Espero que neste mês de junho eu consolide em minhas ações a prática da caridade. Para isso estou forçando a barra e dando as pratinhas para qualquer pessoa que estenda a mão, pois percebi que o meu lado crítico terminava por eliminar todos aqueles que me pediam. Sei que na forma que procedo não é o ideal, mas é o primeiro passo para corrigir minha frieza defensiva, de ver em todo necessitado uma ponta de maldade, direta ou indireta. Mesmo sendo ainda inadequada essa forma de agir, quando eu comparo esta forma de agir com a anterior, percebo que esta tem superioridade. Após o ato de dar, que eu tenho passado da decisão à oferta e estou analisando o procedimento, fico sempre mais satisfeito do que antes que eu negava por qualquer pretexto. Posso dizer que agora reatei amizade com a caridade, ainda estranho pela condição forçada que eu imprimo ao ato de caridade, mas é a minha vontade que está prevalecendo ao monte de condicionamentos defensivos que acumulei ao longo de tempo. Deixarei esse comportamento se manifestar ao longo deste mês com esta característica e tentarei encontrar os argumentos necessários para iniciar a produção de textos essencialmente didáticos, na aplicação da Lei do Amor em toda sua profundidade e extensão a todos os aspectos da vida, como forma irrefutável de construir a família universal, onde todos sejam considerados como irmãos, qualquer que seja o pais ou etnia, rico ou pobre, espiritualizado ou não, ou qualquer outra dimensão que tende a afastar o homem do próximo.
Tive oportunidade hoje de adquirir toda a coleção do Jornal de Estudos Psicológicos do ano de 1858 a 1869, publicados por Allan Kardec, na França, mas com repercussão em todo o mundo. Foi o primeiro veículo a abordar com seriedade científica a comunicação entre os dois mundos dimensionais da existência, o físico e o espiritual. A partir daí foi feita toda uma codificação dessa realidade tendo realce as lições do Mestre Jesus, que pode ser considerado o precursor no passado e o mentor na atualidade dessas informações. Hoje podemos considerar com mais propriedade, mais próximo da verdade, toda a sistemática evolutiva que existe em ambos os planos, e que nós, humanos, somos artífices centrais de todo o processo.
Hoje tenho plena consciência de tudo isso e tenho uma boa compreensão de onde estou colocado nessa escala evolutiva. Sei que preciso evoluir muito para adquirir uma boa condição de perfeição, terei passar por várias encarnações, pois sei que somente esta em que estou envolvido não será suficiente. Já estou no último terço da vida e vejo que permaneço com pecados primários a enodoar o meu espírito. A preguiça, o orgulho, a vaidade, o medo, todos são elementos que ainda possuem muita força dentro de mim e que não consigo eliminar com um simples ato de vontade. Vejo como exemplo a prática da caridade, algo tão simples, mas que tenho toda uma resistência interna em deixá-la fluir com firmeza e naturalidade. No campo pragmático das relações humanas, tenho com muita clareza qual a principal missão que tenho nesta atual encarnação, tenho os atributos acadêmicos e espirituais básicos para implementar com vigor os parâmetros do Reino de Deus na nossa cultura humana e não consigo extrapolar essa prioridade além de um pequeno círculo de pessoas que se relacionam com mais intensidade e até intimidade comigo.
Acredito que a leitura sistemática dessa valiosa coleção que acabo de adquirir, irá me trazer subsídios extras para reforçar minha vontade e motivação, capacitar minhas ações com sabedoria e coerência, para que essa nova prática de relacionamentos sociais sirvam para aumentar o nosso senso de justiça, de solidariedade e amor, contribuindo para a construção da família universal como tanto apregoou Jesus.
Tem momentos que sentimos uma pressão enorme das exigências sobre nossa consciência daquilo que estamos compromissados. E cada vez que aprendemos alguma coisa, maior fica esse compromisso. Quando o mundo espiritual se integra ao mundo material e mostra sua hierarquia superior, nossa consciência tem que ser muito mais competente em cumprir os compromissos materiais e ao mesmo tempo respeitar a hierarquia superior do mundo espiritual. Hoje me sinto pressionado pelos compromissos materiais, mas também tenho que cumprir o espiritual. É uma questão interessante, pois a prioridade é do mundo espiritual, mas o mundo espiritual permite que eu cumpra os compromissos materiais, até mesmo com o sacrifício das tarefas espirituais que passam a ser adiadas. Entendo que assim sucede porque é no mundo material que se procede a nossa vida material de importância fundamental ao nosso aprendizado espiritual. Então, devo em primeiro lugar deixar todos os meus compromissos materiais devidamente cumpridos para que eu possa me envolver nos compromissos espirituais. A hierarquia espiritual permite que as necessidades materiais sejam atendidas até mesmo em primeiro plano, mas que isso obedece também ao plano superior.
