Como conciliar o relacionamento de um amante incondicional com as pessoas que querem o relacionamento, mas ainda estão presas de forma majoritária aos sentimentos românticos? Os conflitos sempre irão surgir do choque dessas duas formas de amar. Os amantes tentam evitar o conflito omitindo ou mesmo negando, mentindo sobre os pensamentos ou sobre o que faz. Isso é uma forma de empurrar o problema para a frente e que um dia vai explodir com mais prejuízos emocionais.
Também sei que para que haja a harmonização dos amantes é necessário que ambos tenham a honestidade, transparência de tudo que pode acontecer na vida de cada um. E que se querem o relacionamento afetivo, íntimo inclusive, um certo grau de desconforto irá existir até se atingir o nível adequado da harmonização, quando todos já sentem o amor incondicional. Mas que esse desconforto não seja motivo de conflito, pois todos sabem em que situação está vivendo. Sabem de seus pensamentos contrários, do que pensam fazer e até do que realizam que vão de encontro ao que foi acertado. Neste caso é cometido um erro, imaginário ou real, quando o amante pensa ou realiza algo que não foi previamente aceito, é cometido um pecado contra o companheiro. Isso pode ser alimentado, a pessoa diz que aceita a relação verbalmente, mas no íntimo sente e realiza de forma contrária. Enquanto isso não for consertado a relação estará sendo corrompida cada vez mais.
Uma solução para limpar esses pecados do coração é a sua confissão. Deve ser feito um exame de consciência e dizer ao companheiro(o) que pecados cometeu com a maior exatidão possível, com honestidade total, quantas vezes o cometeu, o que pensa a respeito disso. Somente assim a força desse pensamento contrário ao amor incondicional ira diminuir, pois ele se verá a luz do sol, a consciência querendo uma coisa e esse monstro inconsciente que vem à superfície, querendo outra. Agora, se isso não for feito, o monstro mesmo contido pela vontade, ficará dentro da mente criando situações e oportunidades para boicotar o amor incondicional, principalmente na parte do ciúme, exclusivismo e intolerância.
Na fase de ajuste das ações e sentimentos entre os amantes, os pecados não confessados se tornam uma grande barreira para que relacionamento honesto, fraterno e harmônico acontecer, como prever o amor incondicional.
Acredito que no Reino de Deus exista uma condição que todo cidadão deva praticar: a transparência das ações. Isto é uma condição aparentemente fácil para quem deseja seguir com honestidade a Lei do Amor. Mas para quem ainda vive num planeta de expiação como a Terra, onde o mal ainda predomina em nossos corações, isso pode ser extremamente difícil. Estou percebendo isso com mais clareza, nesse período de permanência no deserto. Como tentamos escapulir de conflitos com mentiras! A omissão até que é tolerável, muita coisa que experimentamos ou que fazemos não interessa a terceiros. Mas se alguém chega a nos perguntar algo, é porque já demonstra interesse. Desde que a revelação disso não traga prejuízo para outra pessoa, é nosso dever dizer a verdade, mesmo que isso gere conflitos. Caso o conflito ocorra com a revelação de uma verdade, é porque não há aceitação entre o que as duas pessoas pensam e se elas não estão dispostas a aceitarem uma convergência de opinião, com sinceridade no coração, a convivência harmônica é incompatível.
Pode ser que uma pessoa queira conviver com outra, mesmo sabendo de comportamentos que não aceita, mas isso não é salutar, pois quando o comportamento acontece o conflito surge de automático. Mesmo que essas pessoas se amem, é importante que fiquem afastados, pois a convivência levará a conflitos constantes, perda da qualidade de vida e até transformação do sentimento positivo do amor, em raiva, ressentimento e até ódio!
Este é um dilema sério que acontece comigo que amo de forma incondicional com as minhas companheiras que amam de forma romântica. Eu defendo e atuo com a inclusão de todas; elas defendem e atuam com a exclusão de todas. Totalmente incompatível! Cada uma quer ser única, ter toda a atenção; eu quero dar atenção a todas, sem excluir ninguém, nem do passado, do pressente ou do futuro. Totalmente incompatível! Vejo cada vez com mais clareza, que um amante incondicional como eu jamais poderá viver com harmonia com ninguém, se ele nunca encontrar outra pessoa que pense e que sinta também como ele, com o amor incondicional.
