nEle e não recuso Sua confiança, pelo contrário, a ela imploro colocando meu coração à Sua sondagem.

            Meus pensamentos podem ser tortuosos no momento da dúvida, quando imagino que os meus interesses egoístas podem estar se sobrepondo à vontade de Deus. Por isso desejo tanto a sabedoria, para não correr o risco de desviar do meu caminho por ignorância e não por maldade.

            Sinto que a minha alma não é perversa, não procura fazer o mal, as vezes de forma instintiva quer se rebelar e atingir com violência algum mal que foi feito por outros. Procuro domesticar essas emoções para que não contaminem a minha alma e deixar o meu corpo livre do pecado, e assim me habilitar para receber a sabedoria que o Pai considerar necessária para mim.

            Sei que o Espírito Santo está sempre vigilante quanto aos pensamentos que posso alimentar; não posso evitar que chegue a minha mente algum pensamento pérfido, mas posso de imediato o desconsiderar e passar o foco de minha atenção para outra situação, para não ser caracterizado como insensato e não ficar exposto à iniquidade.

            Com essas considerações alicerçadas no Livro Sagrado, eu acredito que esteja no bom caminho.

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em 14/09/2013 às 00h01
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