Os meios de comunicação quer sejam escritos, falados ou televisados, mostram com prioridade as notícias relacionadas com a ação do mal. Sabemos que o bem existe, mas não aparece tanto na mídia como o mal. Que pode justificar isso? Talvez porque o mal ameaça a nossa vida e, portanto, devemos conhecer com mais detalhes como forma de nos prevenir. O bem não traz ameaça a nossa vida, pelo contrário, é algo que ajuda a nossa sobrevivência e por isso não existe urgência em conhecê-lo com detalhes.
Essa explicação, respaldada pelas ciências cognitivas, comportamentais, behavioristas, principalmente da Sociobiologia, explica convenientemente esse tipo de comportamento coletivo.
Porém, passa uma falsa impressão de que o bem não existe, que o mal domina com ampla maioria as ações do bem. Pode até ser verdade, pois o planeta ainda é considerado um planeta de provas e expiações, para onde são enviados os espíritos que necessitam de escola e/ou hospital para purgar suas dívidas quanto ao não cumprimento da lei do Amor. No entanto, como tudo e todos estamos sujeitos a lei do Progresso, expressos na evolução dos seres e dos mundos, o planeta paulatinamente vai deixando a condição de ser campo de provas e expiações para a condição de planeta de Reparação onde prevalece as ações do bem.
Assim, como já está próximo dessa transformação do planeta que está alicerçada sobre nossas ações do bem é importante que sejamos repórteres do bem. Vou então fazer a minha parte e ser repórter do bem neste momento com um fato ocorrido e guardado em minhas reminiscências.
Caminhava logo cedo pela areia das praias com destino a praia de Ponta Negra como faço algumas vezes. Ao passar pela praia de Areia Preta percebi que uma família de turistas estava em apuros. A água tinha levado uma das crianças e a mãe no afã de socorrê-la também estava em dificuldades. O pai com outras duas crianças ao lado se mostrava impassível frente ao que estava acontecendo, talvez não soubesse nadar para fazer o socorro. Eu não me atrevia, pois sei que não tenho nado suficiente para uma ação de resgate. As demais pessoas que trabalhavam numa obra também não sabiam nadar, acredito, pois como eu só faziam olhar. O caso parece que caminhava para uma fatalidade, quando percebo passar em disparada em direção ao mar, uma pessoa que ia se desvencilhando pelo caminho dos sapatos e das roupas. Enfrentou as ondas com disposição e logo estava resgatando as duas, mãe e filha que estavam sendo arrastadas. Deixou-as em segurança na beira da praia as quais vieram receber o apoio dos familiares. No aperreio da situação não percebi nenhum agradecimento ao rapaz que fez o salvamento. Nós, a platéia muda, apenas registramos o ocorrido com admiração. O rapaz com a mesma velocidade que havia largado seus pertences, recolheu os objetos e seguiu seu caminho sem esperar qualquer tipo de manifestação. Certamente tinha uma obrigação a cumprir, algum trabalho a lhe esperar.
Fiquei a imaginar, se fosse uma ação do mal, um assalto, um assassinato, a providência esperada era que fosse feito um Boletim de Ocorrência e possivelmente no outro dia estivesse sendo anunciado nos jornais. Essa ação do bem, por outro lado, não tem nenhuma delegacia que faça esse registro, nenhum jornal para divulgar. O rapaz corajoso fez o que ensina o Evangelho, fazer o bem sem olhar a quem, sem esperar a recompensa em função disso. Os céus certamente o recompensará, pois sua ação com certeza foi automaticamente registrada no mundo espiritual. Quanto a nós, a platéia silenciosa e inerte, cabe absorver a lição que esse filho de Deus nos ofertou.
Depois do Carnaval teve início a Quaresma, seguido pela Semana Santa e culminando com o domingo de Páscoa. Este é um roteiro que pretendi aproveitar para mergulhar na espiritualidade e ao chegar na Páscoa sentir que fiz o necessário para corrigir minhas ações equivocadas.
Agora, terminado esses dias, não tenho essa convicção de que fiz tudo que estava ao meu alcance para atingir uma boa renovação espiritual. A área que eu tive um melhor desempenho foi na aplicação do jejum, cheguei a perder 14 quilos, saindo do Carnaval com 85 e atingindo até 71 quilos. Nas outras áreas como a Caridade, Solidariedade e principalmente Abnegação fui muito fraco, quase um fracasso.
Mesmo com o sucesso do jejum e tendo atingido além da meta que me propus, de reduzir até 10 quilos, recebi críticas que isso não estava tendo valor espiritual para mim, uma vez que o foco principal era a estética e não o crescimento espiritual.