Levando essa questão para o plano das relações humanas, podemos entender porque um ser hierarquicamente superior tenha atitudes subservientes, como foi o caso do Cristo ao lavar os pés dos seus discípulos. Por trás daquilo estava uma grande lição que o “superior” oferece ao “inferior”.
Como é difícil ser caridoso quando ainda se é portador de tantos pecados na consciência. Pensava que já havia avançado bastante e agora não teria mais dificuldade de praticar a caridade “incondicional” de dar a quem me pede independente do arrazoado que a minha mente queira fazer no sentido contrário. Falhei estrondosamente logo quando eu estava começando a ganhar confiança. Ao entrar no carro, após ter saído da padaria onde estava jantando com minhas companheiras, veio um rapaz mancando com um aparelho mecânico na perna do outro lado da rua em minha direção. Queria uma pratinha, talvez até com a justificativa de que estava pastorando o carro. De imediato assumiu em minha consciência toda a resistência anterior. Ignorei o rapaz, mesmo ele tendo parado na minha frente em atitude de expectativa. Lembrei do meu compromisso com a caridade, mas não tive forças para a evocar. Prevalecia reverberando na minha mente os argumentos de que o rapaz não devia procurar gorjeta naquela calçada, pois ele fica sempre do outro lado da rua, que estava se aproveitando de um acidente para sensibilizar os outros, que minhas companheiras iriam notar que eu tenho firmeza para resolver essas questões, que eu não seria enganado facilmente por aquele rapaz que não iria levar nenhum centavo meu. Logo que eu me afastei da “cena do crime” esses argumentos perderam força e assumiu à minha consciência o sentimento de culpa, de não ter feito meu dever, de não ter dado expressão à caridade da qual eu me digo aliado. Observei também que eu ainda estou nos primeiros estágios desse aprendizado de ser caridoso, que ainda não aprendi nem o alfabeto básico. Talvez eu seja até um retardado sentimental, que não consiga aprender os sentimentos nobres. Mas acredito que não. Acredito que isso seja devido a falta de prática nesse campo. Da mesma forma que eu tenho dificuldade de fazer minhas preces, por tanto que eu me esforce. Mas isso jamais servirá de motivos para eu desistir da minha caminhada em direção ao Reino de Deus e sei que a caridade é um dos maiores caminhos pavimentados para o íntimo do Criador.
Continuo na luta ferrenha a nível de consciência, fazer habitar em mim o anjo da caridade, deslocando o egoísmo, o medo, a arrogância, a prepotência, o medo, a vaidade, enfim uma série de sentimentos menores. Hoje tive uma vitória extraordinária. Uma criança dos arredores do hospital estava no estacionamento pedindo uma pratinha. Venci a resistência e falei com ele amistosamente, pronto a dar a pratinha desejada. Perguntei o que ele fazia, onde morava, e me dirigia para abrir o carro. Foi quando percebi que o menino olhava assustado para o final da escada onde vi surgir a figura do vigilante dizendo que não permitido ficar pedindo ali dentro. Notei que ele se encolhia e já procurava a saída. Disse baixinho para só ele escutar que me esperasse fora. Quando sai, dobrei a rua e deixei que o muro do hospital cobrisse do guarda a visão do meu carro. A criança se aproximou e dei a pratinha que ele esperava e fiz uma observação de que não era permitido ficar naquele local a pedir. Ele não disse nada, com um sorriso foi embora. Saí também a meditar que fiz uma ação contrária ao regulamento do hospital, infringi a lei, eu que enquanto professor e com um cargo de direção devia observar. Mas não me sentia como um criminoso, pelo contrário, estava exultante por ter feito essa proeza. Venci minha resistência de doar até mesmo num ambiente onde tudo favorecia eu me omitir. Senti até uma lágrima de satisfação rolar por meu rosto e de imediato lembrei que há poucos dias eu tinha derramado lágrimas também ao pedir perdão ao Pai por não ter auxiliado um irmão que havia me estendido a mão. Entendi que este meu ato agora me resgatava daquele pecado do passado, do peso em minha consciência. Vi que eu tinha feito um grande negócio, com uma simples pratinha fiquei quites com meu Criador.