Recebi uma lição explicita da Caridade através de um texto que encontrei. Abordava questões práticas que as vezes eu procurava realizar e não sabia como começar. O texto falava do valor de um sorriso e devido a sua importância vou reproduzir na íntegra, como o encontrei, neste espaço:
“O sorriso não custa nada e rende muito. Enriquece quem o recebe, sem empobrecer quem o dá. Dura somente um instante, mas seus efeitos perduram para sempre. Ninguém é tão rico que dele não precise. Ninguém é tão pobre que não o possa dar a todos. Leva a felicidade a todos e a toda parte. É o símbolo da amizade, da boa vontade. É o alento para os desanimados, repouso para os cansados, raio de sol para os tristes, consolo para os desesperados. Não se compra nem se empresta. Nenhuma moeda do mundo pode pagar seu valor. Não há ninguém que precise tanto de um sorriso como aqueles que não sabem mais sorrir. Aqueles que perderam a esperança. Os que vagueiam sem rumo. Os que não acreditam mais que a felicidade é algo possível.
“É tão fácil sorrir! Tudo fica mais agradável se em nossos lábios há um sorriso. Tudo fica mais fácil se houver nos lábios dos que convivem conosco um sorriso sincero. Alguns de nós pensamos que só devemos sorrir para as pessoas com as quais simpatizamos. São tantas as que cruzam nosso caminho diariamente. Algumas com o cenho carregado por levar no íntimo as amarguras da caminhada áspera. Poderemos colaborar com um sorriso aberto, no mínimo para que essa pessoa se detenha e perceba que alguém lhe sorri, já que o sorriso é um alento.
“Sorrir ao atender os pequeninos que acorrem nos semáforos à procura de moedas. É tão triste ter que mendigar e mais triste ainda é receber palavras e gestos agressivos como resposta. Se é verdade que essa situação nos incomoda, não é menos verdade que não gostaríamos de estar no lugar deles. Eles são tão pequeninos! Se tem a malícia dos adultos é porque os adultos os induzem a isso. Mas no íntimo são inocentes treinados para parecer espertos, em meio às situações mais adversas.
“O sorriso é uma arma poderosa, da qual nos podemos servir em todas as situações. Se, ao levantarmos pela manhã, cumprimentamos os familiares com um largo sorriso, nosso dia certamente será melhor, mais alegre. Se, ao entrarmos no elevador, saudarmos com um sorriso os que seguem conosco, ao invés de fecharmos o rosto e olharmos para cima ou para baixo, na tentativa de desviar os olhares, com certeza o nosso dia será mais feliz. Porque todos nos verão com simpatia e nos endereçarão energias salutares.
“O sorriso é sempre bom para quem sorri e melhor ainda para quem o recebe. O sorriso tem o poder de fazer mais amena a nossa caminhada. Dessa forma, se não temos o hábito de levar a vida sorrindo, comecemos a cultivá-lo, e veremos que sem que mude a situação à nossa volta, nós, intimamente, nos sentiremos mais felizes. O cenho carregado, ou seja, a cara amarrada, como se costuma dizer, traz ao corpo um desgaste maior que o promovido pelo sorriso.”
Esta lição veio na hora certa, um ensinamento precioso. Já sabemos da importância do sorriso, mas de forma vaga, não algo tão objetivo com esta lição. Tenho facilidade de sorrir, mas também facilidade de ficar de “cara amarrada”, principalmente nas situações em que a Caridade chega de diversas formas. Sabendo de forma tão clara esse valor, agora tenho que favorecer a cada momento o sorriso como forma de dar um brilho melhor ao exercício da Caridade.
Estava de passeio em Passa e Fica-RN e enquanto fui na mala do carro estacionado na frente da Pousada onde fiquei hospedado por uma noite, uma pessoa maltrapilha do lado de fora acena para mim, deseja um real. Resisto a minha tendência de acenar negativamente com a mão. Vou em sua direção. Converso amistosamento com ele. Fala que é um agricultor, mas que não conseguiu plantar neste ano devido a seca. Era verdade. Em todo o Estado vários municípios tinham declarado situação de emergência, apenas nos últimos dias é que caíram fortes chuvas, principalmente nas áreas litorâneas. Dei o Real solicitado de forma amistosa e natural. O tratei como um irmão que necessitava. Não penetrou na minha mente pensamentos de que eu estava sendo ludibriado por um vagabundo que vivia dessa forma a pedir sem outro compromisso com a vida. Bem que eu poderia ter aprofundado um pouco mais a conversa e saber um pouco mais da sua realidade. Mas isso poderia também o incomodar. Enfim, foi mais um teste que a Caridade realizou e dessa vez, acredito que me sai bem melhor do que das vezes anteriores. A consciência não apontou grandes críticas. Acredito ser merecedor de pelo menos um oito.