Posso até aceitar parte da critica, mas jamais em sua totalidade. Da mesma forma que eu exagero dentro dos apelos da Gula, onde cometo o pecado de comer além do necessário e ficar no “acima do peso”, também posso incentivar os critérios da abstenção de alimentos, privilegiando a Sobriedade e como conseqüência ter a perda de peso como recompensa, assim como tenho o excesso de peso como punição. Fica assim equilibrado: tenho o excesso de peso como punição pelo pecado da Gula e tenho a perda de peso como recompensa pela virtude da sobriedade do excesso de alimento. Portanto, nesse campo do jejum de alimentos considero que tive significativa vitória.
Por outro lado, do ponto de vista mais amplo, eu poderia ter feito jejum de diversas ações que impedem ou são incompatíveis com as demais virtudes e ações do bem que justificaria uma melhor renovação espiritual. Fiquei a maior parte do tempo envolvido com atividades de lazer, brincadeiras, jogos, ironias... Não é que tivessem um propósito maligno, creio até que servem para promover a harmonia do ambiente onde me encontro, mas deixo de fazer assim outras ações de maior importância dentro do critério de renovação espiritual.
Essa é uma situação na qual percebo que deve existir a mudança de domicílio do mundo material para o mundo espiritual. Essas ações de lazer e recreação, mesmo com o propósito de promover a harmonia entre os presentes, estão muito ligadas ao mundo material, ao mundo dos prazeres terrenos. As ações de caridade, solidariedade, voluntariado, abnegação, não trazem prazer dessa forma, é um outro tipo de prazer mais ligado ao mundo espiritual e do qual ainda não estou habituado, não sei ainda sentir esse tipo de prazer na sua plenitude. Porém é algo que só aprenderei fazendo, como diz o ditado, amar se aprende amando. Então, ser cidadão do mundo espiritual se aprende exercendo a cidadania no Reino de Deus, onde a ajuda ao próximo que necessita e que está ao nosso lado é um requisito que não pode ser procrastinado, deixado para amanhã, pois pode ser muito tarde para quem está vivendo sob extremo risco, ignorância e desvio dos caminhos do Pai.
Sei que não é uma data específica que irá proporcionar a mudança dos meus hábitos, sei que é no dia a dia que isso irá se realizando. Mas é numa data específica como essa, que existe toda expectativa da comunidade para quem já tenha uma boa compreensão das responsabilidades espirituais como eu já possuo, fazer o teste do quando renovado espiritualmente já me encontro.
Não vou dizer que neste ano eu tenha tido uma renovação espiritual espetacular, não foi isso que ocorreu, mas sei que comparado ao ano passado eu tive um melhor desempenho, tanto com relação ao jejum como nas outras ações associadas. Espero que no próximo ano eu tenha um desempenho ainda melhor, fruto da persistência de minhas ações cotidianas dentro do bem, da lei do Amor.
Um bom termômetro para avaliar essa renovação espiritual, no meu caso, é a harmonização que possa evoluir entre as minhas diversas companheiras e que fazem parte da essência da minha missão junto ao Pai. Eu sinto que já houve uma melhora significativa entre elas, comparado ao ano passado, e tenho esperança que o Pai nos ajude a melhorar ainda mais essa harmonização e que seja verificado no ano que vem no sentido da colaboração mútua e assim construirmos a família que Ele deseja que façamos.
Pode parecer que estes dois termos sejam sinônimos, mas existe forte diferença. Solidariedade é entrar no plano, no desejo e nas aspirações do outro. Ser cúmplice dos erros alheios e fazer o outro tornar-se cúmplice dos nossos erros não é solidariedade, mas cumplicidade. Ser solidário é compartilhar os nossos bens, participando dos bens dos outros. Não se ama para beneficiar-se dos outros, mas para beneficiar os outros. Não amamos para receber, mas para dar. Amar não é procurar o outro porque precisamos dele, mas porque desejamos ser úteis a ele. Ir ao encontro do outro de braços abertos para ofertar toda nossa vida.
Esta é a perspectiva do Projeto de Extensão Universitária “FOCO DE LUZ” que estamos implementando na comunidade da Praia do Meio. Uma das maiores motivações que temos para agir dentro da comunidade é a solidariedade. Procuramos entrar em contato com o outro na base da amizade e a partir daí entender quais são seus planos, desejos e aspirações deste meu próximo. Como o reconheço como meu próximo, sei que devo lhe amar como se fosse a mim mesmo, como Jesus ensinou.
