Sióstio de Lapa
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            No estudo espiritual realizado na Associação Médica, a discussão maior foi sobre o meu comportamento, se estava seguindo os critérios cristãos. Durante a leitura do texto foi encontrado o seguinte: “O espírito para trabalhar por sua depuração, deve reprimir as más tendências, vencer as paixões, vendo as vantagens no futuro; para se identificar com a vida futura, devemos para ela dirigir nossas aspirações e preferi-las à vida terrestre; é preciso não só nela crer, mas compreender; é preciso representa-la sob um aspecto satisfatório para a razão, em completo acordo com a lógica, o bom senso e a ideia que se faz da grandeza, da bondade e da justiça de Deus”.
Com a reflexão sobre o texto, coloquei como exemplo a minha decisão de mudar a minha forma de considerar o exclusivismo afetivo e sexual que caracteriza o casamento. Mostrei que apesar da minha firme decisão ao casar, de manter a fidelidade conjugal, passei a sofrer convites para envolvimento sexual fora do casamento. Era uma colega de trabalho, que durante os meus plantões enquanto acadêmico de medicina, fazia os seus convites para sairmos qualquer dia e realizar uma transa sexual. Ela era uma pessoa sensual, casada tanto quanto eu, e ambos sabíamos que seria uma ação que teria efeitos só para nós, iriamos ter um prazer sexual que não deveria importar a terceiros. Eu resistia, pois estava convicto que isso era um erro, eu estava comprometido com a promessa de fidelidade conjugal, eu deveria me envolver sexualmente apenas com minha esposa. Acontece que os constantes convites despertavam cada vez mais os meus desejos, ativava os meus instintos de reprodução, que eu poderia caracterizar como as “más tendências”. Porém, entrou nas minhas racionalizações os conceitos do Amor Incondicional, as lições do Mestre Jesus, de fazer ao próximo aquilo que desejaríamos para nós. Eu tinha ao lado o meu próximo mais próximo, uma mulher sensual que desejava fazer sexo comigo. Dentro desse contexto não haveria problema de sair com ela, pois eu também desejava que isso acontecesse. O impedimento para que isso acontecesse, era a existência da minha esposa e do marido da minha colega. Acontece, que pelo que ela relatava, o marido costumava ter suas experiências extraconjugais. Eu seria um elemento de trazer justiça para ela. Mas, com a minha esposa era diferente, ela nunca teve outra experiência sexual e seguia com rigidez o compromisso de fidelidade conjugal prometido diante do altar. A minha lógica dizia que eu não podia me permitir sair com minha colega, já que minha esposa cumpria a promessa feita e eu esperava isso dela. Foi essa amarração entre mim e minha esposa que constituía o obstáculo para eu sair com minha colega. Mas o desejo cada vez ficava mais forte e a racionalização apontava que a minha esposa era o obstáculo, pois representava o compromisso que assumimos.
Fiquei me sentindo prisioneiro dentro de uma gaiola que eu mesmo construíra e que a minha esposa era a carcereira dessa condição. Senti que o meu sentimento de adaptação e harmonia conjugal ia se deteriorando cada vez mais. Eu procurava manter as aparências de uma vida tranquila, mas cada vez o esforço era maior. Previa que isso estava deteriorando o meu casamento, e que não bastava eu renegar esse desejo que foi formado. Isso iria ficar na minha memória, outros desejos iriam surgir, outras lutas iriam ser feitas e o meu sonho de viver feliz com minha esposa até o fim da vida, estava ruindo. Não era culpa dela nem minha, eu concluía. Tudo surgiu dentro de uma naturalidade, dentro de uma constituição biológica que o Pai construiu para nós.
Percebi que, para manter o meu casamento com a mesma qualidade afetiva, eu teria que quebrar os meus preconceitos machistas e dar a minha esposa o mesmo direito que eu desejava ter agora, experiências extraconjugais. Se eu desse esse direito a ela, então quebraria a barreira que impedia de sair com minha colega. O desejo tão forte que eu passei a ter por ela fez com que eu quebrasse na minha consciência o impedimento que minha esposa nutria da fidelidade e exclusivismo sexual. Pensando assim, sai com a minha colega algumas vezes, o que me trouxe muito prazer. Não havia culpa nem para mim, nem para ela. Ela estava fazendo justamente o que seu marido fazia; eu estava fazendo o que minha esposa também teria o direito de fazer quando a ocasião chegasse e ela assim desejasse.
Mesmo sem ninguém saber disso, inclusive a minha esposa, o meu casamento deixava de ser fechado, exclusivista, para ser aberto. Voltei a ter a mesma alegria de antes no casamento, mesmo sabendo que um dia teria que dizer a minha esposa da minha transformação.
Nesse ponto fica colocada a questão: sofri o arrastamento das más tendências e pequei contra a lei de Deus? Ou obedeci a Lei do Amor, deixando fluir afetos íntimos com o próximo, abrindo a perspectiva da inclusão de um amor mais especial?
Essa retomada de posição fez uma reviravolta na minha vida, passei a viver em sociedade dentro de uma cultura que defende o amor exclusivo nas relações conjugais, mas que na verdade praticam as relações extraconjugais de forma escondida, se mantem sobre o manto da mentira. A minha forma de viver, apesar de tão destoante da cultura está envolta no manto da verdade. Vivo assim até hoje, mesmo sendo criticado por tantos que dizem que estou equivocado, que não estou fazendo a vontade de Deus como eu imagino estar fazendo. Não tenho como provar com minhas pobres argumentações que eu estou certo, mesmo porque eu posso realmente estar errado, e todos os críticos estarem certos. Mas estou pronto para ser julgado pela justiça divina, que sei que é incorruptível e que estou pronto para reparar o mal que eu sem querer possa ter causado, como é dito no sentido final das críticas.
 
Sióstio de Lapa
Enviado por Sióstio de Lapa em 23/08/2018
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