Estava mais uma vez na rodoviária esperando o ônibus para retornar para casa. Na mesma rodoviária onde de outra vez vi uma garota que despertou simpatia e que senti que poderia evoluir para uma possível relação afetiva. Dessa vez era uma senhora idosa, de pés tortos e de hálito alcoólicos. Estava lendo um livro e ela sentou perto de mim. Continuei a ler sem dar muita atenção a uma conversa que ela queria iniciar...
“... Deus é amor. Deus tem tudo para dar a nós. Deus cura os cegos, os paralíticos, tudo em nome de Jesus, não é meu filho?” – e jogava a cabeça sobre meus ombros; sentia mais forte o hálito alcoólico. Ao mesmo tempo eu pensava que devia exercer a caridade com ela, de lhe dar um pouco de atenção, de tolerar a sua embriaguez, afinal ela estava abordando um assunto importante, a espiritualidade, o poder de Deus.
“...minha filha diz, mãe você gosta de crente? Eu disse que gosto de Jesus! Você viu na televisão um crente curando em São Paulo? Ele curou os olhos de uma criança... mas isso é demais! Tinha uma criança aleijada, ele chamou e ela veio... mas isso é demais, não é? Quem pode fazer isso é Jesus!”
Ela viu que eu não interagia com ela, que agora eu estava escrevendo na contra capa do livro as suas palavras para repetir aqui neste blog. Enquanto isso eu ficava a pensar na caridade que eu estava dando a essa pessoa. Ás vezes eu caminhava pelas ruas, pelo campo, via pássaros e ficava a desejar que eles viessem até mim, que pousassem no meu ombro assim como faziam com São Francisco. Mas agora eu tinha ali uma cabeça que pousava vez de quando no meu ombro de um ser vivo muito mais importante para Deus do que um simples pássaro. Era uma pessoa, um ser humano e isso não me trazia nenhum tipo de orgulho. Um pássaro poderia significar para quem visse, o meu alto grau de espiritualidade; aquela cabeça de uma bêbada poderia causar censura, uma tolerância inaceitável aos bons costumes. Via assim uma série de conflitos incompatíveis com a Caridade que eu tanto desejo exercer.
Ela ficou um tempo sem dirigir a palavra para mim. Ficava a murmurar: Deus é bom, Deus é bom, Deus é bom... tudo que temos é a vida para dar a Ele; Ele tem tudo para dar a nós... o que pede nós “ver”... depois voltou-se para mim:
- Eu gosto de conversar com uma pessoa como o senhor. Quanto anos o senhor tem?
- 59
- Eu tenho 67 anos, sou de 1945... eu não minto não!
Solta uma gargalhada. Olha com mais atenção para mim. Pergunta o que estou fazendo, o que estou escrevendo, se é a palavra de Jesus. Digo que pode ser. Ela olha com cuidado os escritos. Sei que mesmo ela sendo alfabetizada, não vai conseguir ler minha letra garranchosa. Diz que é bonitinho.
Vejo que chega o ônibus. Pego minha bolsa apressado e me despeço com palavras secas: - Chegou meu ônibus. Tenho que ir. Tchau.
Fiquei a avaliar o meu grau de caridade para com aquela senhora. Fiquei mais preocupado em escrever do que conversar com ela. Permiti que ela se apoiasse no meu ombro sem a repudiar, foi um avanço. Sem essa determinação em ser caridoso, eu teria saído do banco e deixado a bêbada chata entregue a própria sorte. Tive um desempenho um pouco melhor do que no último teste. Mereço um três.
Os cruzamentos de carros por onde dirijo todos os dias são meus testes diários, ver se eu tenho a persistência de dar a caridade “capenga” que já alcancei, mesmo que venha na minha consciência toda a possibilidade que exista daquela pessoa estar sendo instrumentalizada de forma direta ou indireta para o mal. Dela estar colhendo dinheiro para logo mais ir em, busca de drogas, que tenha uma outra pessoa por tras operando para recolher para si o dinheiro como uma forma de praticar uma escravidão moderna. Deixo tudo isso em segundo plano e coloco em primeiro plano que a ação de doar o que o outro espera é a minha “obrigação” naquele momento e com uma intenção de melhorar esse ato a cada momento. Aliar ao ato de doar o benefício material, dar também algo afetivo... uma simples palavra, um olhar de compaixão?