Com esta compreensão estou vendo agora a necessidade de criar uma ficha de acompanhamento para cada pessoa que tivermos contato, colocar nessa ficha os dados de identificação geral e em seguida o campo para os planos, desejos e aspirações. Servirá para trabalharmos com objetividade sobre esses três aspectos, saber o que podemos fazer para ingressar nesses planos como se fossem nossos. Como é uma ação do bem sempre vai haver a característica da mútua ajuda, ao mesmo tempo que eu trabalho para realizar os três itens do meu próximo, também existe uma ação divina que promove por meios conscientes ou inconscientes a realização dos meus planos, desejos e aspirações.
Portanto, é importante começar também por colocar quais são estes meus planos, desejos e aspirações e colocar tudo dentro de um mesmo contexto, onde os trabalhos de todos possam ser avaliados e verificados até que ponto tudo se move em direção dos objetivos.
O meu plano é colaborar na construção do Reino de Deus atuando tanto na minha vida interna, com a formação da Família Ampliada, como na vida externa com a formação de comunidades solidárias.
O meu desejo, como uma meta mais próxima, é que cada ser humano seja respeitado em sua dignidade, que eu possa colaborar para realizar os seus planos, desejos e aspirações como se fossem meus, que eles tenham a consciência dos seus direitos e deveres dentro de uma cidadania onde a característica mais forte seja o Amor.
A minha aspiração, como uma meta mais ampla, é que cada comunidade da nossa cidade, do país, do planeta seja sensibilizada por esses princípios e também se convertam a mudar o foco materialista da vida para o foco espiritualista e assim ficarmos mais próximos do Reino de Deus.
É isto que já estou tentando realizar com a aplicação prática desse Projeto. Mesmo que dentro dele não seja observado nenhuma metodologia clara a respeito da forma como isso será alcançado, existe a fé que a força divina do bem que nos move em espírito estará recebendo instruções através da intuição de cada um dos participantes, como aconteceu agora com as idéias que foram colocadas neste texto.
O Projeto se constrói a cada dia partir dessa metodologia onde o importante é a perseverança e a disciplina. Cada um dos voluntários sabe onde está pisando, sabe os objetivos e a metodologia de nosso trabalho, sabe que a fé em Deus é o principal moto do trabalho e que as lições de Jesus são os princípios que devemos seguir, de forma ecumênica, tudo em nome do Amor e no seguimento rigoroso de sua lei.
Tenho uma série de comportamentos que desviam da norma cultural, mesmo que eu esteja convicto de que quero cumprir a vontade do Pai e que as normas culturais procuram se nivelar com a vontade divina. Então fiquei a pensar naquelas pessoas que se envolvem com algumas empresas multinacionais e se tornam vendedor independente, fazem o trabalho de forma autônoma, sem ter um padrão que lhes dê ordem sobre o que deve ou não fazer, mesmo que cumpra todas as orientações elaboradas pela central de empresa. Da mesma forma posso estar agindo para cumprir a vontade de Deus, mas seguindo uma lógica pessoal.
Um exemplo disso foi o que aconteceu nesta sexta feira da paixão. Antes do nascer do sol sai com minha companheira e meus irmãos para visitar a sua mãe que mora num interior distante duas horas de onde moramos. Antes passamos numa fazenda para visitar e tomar o café da manhã, mas infelizmente não foi possível.
Fomos então para o nosso destino e eu procurava manter o jejum parcial que eu estava fazendo para só liberar no domingo. Mesmo assim fui em busca do peixe para complementar o almoço, uma vez que não foi possível trazermos o que tinha sido comprado em Natal. Enquanto o almoço era preparado fomos organizar uma mesinha no quintal para jogarmos cartas que minha irmã havia trazido.
O dono da casa ainda nos advertiu que isso era proibido na sexta-feira da paixão, mas não foi suficiente para evitar o jogo. Ficamos na brincadeira até o término do preparo do almoço e fomos todos para a mesa. Também aí passei a comer bastante do que estava à mesa. Mesmo que eu tentasse fazer o limite de quantidade, mesmo assim eu comi além do que eu devia.
Voltamos ao jogo e depois, sob lembrança da minha companheira, convidamos as pessoas da casa para sentar em roda junto conosco e lermos uma das histórias que Jesus contava aos seus discípulos e fazermos, cada um, a devida reflexão.
A lição que caiu foi sobre o “Amor mútuo”. A lição queria mostrar que o bem que façamos a alguém, sempre e de alguma forma seremos recompensados também. Isso é o que dá a característica da mútua ajuda.