Nessa situação, tenho que morar sozinho, sem ninguém a compartilhar o meu lar, pois até agora não encontrei ninguém que tenha também esse amor incondicional no coração. Nem ao menos contatos ocasionais como namorados poderão ser tolerados, se nesses pequenos momentos ainda surgir os conflitos. O amor romântico deve estar totalmente subordinado ao amor incondicional, pois senão qualquer tipo de contato de natureza romântica será perniciosa.
Voltando a leitura do livreto IMITAÇÃO DE CRISTO, cap. 20, que fala do amor à solidão e ao silêncio, item 3: “Não pode haver alegria segura sem o testemunho de boa consciência. Contudo, a segurança dos santos estava sempre misturada com o temor de Deus; nem eram menos cuidadosos e humildes em si mesmos, porque resplandeciam em grandes virtudes e graças. A segurança dos maus, porém, nasce da soberba e presunção, e acaba por enganar-se a si mesma. Nunca te dês por seguro nesta vida, ainda que pareças bom religioso ou ermitão devoto.”
Este é um bom conselho que eu devo aproveitar. Tenho uma tendência, de só por que tenho boas intenções, já me considerar seguro, num patamar espiritual superior. Agora, não sinto esse temor de Deus com tanto significado como é colocado no texto. Sinto mais um grande respeito e grande veneração, que Ele está sempre perto de mim e pronto para me ajudar e perdoar os meus erros. Acredito que é assim por causa das minhas intenções. Caso eu tivesse más intenções eu poderia temer à justiça de Deus. Mesmo na ocorrência dramática que passei no sábado, devido ao meu exagero na alimentação, na gula, enfrentei as consequências sabendo que era permissão de Deus, mas que eu podia recorrer a Ele para ser perdoado por minha invigilância. Então, a minha segurança está sempre vinculada ao amor de Deus a todas as criaturas, e principalmente aquelas que conscientemente procuram fazer Sua vontade, deixando de lado os próprios interesses.
Este período que estou passando no deserto quaresmal deve ser único. Deve ser uma espécie de vestibular, de ENEM espiritual onde de acordo com meu desempenho vou ser aceito para uma missão apropriada ao que já conquistei com meus esforços até o atual momento. Como todo estudante que faz o ENEM, eu também enfrento o deserto esperando me capacitar para uma missão que considero muito honrosa e que para tanto vou precisar de professores de alta competência espiritual, da estirpe do próprio Jesus, mesmo porque a missão que eu quero é justamente aquela que Ele veio anunciar: realizar o Reino de Deus neste mundo material, nestas relações interpessoais cheias de egoísmo, nas relações íntimas cheias de exclusivismo.
Estou entrando num padrão satisfatório na vida no deserto. Equilibrei minhas obrigações materiais, de trabalho e de relacionamentos profissionais ou sociais sem festa, com o dever espiritual do clima da Quaresma. Hoje fiquei o dia inteiro de jejum, sem comer uma simples balinha. Sinto que satisfiz a expectativa do Pai, sinto que ele até me recompensou em alguns momentos, diferente do sábado quando eu senti o peso de seu castigo, na forma das consequências do que eu fiz. Chego cedo em casa vindo direto do trabalho, sento no tapete da sala e fico rodeado de livros que escolhi para ler nesse período, todos de cunho espiritual, que me orientem, confortem, motivem. É pena que eu tenha que dormir, queria aproveitar a noite toda madrugada a dentro sem tirar nenhum cochilo. Acontece que quando forço para fazer isso, nãoconsigo, a mente apaga e durmo em qualquer lugar, no sofá, no tapete, no puf, na cadeira de trabalhar... raramente me destino dormir na cama, e quando isso acontece é para dormir pouco tempo, deitar de 5 horas e levantar de 6 horas, por exemplo. Sei que o meu ritmo de funcionar está fora dos critérios fisiológicos, principalmente no que diz respeito ao sono e a alimentação. Recebo críticas sobre isso, mas não posso entrar no comportamento regular que todos procura seguir. Tenho consciência imortalidade da alma e que meu estágio aqui na terra é para aprender e ensinar lições que produzem nossa evolução, saber lidar com as exigências e necessidade do corpo é a grande lição. Vivo cercado de estímulos os mais diversos, a grande maioria dirigida aos prazeres dos sentidos corporais, ligados a manutenção do corpo físico e a preservação da espécie.