Foi então aí que surgir a lição da caridade. Uma garota negra se aproximava. Senti que podia fazer algo além da moeda. Ela se aproximou, de forma rápida mecânica, nem mesmo procurou minha aprovação, foi logo jogando água e limpando o para-brisa que nem tão sujo se encontrava. Ao terminar parou ao meu lado na janela do carro, não deu nenhuma demonstração de consideração. Para ela eu era apenas uma peça daquela máquina caça-niquel onde a pessoa coloca uma moeda e aciona uma alavanca para ver se recebe alguma coisa. Ela fez o seu trabalho e agora estava parada na expectativa de como a máquina iria responder, dando ou não sua moeda. Dei a moeda como ela esperava e como eu estava programado. Foi tudo muito mecânico. Da minha parte havia o interesse da troca afetiva; da parte dela a indiferença com a resposta do mundo. Podia também está drogada, pensando em mil coisas, preocupada com outras mil... não sei. Sei apenas que agi como uma máquina que deu o que ela esperava, que tentei fugir dessa situação e responder como humano, mas respondi apenas como peça de uma máquina, o liberador de moedas. A Caridade fez um teste comigo e não me saí bem. Nota 1. O que me salvou do zero foi apenas a intenção de ir mais além.
Hoje senti toda a magnificência do Amor Incondicional frente ao feérico amor romântico. Encontrei com minha amiga por quem no passado nutri enorme paixão. A paixão passou, nenhum resquício persiste em mim. O amor permanece, esplendoroso, magnífico, irradiante! Fui até a sua humilde casa no interior do Estado acompanhado dos meus parentes. Senti que ela se encontrava em dificuldade, devido um telefonema pedindo um encontro profissional comigo. Fui até lá como profissional, como amigo, como “amante”. Amante do Amor Incondicional! A abracei com ternura e senti nela o temor da humildade. Perguntei por seu marido, companheiro, ela disse que não se encontrava em casa, não soube explicar onde ele estava. Senti que a presença de tantas pessoas a deixava encabulada com o assunto. Desviei para a questão de sua saúde, que foi o motivo da sua ligação para mim. Explicou o que estava acontecendo, dos remédios que estava tomando. A orientei como devia e fiquei a disposição para em Natal aprofundar a ajuda que estava iniciando ali. Ela agradeceu, disse que havia pedido a irmã dela para fazer almoço para mim e talvez duas ou três pessoas que pudessem estar me acompanhando, não imaginava que nós éramos treze pessoas distribuídos em três carros. Eu disse que não era preciso fazer isso, que nós tínhamos ido apenas para lhe visitar; a maioria das pessoas ela já conhecia, todos a cumprimentaram e quanto mais próximos afetivamente de mim, mais sentimentos de compaixão e solidariedade desenvolveram para com ela. Senti que ela foi acolhida por todos nós, ela e sua filhinha que eu ainda não tinha conhecido, fruto da convivência com seu atual companheiro. Nos despedimos e deixamos aberta a possibilidade de cooperação em todas as áreas que pudéssemos ser úteis. Ela nos acolheu com sua humildade. Nós a acolhemos com nosso amor, solidariedade, compaixão. O amor erótico com todo o seu cortejo de ciúmes e possessividade não teve nenhuma necessidade de expressão. Os afetos se desenvolviam em plano mais alto, mais sublime, mais divino!
No caminho de volta lembrava desse meu encontro tão significante, uma prova viva de que O AMOR JAMAIS ESQUECE, que fica registrado pelo fogo divino em nossos corações como esse mesmo fogo registrou na pedra as Leis de Deus entregues a Moisés. Após o almoço, quando todos nos reunimos durante uma hora para falar sobre o Cristo, uma leitura intuitiva que nos foi indicada, e quando foi falado da beleza desse encontro que todos tivemos, senti as lágrimas caírem de par em par sem poder as controlar, como se as palavras tocassem com harmonia as cordas sensíveis do meu coração onde Deus deixou registrado o Seu amor e que todos nós naquele dia a tínhamos feito vibrar. A minha cabeça baixa tentava ocultar a vergonha das lágrimas que caiam, mas a minha alma senti que estava ao lado de Jesus, altiva como aluno orgulhoso de seu desempenho acadêmico e simplesmente dizia: Mestre, aqui está minha lição!