Foi o momento máximo da nossa reunião e que consegui aproveitar apesar de não estar cumprindo os rituais que a cultura pede para respeitar se queremos ser respeitosos com o Cristo. Daí porque surgiu a idéia de me considerar como um “filho independente” de Deus, pois estou decidido a cumprir Sua vontade, mas seguindo os critérios que a minha consciência considera como importantes, convenientes ou pertinentes. O jogo naquele momento era uma atividade que estava trazendo alegria e interação entre nós e que Jesus nem o Pai pode estar contra isso, pois ambos desejam a felicidade para todos nós.
Ao final do encontro e no retorno para casa, estava fazendo estas considerações. A primeira conclusão que tirei de tudo, inclusive com a experiência relatada no dia anterior, foi que apesar de todo o meu conhecimento técnico e espiritual, tenho uma fraqueza grande na divulgação do Evangelho a partir das leituras evangélicas e sua aplicações no cotidiano.
A segunda conclusão é como essa lição de Jesus que fala da importância da ajuda mútua. As minhas companheiras têm uma grande importância na aplicação da espiritualidade, da vontade de Deus, mesmo que seja num nível social ou doméstico.
Decidi, e rogo em minhas orações para ser um dos instrumentos de Deus. Parece ser coisa simples, afinal Deus quer que pratiquemos o Amor com prioridade em todos nossos relacionamentos, assim como Jesus ensinou. Mas vejo ao longo do dia, das chances que surgem em minha vida, quanto sou incompetente nessa promessa, como sou um instrumento cego de Deus.
Fui ao aniversário de minha amiga com o objetivo maior da minha companheira cantar a oração de São Francisco dentro do evento. Falei dessa possibilidade com minha amiga que acatou a idéia. Sentei com minha companheira e observei o ambiente, desenvolvi algumas idéias mentalmente de como iria apresentar o trabalho, de como iria falar, uma forma de apresentação como aconteceu no meu aniversário. Depois de eu explicar a minha forma de ver a espiritualidade de minha amiga convidaria todos para ouvir o canto da oração de São Francisco. Isso deveria ser feito na ocasião do parabéns, antes do corte do bolo.
Fui antes para o salão para a socialização no momento da dança. Tive um bom desempenho, cumprimentei os amigos e dancei com desenvoltura no salão, inclusive integrando as rodas que se formavam e as diversas coreografias.
Voltei depois para a mesa para pegar a Buffet que já estava sendo servido, depois de ter ingerido diversos salgadinhos e bebido vinho, espumante, água de coco e suco de abacaxi com hortelã.
Tive um bom desempenho até esse momento. Procurava lembrar a todo momento que eu era um instrumento da vontade de Deus e que eu devia aproveitar esse momento para mostrar aos presentes a importância da espiritualidade na qualidade de vida da aniversariante e de todos que se aproximam dela e sentem a sua influência.
Fomos chamados para o salão principal para cantarmos os parabéns. A aglutinação de pessoas já havia se formado ao redor da aniversariante. Minha companheira procurou ficar e me levar para uma posição mais estratégica para usar o microfone e fazer o que estava planejado. Ela lembrava sempre para mim para aproveitar o momento e saudar minha amiga. Procurei ficar mais perto da aniversariante, mas não encontrei a oportunidade de fazer a saudação a ela e de oferecer a canção da oração de São Francisco.
Ao nos retirarmos do evento fizemos a avaliação do que acontecera. Minha companheira fez a critica da oportunidade que eu perdi de ter oferecido a minha amiga algo do que eu recebi durante o meu aniversário, quando um amigo também me saudou sem eu esperar e fez um descritivo da minha história para os presentes. Foi um momento enriquecedor naquele momento.
Ao fazer essa reflexão vi que neste aniversário da minha amiga eu me comportei como um instrumento cego da vontade de Deus. Não ofereci a minha amiga algo que eu estava capacitado a fazer e que eu gostaria de ter recebido. Não fiz ao próximo o que eu gostaria que tivesse sido feito para mim. Não cumpri com fidelidade a principal lei do Amor, assim como Jesus ensinou.
Percebi a minha fraqueza cognitiva, de não ter coragem suficiente para aproveitar as circunstâncias formadas para realçar o lado positivo das pessoas e mostrar a importância de todos, ao seguir os bons conselhos na prática cotidiana.
Fiquei a imaginar que eu poderia ter ido antes ao moço que estava cantando e animando a festa das minhas intenções, de no momento dos parabéns eu estar ao seu lado e ter dado o sinal para a minha palavra. Com certeza eu teria a ajuda necessária do Pai para contornar minhas dificuldades pessoais quanto a timidez que ainda é forte dentro de mim e que encontraria as palavras convenientes e apropriadas ao momento e que essa seria a minha maior contribuição, tanto para abrilhantar a festa da minha amiga, quanto no cumprimento da vontade do Pai.