Esta sensação de satisfação, de harmonia com as exigências espirituais que se confrontam com as necessidades materiais, é como um exercício salutar para o espírito que esse período da Quaresma oferece. Espero que essa sensação de rotina se espalhe para o período fora da Quaresma, quando será incluída de volta todas as relações afetivas com todas suas demandas de intolerância e de exclusividade para com os outros. Espero voltar com toda a sabedoria que este atual momento está me proporcionando, apesar do sofrimento que é o afastamento afetivo das pessoas que amamos. Pelo menos sinto um grande avanço: a comunicação com o Pai e com o Mestre Jesus está mais satisfatória. Já encontro as palavras para falar com ambos com naturalidade, afinal, são Eles que estão afetivamente comigo neste deserto.
Hoje amanheci mais cuidados com as ações que devo realizar. É aquele velho ditado, “Gato escaldado tem medo de água fria”. O que sofri ontem serviu para me chamar a atenção sobre as responsabilidades deste período de Quaresma que resolvi assumir com seriedade. Então não posso agir como se fosse uma brincadeira e desconsiderar toda a responsabilidade espiritual que trouxe para mim. Pela manhã fui fazer perícias e logo em seguida fui para o Flat almoçar com a turma. Depois do almoço eu sugeri uma roda de conversa onde cada um pudesse colocar algo importante da sua vida para discutirmos em clima de fraternidade. Terminei iniciando o assunto por sugestão de todos. Coloquei a leitura do texto publicado no diário de ontem, “Aflição no deserto” e em seguida a leitura da Parábola, “Ceifeiros equivocados”. O primeiro foi motivo de riso para todos, apesar de eu ter enfatizado o meu fracasso em confronto com a gula e ter merecido o castigo. Depois fiz a leitura da parábola e abri para a discussão. O meu primogênito argumentou que via o amor romântico e o amor incondicional como dois sentimentos incompatíveis, como água e óleo. Depois fez a indagação de que seria a conceituação do amor. Considero uma indagação pertinente, pois a partir dessa conceituação podemos avançar no sentido de estudar as diversas variáveis por onde diverge o amor. Agora não entendo a ausência de hierarquia entre as diversas formas de amor, principalmente do amor original, espiritual, incondicional, divino. Ao meu ver, esta forma de amor é a maior força do Universo e responsável pela criação e harmonização de tudo. Infelizmente o nosso intelecto não alcança uma perfeita definição conceituação que abranja todos os detalhes da natureza e seus diversos mecanismos movimentados pelo amor, tanto na sua expressão criativa e evolutiva, quanto na expressão corretiva de ações que o intelecto imaturo e de posse do livre arbítrio possa cometer.
Foi colocado em cheque a possibilidade do Amor Incondicional ser colocado na prática, pois quando surgir o amor romântico este terá mais importância. É este ponto que não entra na minha compreensão, como pode uma força maior, o amor incondicional, ser subjugado por uma força menor, o amor romântico? A não ser que, quem se envolva com o amor romântico assim o permita, atendendo a desejos e necessidades pessoais, de caráter exclusivista.
No meu modo de entender, se quero preservar o amor incondicional no meu comportamento, mesmo que eu seja atingido pela força dessa derivação romântica do amor, não posso deixá-la exibir suas características em meu comportamento de forma majoritária, devo sempre deixá-la submetida aos interesses do amor incondicional, principalmente no aspecto mais contundente que é a inclusão (amor incondicional) em detrimento da exclusão (amor romântico).
Terminado essa discussão sem chegarmos a um consenso, terminei o dia com muito cuidado com o meu comportamento, sem abrir espaço para tropeços como o acontecido no dia anterior, afinal, gato escaldado...